A impunidade do assassinato de Araceli Cabrera Crespo, aos 8 anos, é uma das marcas do caso, que chocou o Espírito Santo e ganhou repercussão nacional. Há 50 anos, em maio de 1973, a menina foi sequestrada, drogada e violentada. Seu corpo foi abandonado em um matagal nas proximidades do Hospital Infantil de Vitória, e a autoria do crime nunca foi esclarecida.
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O fato de o culpado ou os culpados nunca terem sido condenados é, em parte, atribuído a falhas nas investigações realizadas na época do crime. A lisura do trabalho foi inúmeras vezes questionada, sobretudo porque um dos suspeitos, que depois foi denunciado pelo Ministério Público do Espírito Santo, era próximo de policiais e acompanhava diligências.
Houve tentativa de incriminar inocentes, pressão para confissões, mortes consideradas suspeitas, fotos da perícia que sumiram. No fim, por falta de provas, a Justiça não condenou nenhum dos acusados. Hoje, em um crime com as mesmas características, o que seria diferente?
O perito oficial criminal Vinícius Médici de Oliveira aponta que, na polícia científica, a evolução ao longo do tempo ocorreu através da especialização, tanto técnica (pessoal) quanto tecnológica. Até a estrutura dedicada ao trabalho pericial foi ampliada. Há 50 anos, eram apenas quatro seções; hoje passam de 10, como engenharia e odontologia forense, sem contar os laboratórios químico-biológicos. Ele observa que a partir da criação da Secretaria Nacional da Segurança Pública (Senasp), nos anos 2000, o governo federal também passou a destinar mais recursos a essa finalidade.
Quando Araceli foi morta, havia apenas um perito de local de crime para todo o Estado. Agora, os profissionais estão divididos por regionais e, contando todas as áreas, somam em torno de 400 pessoas, segundo a perita oficial criminal Ana Cecília Gonçalves Santos. Naquela época, a polícia também recorreu a professores da Ufes para comparar a arcada dentária do cadáver com fotos da menina para buscar similaridade e fazer a identificação do corpo.
Entre os avanços tecnológicos, um dos marcos foi a implementação do exame de DNA nas investigações policiais a partir de 2006. Hoje, conta Ana Cecília, o Estado é referência nacional, com diversas certificações que atestam a eficiência do trabalho pericial.
O DNA serve não apenas no reconhecimento de vítimas, como ainda ajuda a identificação de criminosos. O perito oficial criminal Lucas Vianna explica que vestígios encontrados em locais de crime, como chinelos e bonés, podem conter células dos suspeitos. "Além disso, não precisa de registro prévio, como é o caso das digitais e das arcadas dentárias", pontua.
Do Rio de Janeiro, o delegado José Darcy Arruda chegou ao Estado em 1992, apenas um ano antes de o crime prescrever, ou seja, quando se completam 20 anos do assassinato e ninguém mais pode ser punido. Apesar de o caso Araceli já estar na esfera judicial, o atual chefe da Polícia Civil do Espírito Santo se recorda que era muito rumoroso por envolver nomes da elite capixaba da época. Por outro lado, não teve informações sobre como havia sido a condução do trabalho policial até o julgamento.
"Eu não tenho condições de falar a respeito, se houve alguma coisa que interferiu na investigação ou não. O que eu posso dizer é que, naquela ocasião, nos anos 1970, em 1973, a investigação era muito rudimentar, era o homem tão somente, a investigação mesmo era o feeling do policial", pontua.
Arruda destaca que, atualmente, a Polícia Civil trabalha com muito mais recursos tecnológicos, graças a investimentos feitos nos últimos anos, e com profissionais cada vez mais qualificados.
“Posso citar para você o exemplo daqueles meninos de Linhares. Na ocasião, o trabalho feito pela perícia no local do crime, o trabalho da perícia feito no corpo dos meninos foi primordial, aliado ao conhecimento dos delegados e investigadores, para poder chegar na figura do pastor", afirma o delegado, numa comparação do caso Araceli com o das vítimas de Georgeval Alves, condenado em abril a 146 anos de prisão por violência sexual, tortura e morte do filho Joaquim Sales, de 3 anos, e do enteado Kauã Sales, 6, em 2018.
Arruda reforça que equipamentos modernos e novos recursos têm sido incorporados à atividade da polícia científica. Um dos mais recentes é o sistema Ibis, que possibilita comparação de projéteis usados no Espírito Santo e em outros Estados, de modo a identificar se a arma analisada foi utilizada em mais de um crime.
"A própria população percebe que conseguimos dar resultado muito rápido em razão do avanço orientado pela inteligência. Então, hoje nós trabalhamos muito com recursos tecnológicos. Temos um bom sistema de laboratórios forenses, um bom laboratório de DNA, temos um centro de inteligência de análises telemáticas, temos cercos inteligentes, cercos eletrônicos, geolocalizações. Então, hoje temos muitos recursos aliados ao conhecimento do homem", conclui José Darcy Arruda.
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