Um anúncio de uma hamburgueria de Vitória, no Espírito Santo, colocou várias exigências para o candidato à vaga de chapeiro. O informe pede que a pessoa tenha experiência, seja, de preferência, LGBTQ, e não seja do signo de áries. Segundo a publicação, a hamburgueria também daria preferência a uma pessoa dinâmica, engraçada, que more na região da Grande Maruípe, tenha disponibilidade de tempo, seja ágil, não seja "bolsominion" e goste de cerveja.
O anúncio, que gerou repercussão negativa nas redes, foi postado no perfil do facebook da empresa (que não citaremos o nome) na última segunda-feira (11) e apagado nesta terça-feira (12).
De acordo com o proprietário da lanchonete, um rapaz de 24 anos que também não será identificado nesta matéria, a ideia inicial do post era selecionar mais uma pessoa para ajudar ele e a mãe com a demanda do local. A lanchonete familiar abriu as portas em novembro do ano passado, mas, por conta do coronavírus, assim como muitos outros locais, passou a trabalhar apenas com entregas.
"Queria uma pessoa que se desse bem com a gente. Nós estamos dando preferência para pessoas LGBTQ. Eu, como homossexual, já saí de várias entrevistas sem ser contratado por esse motivo. Por isso, abri espaço para eles. Também queria alguém para ter assuntos em comum, para conversar, para que o ambiente de trabalho fosse o melhor possível", explica.
Ele contou ainda que não imaginava que a postagem repercutiria tão negativamente. "Tiveram pessoas que não gostaram e estão nos atacando pelo instagram. Elas falam que somos preconceituosos com héteros. A pessoa que está dentro do grupo LGBTQ vai entender a mensagem que passamos. O pessoal está falando que está sofrendo preconceito, mas eu estou sofrendo há 24 anos", relata.
O problema do post, apesar de bem-intencionado, foi que algumas pessoas se sentiram discriminadas. O advogado e mestre em direito das relações sociais e desembargador do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 17ª Região, Carlos Henrique Bezerra Leite, lembra que a Constituição brasileira de 1988 (art. 3º) tem como um dos objetivos fundamentais promover o bem de todas as pessoas, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade ou qualquer outra forma de discriminação.
"Além disso, a Lei 9.029/1995 também proíbe a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros", aponta.
Ainda segundo o desembargador, nenhuma pessoa pode ser discriminada ou preterida para ser sujeito de uma relação empregatícia por ter determinado signo, determinada posição política, orientação sexual ou por não gostar de bebida.
A especialista em pessoas, carreira e imagem Gisélia Freitas aponta que o empregador só pode colocar no anúncio o que for de conteúdo técnico ou relacionado ao trabalho, como cargo, disponibilidade de horário e preferência do local onde mora. "Quando você fala de questões pessoais, como aparência, tipo físico, se é fumante ou se bebe, é discriminatório", afirma.
Ela ressalta, porém, que, no caso da preferência por pessoas LGBTQ, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) diz que é uma discriminação positiva, ou seja, ela dá preferencia a uma classe minoritária que acaba sofrendo abusos por serem o que são. "No caso dos demais pontos, ele pode acabar sendo processado por discriminação na seleção", aponta.
A diretora técnica da Rhopen, Jaciara Pinheiro, lembra que estamos em uma época de anúncios criativos para realizar o recrutamento, mas é preciso ter cuidado, principalmente nas mídias sociais. "Ele poderia ter escrito que a pessoa precisa ser dinâmica, bem-humorada e com disponibilidade de tempo, por exemplo. São características do perfil profissional, e não características pessoais como preferência política e signo", conta.
Segundo ela, as mídias sociais são um ótimo caminho para reforçar a empresa como inclusiva, mas perder a mão pode prejudicar a imagem dela. "Conseguir que alguém comprasse a ideia da empresa faria mais sentido. Pode-se priorizar, mas sem discriminar", comenta.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta