Entra ano, sai ano e duas atividades pedagógicas continuam presentes no cotidiano das escolas no país: o dever de casa e as provas. Embora façam parte do ensino há várias gerações, não é difícil encontrar quem questione a eficácia desses métodos na atualidade.
No geral, as críticas apontam para o excesso de tarefas complementares, além do peso que é dado às provas. Outro argumento é que essas práticas não estão conectadas à realidade do estudante do século XXI e que há metodologias de ensino-aprendizagem mais eficazes.
Apesar das queixas, profissionais da área da educação têm outra perspectiva sobre o tema. “O dever de casa e a prova ainda cumprem um papel pedagógico importante”, assegura Ticiana Santiago de Sá, doutora em Educação brasileira e especialista em psicologia do desenvolvimento da aprendizagem.
Para Ticiana, essas práticas contribuem para que o estudante desenvolva múltiplas competências, entre elas a disciplina, o gerenciamento do tempo, a organização das ideias e o aperfeiçoamento da escrita.
Outras questões ajudam a entender a importância do dever de casa e das provas, segundo especialistas. Confira no box abaixo.
O grande volume de exercícios a serem feitos em casa é uma das maiores reclamações entre aqueles que gostariam de eliminar a atividade da rotina, segundo a neuropsicopedagoga Geovana Mascarenhas. "Tem deveres que são, na verdade, para os pais. A participação da criança é mínima. As famílias se sentem sobrecarregadas", analisa.
Mas há ainda outros problemas. Um deles é que muitos pais querem assumir o papel do professor, tornando a dinâmica estressante. Em outros casos, por falta de tempo ou paciência, eles fazem as lições no lugar do filho.
Geovana cita como exemplos os Mapas Mentais e a Técnica Pomodoro, métodos que auxiliam no gerenciamento do tempo e de informações. "Com as estratégias certas, os pais podem contribuir mais efetivamente."
A coordenadora de Implementação Municipal do Itaú Social, Sonia Maria Barbosa, afirma que a escola precisa criar uma rotina equilibrada de estudo, levando em consideração a carga horária de todos os afazeres do aluno.
"É preciso saber dosar as horas na sala de aula com o tempo que será gasto em casa para finalizar a tarefa. Deve-se fazer esse cálculo antes de definir as atividades."
Sonia ressalta ainda que, durante a pandemia, os alunos estudaram em casa por muito tempo. "Ficar sentado por longas horas, fazendo exercícios, remete a essa fase difícil. Vale buscar alternativas para as atividades."
Embora a prova seja uma ferramenta útil de avaliação, a relevância dela deve ser reconsiderada.
"Defendo as provas, mas não defendo o peso que elas costumam ter nas escolas. Há outras maneiras de aferir o aprendizado, principalmente entre os estudantes mais novos", ressalta Geovana.
Para Sonia, o ideal é que o professor aplique diferentes métodos de avaliação, como trabalho de pesquisa ou desenvolvimento de projetos.
"Um aluno pode ficar nervoso ao fazer uma prova, mas tem outras habilidades que atestam a sua competência. Quanto mais alternativas e oportunidades para avaliar o conhecimento, melhor", reforça.
A tarefa escolar permite verificar se o conteúdo ensinado em sala de aula foi de fato compreendido. “Muitas dúvidas acabam surgindo nesses momentos, por exemplo”, afirma Ticiana.
Para o professor do Departamento de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Douglas Ferrari de Melo, outro objetivo do dever de casa é envolver pedagogicamente a família, especialmente nos primeiros anos do ensino básico. “É um momento de socialização, que fortalece os vínculos e a relação de confiança entre o aluno e os pais”, afirma.
Quando o assunto são as provas, Ticiana pondera que esse modelo de avaliação também está presente em outros espaços, como o ensino superior e o mercado de trabalho. “A gente não pode criar uma bolha de proteção e distanciar o aluno desse contexto, ignorando que lá na frente ele vai ser inserido em um ambiente competitivo e será avaliado de maneira semelhante". Em outros termos, o estudante precisa “aprender a fazer provas”. Sem essa experiência, o desenvolvimento de algumas habilidades importantes, como a resiliência e a concentração, podem ser comprometidas.
De acordo com Ticiana, a escola é um espaço de proteção para a criança. O desempenho ruim em uma prova ou o repentino desinteresse pelas tarefas de casa podem indicar um problema maior. “Essas práticas pedagógicas também têm essa função social e ajudam a identificar se o estudante está em uma situação de vulnerabilidade.”
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