É imensurável o tamanho do vexame causado pela situação do Terminal de Itaparica, em Vila Velha, na primeira chuva após a inauguração, há pouco mais de duas semanas. Não há como se admitir que em uma obra entregue à população justamente para sanar problemas estruturais ainda persistam falhas tão ostensivas, visíveis até mesmo aos olhos de um leigo mais desavisado. A imagem da água da chuva escorrendo pelos coletores de água, sem a devida vedação, serve como uma metáfora explícita e dolorosa do dinheiro público que vaza pelo ralo.
A equipe de fiscais e especialistas do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Espírito Santo (Crea-ES) esteve no local e constatou, de forma preliminar, irregularidades e falhas na execução do projeto. "Foram detectadas anomalias, gotejamentos e vazamentos diversos nos cones interligados à membrana de cobertura do Terminal, ocasionados por deficiências de vedações, ineficiência de soldagens e ausência de impermeabilizações, além de uma drenagem insuficiente, que ocasionaram alagamentos no piso e o contato da água com pilares, estruturas metálicas e instalações elétricas", informou em nota o conselho, ressaltando os riscos aos usuários, com a possibilidade de escorregões e choques elétricos.
Não é uma questão somente de desconforto, somado aos inúmeros já enfrentados diariamente por quem depende do transporte público na Grande Vitória. É uma soma de desrespeito com o usuário e com o contribuinte, descaso com a segurança e desleixo puro e simples.
O absurdo de uma reforma que custou aos cofres públicos R$ 12 milhões já apresentar problemas em tão pouco tempo só não é maior por já ser tão contumaz a má execução de projetos de engenharia. É quase uma marca do Brasil. Basta lembrar dos buracos na Avenida Leitão da Silva e na Leste-Oeste poucas semanas após a entrega das obras. É tão comum que já é esperado, quando deveria ser uma excepcionalidade.
A execução da obra só pode ter sido mesmo uma lástima quando o próprio diretor do Departamento de Estradas de Rodagem do Estado do Espírito Santo (DER-ES), Luiz César Maretto, responsável pela reforma, afirma que houve erro da empresa contratada para a reconstrução do terminal. Se a empresa errou, todos erraram em maior ou menor grau. Enquanto não houver fiscalização séria, com acompanhamento da engenharia adequada e do uso de materiais de qualidade, a execução de obras públicas (não só elas, como mostram casos recentes na construção civil privada em Vila Velha e Cariacica) continuará sendo uma caixa de surpresas desagradáveis. E vidas são sempre colocadas em risco com tanta irresponsabilidade.
A maior das ironias do caso do Terminal de Itaparica é já se tratar de uma reforma. Um terminal que nasceu após um longo parto, em 2009, com obras que levaram cinco anos e despenderam R$ 12,4 milhões em investimentos. Em junho de 2013, a estrutura foi danificada, com o desabamento de parte da cobertura, durante um vendaval que atingiu a Grande Vitória.
O sepultamento do terminal só se deu cinco anos depois, em 2018, quando foi interditado após uma vistoria encontrar irregularidades estruturais que ameaçavam a segurança dos passageiros. Foram mais de dois anos para que renascesse, completamente repaginado, no último dia 22.
O DER-ES garante que desta vez não há risco estrutural, mas é compreensível que o usuário que passa pelo terminal com regularidade se preocupe, principalmente no caso de intempéries como a de 2013. As chuvas que provocaram os vazamentos neste fim de semana não foram das mais fortes registradas na Grande Vitória e mesmo assim provocaram o estrago registrado pelos usuários.
Nesses mais de dois anos de interdição, a ausência do Terminal de Itaparica foi um transtorno para mais de 40 mil passageiros diariamente, que tiveram que se deslocar para outros terminais e perder mais tempo do dia para cumprir seus compromissos. É uma estrutura fundamental para melhorar a qualidade do transporte público na Grande Vitória, e por isso não pode ser negligenciada. A sucessão de erros na cronologia do Terminal de Itaparica já o coloca no disputado ranking de tudo o que não deve ser feito na condução de obras públicas.
Este vídeo pode te interessar
LEIA MAIS EDITORIAIS
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.