Valdir Campos, psiquiatra e professor da Ufes que participou de pesquisa que embasou a Lei Seca
Valdir Campos, psiquiatra e professor da Ufes que participou de pesquisa que embasou a Lei Seca. Crédito: Acervo pessoal

Como um pesquisador da Ufes ajudou na criação da Lei Seca

Vitória foi incluída em estudo por realizar o projeto Madrugada Viva, iniciativa do Detran com parceria da PM, que consistia em fiscalizações constantes

Tempo de leitura: 3min
Vitória
Publicado em 19/06/2023 às 14h20

Instituída há exatos 15 anos, em 19 de junho de 2008, para impedir que motoristas dirijam após beber, a Lei Seca se baseou em uma pesquisa que teve a participação da Ufes, com atuação destacada de um professor da universidade. O psiquiatra Valdir Campos foi um dos pioneiros, no Brasil, em estudo que demonstrava os efeitos do álcool no organismo e os riscos do consumo antes de dirigir.

O trabalho foi conduzido pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e, a princípio, na cidade paulista de Diadema, onde os índices de homicídio eram elevados e muitos deles associados à ingestão de bebida alcoólica.

Então, em 2005, Campos foi convidado pelo professor da Unifesp Ronaldo Laranjeira, mentor da pesquisa, para realizar estudos sobre direção e álcool em capitais brasileiras.

“Iniciei os trabalhos em Belo Horizonte (MG). Foi um desafio grande porque, imagine, precisava parar os automóveis nas ruas, aplicar os testes. Não havia nem os bafômetros”, lembra o professor da Ufes. Mas os equipamentos foram adquiridos para a realização do estudo e, hoje, estão popularizados nas blitze de trânsito.

Primeiro, a proposta precisou ser apresentada ao governo de Minas Gerais e à Polícia Militar daquele Estado para autorizar as abordagens nas ruas da capital mineira e, sobretudo, para que os motoristas flagrados com nível de álcool no organismo superior ao permitido na época (seis decigramas por litro de sangue) não sofressem sanções.

Quando a infração era constatada, para que o motorista não continuasse dirigindo, outra pessoa que não tivesse bebido assumia a direção do veículo. “E, de fato, consegui fazer o primeiro estudo, aplicando a metodologia proposta, sobre álcool e direção”, afirma.

Faixa especial Lei Seca 15 anos
Faixa especial Lei Seca 15 anos. Crédito: A Gazeta

Depois, Campos ingressou na Unifesp para fazer mestrado — e doutorado na sequência —, ampliando mais a pesquisa. Na atividade acadêmica, levou o estudo à capital paulista, a Vitória e a outras 10 regiões de Minas. Do Sudeste, somente o Rio de Janeiro não participou, na época, por falta de um parceiro local, como foi a Ufes para o Espírito Santo.

Valdir Campos

Psiquiatra e professor da Ufes

"Lá em Belo Horizonte, 38% dos condutores dirigiam alcoolizados, e isso nos preocupou, a ponto de querer verificar em mais lugares. Então, partimos para investigar em outras capitais. Em cada capital, havia um professor da universidade para conduzir"

Campos observa que, entre as cidades pesquisadas, Vitória tinha vantagem por realizar o projeto Madrugada Viva, iniciativa do Detran com parceria da PM, que consistia em blitze de maneira sistematizada para impedir motoristas dirigindo sob efeito de álcool.

Ao fazer esse trabalho nas capitais, o professor publicou seis artigos inéditos — 4 nacionais e dois internacionais — e, à medida que eram coletados e divulgados os dados, a discussão sobre o consumo de bebida alcoólica associado à direção ganhou projeção.

“Foi um debate intenso no Brasil inteiro e chegou ao Congresso Nacional. Assim, foi motivada a criação da Lei Seca, até porque, em outros países, já era preconizado o consumo zero de álcool e, nos países onde não era zero, os níveis de ingestão não eram tão altos quanto os do Brasil — aqui eram até cinco vezes maiores."

Campos adverte que o consumo do álcool afeta o desempenho do condutor no momento de frear, mudar de faixa, tomar uma decisão em fração de segundo. À medida que a pessoa vai bebendo, o risco vai sendo dobrado.

Um aspecto constatado pela pesquisa de quase 20 anos atrás — e que se mostra atual — é que os motoristas que ofereciam risco não eram dependentes de álcool, mas pessoas comuns, que saem nos finais de semana e bebem em festas, bares e restaurantes.

Questionado sobre os reflexos da Lei Seca, Campos avalia que, no início, havia mais fiscalização e até maior apoio popular.

Valdir Campos

Psiquiatra e professor da Ufes

"O nosso objetivo, ao fazer a pesquisa, não era criar leis e, sim, prevenir o uso de álcool associado à direção. Mas tentamos de certa forma subsidiar os parlamentares para que pudessem criar uma forma para reduzir os índices de mortalidade no trânsito. Só precisa haver uma constância nas ações. Houve um certo relaxamento no país inteiro. A questão passa pela prevenção"

Campos diz ainda que os estudiosos apontam que a medida que mais surte efeito é a velocidade com que a multa é aplicada. “Fez agora, paga. Não é só aplicar a lei em si, tem que ser veloz”, conclui o professor.

A Gazeta integra o

Saiba mais

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.

A Gazeta deseja enviar alertas sobre as principais notícias do Espirito Santo.