Simone Azevedo
Acelerada pela crise econômica, que se agravou durante a pandemia da Covid-19, a expansão digital levou pequenos, médios e grandes produtores rurais a aderirem de forma definitiva ao comércio virtual.
O que seria um movimento gradativo de aumento do uso de canais de vendas digitais ocorreu de forma muito mais rápida em função das novas demandas de consumo. Um estudo da McKinsey&Company realizado em 2021 revela que a adoção de plataformas e canais digitais para compras agrícolas cresceu mais no Brasil durante a pandemia do que na Europa e nos Estados Unidos.
Hoje, o agro tech não se restringe aos avanços tecnológicos no campo para aumentar a eficiência da produção. A aplicação do e-commerce no agronegócio brasileiro e capixaba tem representado uma importante revolução cultural e social no setor.
Em 2020, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), com apoio do Ministério da Agricultura, lançou uma plataforma para o comércio eletrônico de produtos agropecuários. No portal, o agricultor cadastra sua região e seus produtos, e o consumidor informa sua demanda.
Produtor rural e presidente da Cooperativa Agroindustrial do Espírito Santo (Agrocoop), Wellington Pompermayer conta que a cooperativa, que possui 76 cooperados, aderiu à plataforma da CNA e tem tido bons resultados com a venda eletrônica.
“Além de pessoas jurídicas que compram os produtos para revender, também vendemos para pessoas físicas que preferem comprar de forma on-line. O comércio eletrônico e as feiras físicas sempre vão coexistir, porque ambos são importantes para o agronegócio. Mas a vantagem do sistema de marketplace é permitir que os produtores rurais e o agronegócio como um todo possam ampliar a divulgação e a distribuição de seus produtos para além das fronteiras do dia a dia. Como o acesso à internet está deixando de ser um problema, o maior desafio hoje para os produtores rurais é criar uma cultura para corresponder à agilidade que o comércio eletrônico demanda”, avalia.
O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado (Faes), Júlio Rocha, destaca que o Espírito Santo já conta com um número significativo de produtores que aderiram ao comércio eletrônico de modo geral e, em especial, ao marketplace.
Julio Rocha
Presidente da Faes
"O sistema de marketplace faz a intermediação na relação entre produtores e consumidores e garante mais celeridade aos negócios e até mesmo a redução do preço final para o comprador, ao mesmo tempo em que o produtor pode aumentar a margem de lucro. São cerca de 1.087 produtores cadastrados, sendo 40 do Espírito Santo. O comércio eletrônico é um caminho sem volta e se transforma em velocidade acelerada"
Diante dessa transformação, Rocha informou que a Faes está realizando um estudo em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) para consultar individualmente os produtores e conhecer suas necessidades e dificuldades. O objetivo é criar ações que impulsionem o comércio eletrônico no agronegócio capixaba.
Em uma iniciativa semelhante, o Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), em parceria com a Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes) e a Secretaria de Estado da Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e Pesca (Seag), está desenvolvendo uma plataforma de venda direta para os agricultores de base familiar no Espírito Santo, com o objetivo de facilitar o agronegócio capixaba e proporcionar mais agilidade à comercialização dos produtos.
A adesão ao aplicativo, que vai se chamar “Feira na palma da mão” e deve ser lançado ainda neste ano, é de 54 propriedades rurais de agricultura familiar e 25 estabelecimentos comerciais, como restaurantes e mercados que demandam maiores volumes de produtos agropecuários.
Mas o coordenador do projeto, Luiz Bricalli, explicou que a abrangência será maior após o lançamento, com o cadastro de mais produtores interessados em vender e o crescimento da procura pelo público consumidor.
“O objetivo do aplicativo é fazer a ligação direta entre o agricultor e o consumidor, para facilitar a comercialização dos produtos da agricultura familiar. Para o consumidor, representa a conveniência de obter produtos com garantia de procedência, segurança e confiabilidade”, ressaltou Bricalli.
Membro do Conselho Regional de Economia do Estado (Corecon-ES), o economista Sebastião Demuner avalia que a expansão digital do agronegócio representa maior agilidade aos negócios e mais possibilidades de redução do preço final dos produtos, mas descarta que isso sinalize o fim das feiras físicas.
“A tendência é que se estabeleça um comércio híbrido, com os negócios físicos sendo complementados e impulsionados pelas vantagens do comércio eletrônico. O fortalecimento do e-commerce no agronegócio exige um tempo maior de aplicação para que haja uma mudança cultural mais profunda. Além disso, ainda existe uma grande dificuldade de acesso dos produtores às tecnologias de comunicação”, analisa Demuner.
Troca de experiência nas redes sociais
Com canais digitais, agricultores aumentam as vendas e divulgam novas técnicas de produção
Produtor rural de São Domingos do Norte, Wagner Canal encontrou nas redes sociais a principal ferramenta para divulgar sua produção de rosas do deserto e seu trabalho com hidroponia.
Além de impulsionar as vendas dos produtos do seu sítio, Wagner destaca que o mais importante na sua relação com as redes sociais é a capacidade que esses canais têm de transmitir informações e, com isso, ajudar outros agricultores com a troca de conhecimentos e técnicas, fortalecendo a agricultura familiar no Estado.
“Além da comercialização dos produtos, a internet e as redes sociais são muito úteis para a troca de informações sobre os problemas enfrentados na propriedade, encontrar ferramentas para melhorar o dia a dia da produção e descobrir soluções e tratamentos para uma doença ou praga, por exemplo”, avalia Wagner.
Além da beleza exótica das rosas do deserto, que atraíram mais de 24 mil inscritos para o canal de Wagner no YouTube, o produtor cultiva café, pimenta, hortaliças, flores ornamentais suculentas, palmito pupunha, seringueira, coco, entre outras culturas.
Toda a propriedade de Wagner é orgânica e ele faz questão de transmitir seus conhecimentos sobre produção, manejo e agroecologia através dos mais de 530 vídeos publicados na plataforma. Alguns têm mais de 10 mil visualizações. Tanto sucesso tem feito crescer as visitas à propriedade e, com isso, as vendas.
“Meu canal ajuda outros agricultores a entrarem nesse ramo, tanto com as rosas do deserto, como com a hidroponia. Produzir em sistema hidropônico é o futuro da agricultura familiar no Estado, porque é uma forma de potencializar a área plantada. Além disso, com o canal na internet, consigo transmitir informações para mais pessoas em menos tempo, potencializando meu tempo de trabalho na lavoura. Então, em vez de dar consultorias individuais, posto os vídeos e consigo trabalhar mais”, explica.
Para facilitar a polinização natural das plantas, a propriedade de Wagner conta com a criação de abelhas, chegando a 40 espécies silvestres, além da tradicional abelha europeia africanizada. A diversidade de culturas, os cuidados com o meio ambiente e o trabalho de divulgação nas redes sociais renderam ao agricultor o Prêmio Biguá de Sustentabilidade 2021, da Rede Gazeta, que destaca as melhores práticas de preservação ambiental.
O contato direto entre produtor e consumidor é uma das principais inovações da revolução que a inserção do agronegócio no mundo digital criou. E as redes sociais são as ferramentas fundamentais dessa aproximação que já se tornou tendência no setor.
Segundo pesquisa realizada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), 68% dos produtores rurais do país comercializam seus produtos por redes sociais ou aplicativos. Em maio de 2020, esse índice era de 58%. O destaque é para o WhatsApp, com adesão de 96% dos produtores que vendem seus produtos pela internet, seguido do Instagram (58%) e Facebook (41%).
O secretário de Política Agrícola e Meio Ambiente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Estado (Fetaes), José Izidoro Rodrigues, disse que, além das outras redes, no Espírito Santo o WhatsApp é o canal preferido dos produtores rurais para fazer a divulgação e a venda de seus produtos.
“São muitas as iniciativas de sucesso, inclusive entre cooperativas que têm utilizado cada vez mais as redes sociais”, comenta.
AGRO CAPIXABA
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