Desde 2014, a autônoma Diana Ferreira Alves da Silva, de 38 anos, trava uma batalha com a balança. Ela engordou 20 quilos na segunda gestação e começou, a partir daquela época, um processo para tentar emagrecer. Conseguiu por um período, mas depois ganhou peso novamente. Agora, está mais uma vez em busca da redução de medidas para manter a saúde.
A sua jornada e a de milhares de pacientes no Estado é pelo SUS, que não oferece tratamento medicamentoso. As estratégias no serviço público se resumem em duas: promover a mudança de hábitos dos pacientes ou, nos casos mais graves, encaminhar à cirurgia bariátrica.
Diana não está sozinha na sua luta. No Espírito Santo, a cada 10 pessoas, sete estão acima do peso ideal. Esse é um indicador que vem crescendo, ano a ano. Como revela o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan), da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), em 2012, 57% da população adulta apresentava sobrepeso ou estava obesa; em 2022, esse índice chegou a 69%.
No ano passado, foram acompanhadas cerca de 150 mil pessoas, cujo Índice de Massa Corporal (IMC) — resultado da divisão do peso pela altura ao quadrado — estava acima do classificado como normal, que varia de 18,5 a 24,9.
A autônoma, que já se encontrava num quadro de obesidade, procurou ajuda e recomeçou seu projeto de emagrecimento em janeiro deste ano. Diana adora fazer — e comer — doces, tomar refrigerante, mas está disposta a abdicar das guloseimas para melhorar sua qualidade de vida.
Assim, além da reeducação alimentar, entendeu que também precisava movimentar seu corpo. Em um parque próximo a sua casa, na Serra, a autônoma viu um grupo fazendo ginástica. Ela abordou o professor e foi orientada a ir até uma unidade de saúde, onde passou por exames e, depois, foi encaminhada para fazer a atividade física.
“Foi tudo bem rápido. Perguntei como faria para entrar, ele me indicou o posto de saúde, onde mediram minha pressão, a glicose e, no mesmo dia, fui liberada. Eu sei que eu preciso focar. Até o final do ano quero chegar a pelo menos 75 quilos”, pontua Diana, referindo-se à meta que estabeleceu para si e que representa uma redução de quase 20 quilos.
150 mil pessoas
com IMC acima do considerado normal receberam acompanhamento do SUS no ES em 2022
Para a aposentada Celita Eduardo Nascimento, 67 anos, as dificuldades perante a balança começaram ainda na adolescência. “Quando tinha 16, já me achava gordinha. Por muito tempo, eu tentei fazer atividade física, perdia peso e depois voltava tudo. Até que ganhei muito peso e comecei a ter problemas de circulação, fiquei deprimida e vi que eu tinha que tomar uma decisão para mudar de vida”, conta.
Assim como Diana, ela foi orientada a se exercitar, prática que adotou três vezes na semana. Contudo, ainda espera pelo acompanhamento nutricional no SUS. As mudanças na alimentação implementou por conta própria, a partir das recomendações que havia recebido certa vez que buscou atendimento particular.
“Mas, se eu faço um feijão-tropeiro, como um pouquinho. Não vou comer muito, nem todo dia, mas não tirei de uma vez. Só não quero ter que tomar remédio”, afirma Celita.
13,1 MILHÕES
PESSOAS DESEMPREAGADAS NO BRASIL
SEM MEDICAMENTO
No entanto, se depender do SUS, realmente não vai ter medicamento para tratamento da obesidade. Pelo menos, até o momento, não há previsão de incorporação ao rol hoje disponível para distribuição gratuita pelas farmácias cidadãs.
“O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece tratamento não medicamentoso como orientação aos usuários e seus familiares quanto à prática de atividade física e dieta, apoio profissional, cirurgia bariátrica e acompanhamento pela Rede de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas”, informou o Ministério da Saúde, em nota, ao ser questionado sobre as estratégias de enfrentamento à obesidade.
A incorporação de remédios não é um procedimento simples, pela série de protocolos exigidos, e também pela necessidade de financiamento. Mas não deixa de ser um desejo na área da saúde.
“Toda incorporação tecnológica, de medicamento ou de terapia, que seja cientificamente provada e testada, é uma felicidade. No caso da obesidade, há pacientes que se beneficiaram muito a partir da incorporação, tudo em uma linha de cuidados de quem realmente precisa. Uma pessoa com cardiopatia, diabética ou quem pode sair da fila da cirurgia em um ano, se perder 15, 20 quilos, por exemplo. Teria um protocolo científico para isso e seria um sonho para todos”, analisa Tadeu Marino, subsecretário da Assistência em Saúde da Sesa.
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O endocrinologista Fernando Gerchman, diretor da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso) e professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), avalia que o SUS está se estruturando para o manejo da obesidade progressivamente e que a incorporação de novas tecnologias para o tratamento da obesidade deve ser realizada.
Gerchman pontua que a entidade, junto a sociedades médicas, está disposta a discutir esse tema com o Ministério da Saúde, de modo a demonstrar para o governo a importância de tratar a obesidade para melhorar a qualidade de vida da população.
DOENÇAS ASSOCIADAS
O diretor da Abeso ressalta que o excesso de peso aumenta a possibilidade de surgimento ou agravamento de outros problemas de saúde, como diabete e doenças cardiovasculares.
“Existe também uma relação importante entre obesidade e transtornos do humor, como depressão, e o risco de várias formas de câncer, a exemplo dos cânceres do tubo digestivo (esôfago, estômago, fígado, intestino). Não só esses, mas também do endométrio, das mamas, cânceres femininos, e um risco aumentado para doença osteomuscular”, frisa Gerchman.
Fernando Gerchman
Diretor da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade
"Com a obesidade, há uma piora muito significativa da qualidade de vida"
Quanto à disponibilização de medicamentos nas farmácias do SUS, o endocrinologista trata como um aspecto complexo a ser debatido. A Abeso, afirma Gerchman, obviamente considera que os remédios para obesidade deveriam estar disponíveis no sistema público.
“No entanto, a discussão é mais ampla que é essa. A questão depende muito de estudos de farmacoeconomia, custo e efetividade dessas medicações e o impacto disso na sociedade. Então, a gente gostaria muito que tivesse essas medicações, mas a gente tem que tentar entender que o Ministério da Saúde tem um orçamento limitado e que tem priorizar todas as doenças”, pondera.
Desse modo, a proposta é demonstrar ao órgão federal a importância de priorização das diferentes medicações e caberia ao ministério decidir o quão prioritário e qual a ordem desses remédios para incorporá-los ao SUS.
“À medida que as medicações estão sendo desenvolvidas e os estudos em andamento estão demonstrando o resultado benéficos, a gente não tem nenhuma dúvida de que, mais cedo ou mais tarde, o Ministério da Saúde vai acabar incorporando algumas medicações para o manejo da obesidade no SUS para os brasileiros", conclui Gerchman.
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