Em uma madrugada, as rajadas podem ser ouvidas pela região do Centro de Vitória, levando o terror aos moradores de Alagoanos, Cabral e Piedade. Em outra manhã, os tiros passam ser a desagradável trilha sonora de São Benedito, também em Vitória. E assim se repete em outro dia em Nova Almeida, na Serra, e no outro em Primeiro da Maio, em Vila Velha. Para novamente os morros da Capital (Cruzamento, Alagoano, Cabral, Piedade, Morro do Macaco) ressoarem os estampidos dos armamentos de bandidos que enfrentam a polícia. Antes fossem apenas um incômodo sonoro: para quem vive nessas localidades, são a sinalização da morte.
Enquanto essa rotina não se altera em bairros onde o tráfico dá as cartas, seus moradores precisam aprender a conviver diariamente com o medo. Já o restante da população, um pouco mais afastada do epicentro da violência e em condições mais confortáveis, sente o incômodo de ser testemunha a distância dessa guerra covarde e até cobra uma reação mais proficiente das autoridades. Mas a verdade inconveniente é que os tiros parecem já estar compondo a paisagem. Incomodam menos do que deveriam. Ainda mobilizam pouco a sociedade e as instituições para de fato combater a violência.
Acontece que essa recorrência é inaceitável em qualquer rua, em qualquer bairro, em qualquer cidade. Se há uma normalização dessa violência por se tratar de bairros periféricos, ela precisa ser quebrada. A indignação está fazendo falta.
Não é minimamente aceitável que diariamente bandidos ou briguem entre si pelo controle dos pontos de vendas de drogas ou enfrentem a polícia, sem que o Estado consiga impor sua autoridade para garantir a lei e a ordem. Alguma coisa deve ser feita, e os atores sociais e institucionais do Espírito Santo são peças fundamentais para virar essa chave.
Já dissemos neste espaço, na semana passada, que o que faz falta, a esta altura, é um envolvimento mais organizado no Espírito Santo. Do Ministério Público e do Judiciário, com participação ativa da OAB. Mesmo que constitucionalmente a segurança pública seja uma atribuição do Estado, prefeitos e vereadores, com atuação mais próxima do cidadão, precisam se envolver nessa área que tem tanto impacto na vida das pessoas. Assim como parlamentares no nível estadual e federal e o próprio governo estadual devem buscar o engajamento coletivo, em um pacto pela pacificação do Estado.
Mesmo que esses tiroteios não estejam tendo impacto equivalente no crescimento dos homicídios, eles são uma forma de terrorismo que contribui para consolidar o poder dessas facções que brigam entre si. Há um tanto de exibicionismo envolvido, com demonstrações de quem tem o maior arsenal.
Como retratado recentemente em reportagem do Estadão, com pistolas e fuzis mais baratos, os criminosos agora podem comprar armas legalmente usando laranjas que se registram como colecionadores, atiradores ou caçadores, os chamados CACs. A legislação armamentista no Brasil está facilitando o mundo do crime.
Quando se fala em reação, o que se espera é que ela seja organizada, buscando frentes institucionais e legislativas para colocar um freio nessa desordem. Quando bandidos atiram indiscriminadamente, eles estão mandando um recado de poder. Com inteligência coletiva, é possível minar essa audácia e retomar o controle.
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