Em maio de 1994, uma moradora de Vitória, então com 15 anos, conseguiu mudar o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a concessão do título de eleitor para os jovens de 16 anos, assegurada pela Constituição. Renata Cristina Rabelo Gomes decidiu enviar uma carta ao presidente do órgão para reivindicar o direito ao título porque, se naquela época a lei já garantia o voto aos 16 anos, só podiam tirar o documento aqueles que tivessem a idade 150 dias antes do pleito, quando o registro era efetuado nos cartórios eleitorais.
Renata completaria 16 anos três dias antes das eleições daquele ano e se sentiu injustiçada. Sua carta virou um processo na Corte Eleitoral que acabou mudando a legislação.
Renata, como diz o meme nas redes sociais, andou para que os jovens de hoje corressem. Ampliou o direito ao voto a todos aqueles com 16 anos completados até o dia da eleição. Mas o que eles estão fazendo com esse direito, em 2022? No Espírito Santo, 90% dos adolescentes com 16 e 17 anos ainda não tiraram o título de eleitor para as eleições deste ano. A participação desta faixa etária nas escolhas que determinarão os próximos quatro anos do país é facultativa, mas demonstra um desapego preocupante, intimamente ligado ao "espírito do tempo".
Em 1994, aquela geração de jovens sonhava com as urnas porque testemunhava o período de redemocratização do Brasil. Ainda eram crianças quando as eleições de 1989, as primeiras presidenciais desde o início dos anos 1960, mobilizaram o país; o reencontro do brasileiro com as urnas após tanto tempo envolveu as famílias, foi uma festa nacional.
E, mesmo que o primeiro presidente eleito não tenha completado o mandato após um impeachment (vale lembrar aqui dos jovens caras-pintadas nas ruas), havia um desejo compartilhado de aprimorar a também jovem democracia, fazendo boas escolhas pelo voto.
Mas, desde 2004, no Espírito Santo o percentual de eleitores que têm 16 ou 17 anos está em queda. Naquele ano, os jovens eleitores eram 3,24% das pessoas com título de eleitor. Em 2022, até fevereiro, são 0,37%, a menor taxa da série histórica.
Em 2022, há um abatimento inegável. O desgaste da relação dos mais jovens com a política tem raiz na descrença com o sistema que se abateu sobre toda a sociedade, mas não se reduz a isso. Falta, sobretudo, conexão com os temas que mais afligem essa faixa etária da população.
O Brasil atravessou uma pandemia na qual a educação foi profundamente afetada, a crise econômica mantém um sentimento de desesperança com a falta de empregos. O mundo vive transformações velozes, mas a política, tão necessária para a prática democrática, segue arraigada a velhos valores e vícios, sem renovação de lideranças.
E fica a importante questão: a quem interessa que os jovens deixem de iniciar sua vida eleitoral aos 16 anos? A apatia tem suas justificativas, mas ao mesmo tempo ela alimenta o status quo, que é a política feita para poucos, sem se conectar com as expectativas de um país que clama por oportunidades. A falta de perspectivas abate, mas é o que deve instigar a mudança.
O sistema político pouco inclusivo repele as mentes mais jovens e assim tudo permanece como está. Renata, há quase 30 anos, mostrou que é possível fazer a coisa certa. Nem sempre é fácil, mas esse anseio juvenil precisa se manter vivo. O voto não muda tudo de uma hora para a outra, mas ajuda a construir o futuro.
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