A regra existe: advogados, juízes, promotores e outros membros do Judiciário têm o direito de aguardar o julgamento de seus processos, quando presos provisoriamente, em uma sala de Estado Maior - um isolamento praticamente descaracterizado como prisão.
A prerrogativa, contudo, é digna de contestação, por partir do pressuposto de que presos não condenados devem aguardar a sentença sem sofrer os efeitos do encarceramento. O problema é que aquilo que deveria valer para todos - pelo menos para aqueles cuja liberdade não traz risco à sociedade - acaba sendo privilégio de poucos, muito bem amparados pelas categorias profissionais das quais fazem parte.
A situação dos presídios capixabas serve para mostrar o quanto essa exigência acaba sendo mesmo uma distinção. Em maio passado, este jornal divulgou dados do Banco Nacional de Monitoramento de Prisões do Conselho Nacional de Justiça que mostravam que 9,9 mil detentos ainda não haviam sido julgados, o equivalente a aproximadamente 40% da população carcerária estadual.
Todos, portanto, passando por um encarceramento prévio, anterior a qualquer condenação. Ainda inocentes perante a Justiça, mas esquecidos por ela. E é essa mesma Justiça que acaba categorizando os cidadãos, criando um sistema de castas em que alguns são superiores à maioria, um elitismo legal.
A prerrogativa voltou a ter destaque com a prisão de duas advogadas, na semana passada, durante a Operação Ponto Cego, acusadas de fazer a comunicação entre líderes de facções em presídios do Estado e seus comparsas em liberdade. Elas estão recolhidas em um presídio feminino, separadas de outras detentas, mas a ausência de uma sala de Estado Maior tem feito a defesa entrar com pedidos para que a custódia seja feita em regime domiciliar.
Há muita controvérsia sobre o que seria uma sala de Estado Maior, mas normalmente é um recinto não gradeado dentro de uma unidade militar. Portanto, não é uma cela. O benefício é garantido por estatuto da OAB (Lei 8.906/1994) e por leis orgânicas da Magistratura e do Ministério Público. Uma definição do Supremo diz que “o local deve oferecer instalações e comodidades condignas, ou seja, condições adequadas de higiene e segurança”.
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A classe defende que, por sua atuação profissional, advogados em celas comuns podem estar expostos a perigos, sendo que no caso das advogadas já existe um isolamento, o que em tese descartaria o risco. A maior ameaça é a de perda de status social, ao que parece, ao se exigir regalias tão raras no sistema prisional. Todos merecem tratamento digno, não só quem carrega um canudo.
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