Alvo de reclamação antiga dos moradores de Jardim Camburi, em Vitória, devido ao mau cheiro, a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) situada na área do Aeroporto de Vitória, nas imediações do bairro, deverá ser substituída por uma Estação Elevatória (EE) até 2025.
Com a mudança, as lagoas de resíduos - chamados pela população de "penicão" - serão esvaziadas e a água extraída pelo novo sistema vai ser utilizada pela ArcelorMittal Tubarão, produtora de aços planos localizada entre Serra e Vitória.
A indústria assinou com a Companhia Espírito Santense de Saneamento (Cesan), nesta quarta-feira (1º), um termo de compromisso para reaproveitar os efluentes e reduzir consumo de água do Rio Santa Maria pela siderúrgica.
O projeto prevê a construção de uma estação elevatória de esgoto bruto no lugar da ETE de Jardim Camburi, uma espécie de tanque que terá a função de bombear o material.
De lá, vai partir uma tubulação até o polo industrial da ArcelorMittal Tubarão, no bairro São Geraldo, na Serra, onde será implantada a nova estação de tratamento numa área de 11 mil metros doada pela siderúrgica.
Nessa nova unidade, a água será tratada e disponibilizada para fins industriais. É a chamada água de reúso, que não serve para consumo humano, mas poderá ser utilizada nas operações da companhia. A capacidade estimada de produção da estação é de até 200 litros por segundo.
No local onde hoje funciona a ETE, as lagoas serão esvaziadas e o lodo será destinado a um aterro sanitário. Toda a área será tratada e desinfectada. Serão investidos R$ 130 milhões em todo o projeto.
O gerente de Parceria Público-Privada (PPP) da Cesan, Douglas Couzi, aponta que, com a implantação desse modelo, a previsão é que a planta capixaba da ArcelorMittal reduza o consumo no Rio Santa Maria, aumentando a disponibilidade da água para a população da Região Norte de Vitória e de seis bairros da Serra - Nova Carapina I, Eurico Salles, Bairro de Fátima, Manoel Plaza, Hélio Ferraz e Rosário de Fátima - beneficiando mais de 150 mil pessoas.
"Cada vez mais a água se torna um bem escasso. Esse projeto vem, inclusive, em um momento que o país vive uma crise hídrica. Vamos utilizar a água que sobra do tratamento do esgoto, que era jogada fora, para fins industriais e, assim, liberar água doce para uma parcela da população", valoriza.
Essa proposta começou a ser desenhada em 2017, na gestão passada, quando o governo do Estado lançou o Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI), de modo a identificar empresas dispostas, entre outras medidas, a adquirir água de reúso (não potável) para fins industriais.
Na época, estimava-se que a licitação do projeto para as obras pudesse ser realizada ainda naquele ano e, se fosse cumprido o cronograma, no início de 2020 o novo sistema de tratamento de esgoto já estaria concluído.
Douglas Couzi pontua que, desde o momento em que a ArcelorMittal demonstrou interesse, as duas empresas conduziram estudos de viabilidade técnica, econômica e financeira para a implementação da proposta.
A modelagem do projeto foi definida recentemente e, nesta quarta, a oficialização ocorreu com a assinatura do termo de compromisso com a participação do governador Renato Casagrande e do presidente da ArcelorMittal Brasil e CEO ArcelorMittal Aços Planos América do Sul, Benjamin Baptista Filho, que deixará o cargo em 30 de setembro e assumirá em 1º de outubro a presidência do conselho de administração do grupo no Brasil.
A próxima etapa, segundo Douglas Couzi, será a submissão do projeto ao Tribunal de Contas e à Procuradoria Geral do Estado (PGE) para validação e, então, será aberto um pregão na Bolsa de Valores de São Paulo, B3, para licitação das obras. Considerando os prazos legais, o gerente da Cesan estima que o projeto terá a ocorrência realizada no primeiro semestre de 2022.
"Licitando, o início do contrato será ainda 2022 para elaboração de projeto executivo e as licenças ambientais. As obras estão previstas para execução entre 2023 a 2025, com expectativas desse prazo até ser reduzido por consultas prévias ao mercado", calcula.
Questionado se apenas a ArcelorMittal Tubarão terá direito à aquisição da água de reúso, o gerente da Cesan explica que, em um primeiro momento, a siderúrgica terá prioridade, mas o projeto prevê a ampliação. Se houver outros interessados, caberá a siderúrgica a responsabilidade de uma eventual subconcessão.
O acordo prevê a compra mensal para fins industriais de 540 m³/h (150 l/s) de água de reúso de esgoto sanitário. A aquisição será feita por contrato de 25 anos, que pode ser renovado.
O gerente geral de Sustentabilidade e Relações Institucionais da siderúrgica, João Bosco Reis da Silva, conta que a empresa, ainda em 2014, havia estabelecido um plano diretor de águas, em sua política de sustentabilidade para reduzir o impacto ambiental da atividade, mas naquele momento não estava previsto o reúso de água de efluentes, e sim outras estratégias.
No ano seguinte, porém, com a crise hídrica e o racionamento que afetou a indústria, passou-se a analisar que medidas poderiam ser adotadas para diminuir a vulnerabilidade e, paralelamente, aumentar a segurança hídrica, tanto da empresa quanto da sociedade.
"O pensamento era que não adiantaria encontrar uma solução intramuros e, do lado de fora (da empresa), ter uma situação insustentável", pontua o gerente da ArcelorMittal Tubarão. E, em conversas com o governo do Estado e estudos da própria siderúrgica, chegou-se à proposta de compra de água de reúso da estação de tratamento. Nas primeiras análises, ainda não havia definição sobre a unidade da qual partiria o recurso, mas com o avanço das avaliações técnicas e de viabilidade, a de Jardim Camburi foi a que melhor atendeu à demanda da siderúrgica pela sua capacidade de produção.
João Bosco diz que, desde o fim das restrições determinadas pelo governo em 2016, a siderúrgica já havia decidido se impor um racionamento e limitou o consumo de água do Rio Santa Maria a 1.840m³/h. Com a compra de água de reúso da ETE, com o novo projeto, estima-se uma nova redução de 540m3/h, o equivalente a quase 30%. Soma-se a essa iniciativa, a proposta de dessalinização da água do mar, cuja planta será inaugurada neste mês e que deverá reduzir a demanda sobre o rio em outros 30%.
Embora reduza o consumo, a demanda sobre o rio sempre vai existir. João Bosco explica que, na empresa, circulam cerca de 10 mil trabalhadores - próprios e terceirizados - para os quais se requer água potável. Por essa razão, também, a siderúrgica investe na preservação de nascentes em Santa Leopoldina.
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