Uma comitiva carregada de informações sobre os cenários educacionais do Brasil e do Espírito Santo, propostas e trabalho de mobilização em torno de políticas públicas voltadas à educação. Assim é formada a Caravana Educação Já que desembarcou em Vitória em abril. O Espírito Santo foi o primeiro estado a receber a equipe do Movimento Todos Pela Educação.
Os encontros envolveram conversas com pré-candidatos ao governo do Estado, trabalhadores da educação e representantes de diversos segmentos da sociedade civil organizada.
Em entrevista para A Gazeta, o diretor-executivo do Todos, Olavo Nogueira Filho, disse que a ideia é circular por outros 13 Estados. Além de apresentar dados, um dos principais objetivos é colocar a educação na pauta eleitoral e na agenda política a partir das gestões iniciadas em 2023.
“Ano de eleição, para uma organização como o Todos, que faz advocacy, é muito importante, sobretudo por dois motivos: é quando abre-se um debate sobre agendas estruturais. E o pós-eleição, quando há oportunidade de avançar nessas propostas”, detalha.
De acordo com Olavo, o Espírito Santo é um bom exemplo para as demais unidades federativas. Um dos motivos é o fato do Estado ter conquistado média 4,8 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) considerando escolas públicas e particulares.
“Por que isso? Porque o Espírito Santo tem uma trajetória, desde as últimas duas décadas, em que diferentes gestões concentraram algumas políticas respaldadas nas evidências. Foram governos que buscaram o que havia de melhor em outros estados para implementar aqui”, salienta.
Qual a importância da caravana?
Os estados assumiram um protagonismo muito relevante na condução para políticas públicas educacionais. Sob uma lógica nacional, o caso da pandemia foi outro evento importante nesse sentido. Mais uma vez, o governo (federal) ausente de tentar coordenar uma resposta articulada com os estados e município. Não fez isso e deixou cada um à sua própria sorte. Já no ano passado, a gente percebeu que tem um papel importante que os estados podem cumprir sob uma lógica de avanço nacional na educação. Aí incluímos no nosso trabalho de advocacy, em ano de eleição, uma incidência muito forte em âmbito estadual. Temos a esteira nacional com os presidenciáveis, mas abrimos essa frente estadual em pelo menos 14 estados nos próximos quatro meses. Vamos passar basicamente de três a quatro dias no estado.
Além de falar com os pré-candidatos ao governo do Estado, quais são as agendas desenvolvidas nos estados visitados?
Primeiro, vamos conversar com os pré-candidatos. O objetivo é levar a produção de conhecimento sobre a agenda estadual, apresentar boas experiências e mostrar dados, por exemplo. O segundo ponto é tentar mobilizar os candidatos para trazer a agenda educacional com força na campanha, mas fundamentalmente, caso sejam eleitos. Vamos ouvir a comunidade escolar para aprender sobre a realidade do local. Além disso, também vamos promover um encontro com influenciadores digitais, empresários e jornalistas. A ideia é tentar mobilizar os formadores de opinião para falar da educação e sua importância para o desenvolvimento do país. Vamos tentar mobilizar e convencer quem ainda não está convencido de que a educação não resolve tudo, mas sem ela, a gente não consegue chegar lá.
Na avaliação do Todos, quais são os indicadores do Espírito Santo que chamam a atenção no cenário nacional?
Quando você olha os principais indicadores, seja de aprendizagem, de fluxo ou evasão, quando você compara o estado do Espírito Santo entre os outros estados brasileiros, ele está entre os mais bem posicionados em quase todos os indicadores. Inclusive, em aprendizagem, no ensino médio, o estado é o número um. Qual é o estado onde os estudantes do ensino médio mais aprendem? É o Espírito Santo. “Por que isso? Porque o Espírito Santo tem uma trajetória, desde as últimas duas décadas, em que diferentes gestões concentraram algumas políticas respaldadas nas evidências. Foram governos que buscaram o que havia de melhor em outros estados para implementar aqui. Foram ao Ceará e viram o que funcionava bem em alfabetização e como o estado ajuda o município a fazer isso. Foram para Pernambuco olhar o que tinha de melhor no ensino médio. Então, você tem uma trajetória de políticas informadas pelas evidências e com razoável continuidade. Esse é o grande lance, tem uma variável que está presente em todas: continuidade. O que a gente tem visto nas experiências é que em duas ou três boas gestões, você consegue mudar o jogo, mudar a política e ter reflexo positivo no estado.
Tem algum indicador ou fator que o Espírito Santo ainda precisa melhorar?
Ainda que o Espírito Santo, quando você olha para todos os indicadores e do ponto de vista comparativo, ele está entre os mais bem posicionados. Quando você percebe que ao lado do Espírito Santo, nesses múltiplos indicadores, você tem estados como Ceará e Pernambuco começa a entender que dá para fazer muito melhor no Espírito Santo. Por que? Quando você olha o PIB per capita do Ceará e compara com o PIB per capita do Espírito Santo, o Ceará é metade. Então, numa situação muito mais desfavorável, você tem estados como Ceará e Pernambuco que estão atingindo os mesmos resultados absolutos. Se você relativiza e coloca o ponderador pobreza, o Espírito Santo está devendo. Essa é a primeira ressalva a ser feita. A outra ressalva que tem que ser feita é quando você olha aprendizado. Quando eu disse que o Espírito Santo é o estado onde os alunos mais aprendem. Ok. Esse é o dado comparativo, mas quando você olha o dado objetivo. na Língua Portuguesa, 3ª série do ensino médio, os alunos que chegam até o final e se formam: 50% terminam sem aprender o nível adequado que se esperaria para a Língua Portuguesa. Em Matemática: 85% dos alunos concluem a escola sem saber o que deveriam saber. Tem muita coisa a fazer. A gente tem uma oportunidade nas próximas gestões. O Espírito Santo está numa posição para conseguir elevar esse patamar do resultado brasileiro para um outro nível.
Como os estados podem contribuir para promover uma mudança do cenário nacional da educação?
Acelerar as políticas que estão postas, dar continuidade e aprimorar e responder a uma pandemia que teve um impacto brutal. Os dados que a gente tem hoje são pré-pandemia. A próxima gestão tem que se concentrar em entender o que aconteceu e o que é preciso fazer à luz disso. Mudar currículo, repensar estratégias de alfabetização. Os alunos que estavam no primeiro ano quando entraram na pandemia, hoje estão no 3º ano do ensino fundamental. Eles não foram alfabetizados. Esses meninos e meninas estão no 3º ano sem saber ler e escrever. Alfabetização é no primeiro e segundo ano. Agora, é preciso mudar a lógica de atuação trazer a alfabetização para 3º, 4º e 5º ano. Se não fizer isso, vamos ter problema. O Estado conseguiu avançar em políticas estruturais de tempo integral e conseguir dar uma resposta contundente à luz do que aconteceu. Esse é o desafio para quem está se aventurando a ser candidato a governador ou governadora. E tem um quadro comparativo no Brasil, o Espírito Santo está numa posição privilegiada. Isso é bom para almejar coisas melhores.
Quais são os maiores desafios no campo da educação nacional?
Não tem bala de prata, mas tem algumas variáveis que as pequisas mostram que são as chamadas condições necessárias. A principal delas é recursos humanos: professores e diretores. Ter uma profissão docente forte, diretores escolares bem preparados, com perfil, é absolutamente central para ter bons resultados. Outro ponto é formar melhor os professores, mais material pedagógico, estruturar o processo de seleção de desenvolvimento profissional, politica de valorização, remuneração. O segundo problema nessa agenda é a formação inicial de professores. O Brasil não prepara os professores para exercício da docência. Essa é uma agenda de governo federal porque é fundamentalmente de ensino superior. Se a gente não tocar nessa agenda nos próximos anos, vai ser muito difícil elevar esse teto. Outro fator são investimentos em diversas áreas para atender a primeira infância. Essa é uma agenda multisetorial que contempla a educação na pré-escola. A gente não investe, tem algumas políticas pouco integradas. Alguns estados começaram a fazer isso, mas como é uma agenda municipal com assistência social, saúde na primeira infância e educação infantil tem relação com o município. Como o município tem políticas muito frágeis de um modo geral para a primeira infância, daí a importância de um governo federal e do estado para ajudar.
O senhor pontuou sobre a importância da boa gestão das redes de ensino como um fator importante. Que tipo de atenção esta pauta precisa?
Outro desafio é a qualidade de gestão das redes. O Brasil tem um problema histórico, mas não é um enorme gargalo para gente conseguir avançar que é a questão do financiamento. O descaso histórico do financiamento que é vergonhosos. Se olhar 1970, se a gente fala dos países mais desenvolvidos, estão há 50 anos investindo 5% do PIB. O Brasil em 1970 investia 1,5%. Aí a gente consegue entender porque 50% das crianças em 1970 não estava nem na escola. Muitos desses são os pais ou avós de crianças que estão na escola hoje. Nos anos 2000 teve aumento significativo do investimento per capita e você começa a resolver o problema do financiamento crítico. No novo Fundeb a gente trabalhou fortemente para mudar as regras para dar mais dinheiro para os municípios mais pobres. Em quatro cinco anos você vai eliminar o financiamento crítico. É uma faixa de investimento onde é impossível ter resultado.
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