Jornalismo e redes sociais são assuntos que sempre dão o que falar, especialmente com a digitalização mais acelerada trazida pela pandemia. Nesses tempos de Covid-19 e alta tensão em diversas esferas do dia a dia, alguns aspectos profissionais que ainda eram muito presenciais passaram a ser resolvidos em formato virtual. Inclusive discussões e embates. Por isso, o lançamento do 24º Curso de Residência em Jornalismo da Rede Gazeta, na próxima terça (03), vai debater “Redes sociais e engajamento em tempos de alta tensão” com transmissão ao vivo em A Gazeta, a partir de 14h30.
O papo será entre os jornalistas Murilo Busolin, coordenador do Estadão Blue Studio, comentarista da Rádio Eldorado e colunista de cultura pop do Estadão; e Carolina Morand, âncora do programa Ponto Final CBN e apresentadora do podcast “Ao Ponto”, de O Globo.
Em conversa com A Gazeta, a dupla adiantou um pouco do papel das redes socais no dia a dia de cada um, seja no trabalho, seja na vida pessoal. A entrevista, como tantas coisas no noticiário de hoje em dia, foi feita à distância, por e-mail. Confira a seguir:
Não é de agora que o jornalismo faz uso das redes sociais, seja pra encontrar fontes ou acompanhar repercussões. Na rotina da função de cada um, quais as principais vantagens que vocês encontram nas redes sociais?
Murilo: Eu utilizo redes sociais quase que 24 horas por dia. Desde quando criei e apresentei o Drops Estadão, entre 2017 e 2019 (programa de notícias nos stories no perfil do jornal Estadão no Instagram - @estadao), utilizava as redes sociais como termômetro do que era mais relevante, mais quente, com mais possibilidades de discussão nos vídeos curtos. Muitas pautas podem surgir de debates no Twitter, de comentários no Instagram, de respostas no Facebook.
Como social media/jornalista de cultura por anos, elas são as minhas principais aliadas. Como colunista de jornal impresso e de rádio eu produzo diretamente com o que está acontecendo no mundo através das interações nas redes sociais. As visões de um mesmo assunto costumam se confrontar ou se completar nessas plataformas e eu prefiro escrever temas que venham dessas vias, pois dificilmente seriam discutidos em um jornal impresso.
Carol: As redes sociais se transformaram em fonte de informação, uma vez que até autoridades e órgãos oficiais hoje se manifestam por lá. Mas não é apenas isso. As redes nos ajudam a sentir a temperatura dos assuntos entre as pessoas, o que mais está repercutindo e de que forma. Muitas vezes algo que ganha destaque nas redes acaba virando pauta. Também servem para estreitar a relação com público e ter feedbacks em tempo sobre o que estamos falando na rádio, por exemplo. E em tempos de polarização ideológica, o monitoramento das redes também é importante para identificar narrativas e a mobilização de grupos políticos.
A pandemia digitalizou ainda mais o dia a dia de todos nós, e não seria diferente para o jornalista. Como cada um percebeu essa mudança desde o início dos protocolos, com quarentena e distanciamento?
Murilo: Sinceramente? Só me trouxe mais praticidade com o meu atual trabalho (redes sociais de conteúdos patrocinados + colunista). As reuniões são muito mais precisas e com tempo hábil. Também senti mais facilidade para conseguir certas entrevistas que seriam praticamente impossíveis em tempos sem coronavírus. Está tudo mais próximo, mais humanizado.
Só é preciso ficar atento com a síndrome de ‘dá pra fazer tudo hoje’, pois como estamos todos trabalhando em casa, ou pelo menos a maioria, foi necessário reforçar alguns limites de horários para resolver as questões de trabalho em seu devido tempo. A digitalização veio pra ficar.
Carol: Eu trabalhei em home office praticamente durante toda a pandemia, o que seria inimaginável antes. Tive que me adaptar para gravar podcasts e apresentar programas ao vivo de casa. Todas as discussões a respeito de pautas e produção passaram a ser virtuais, assim como o contato com as fontes. Na vida pessoal, tudo mudou também, radicalmente. Os encontros passaram a ser virtuais, com muitas reuniões de amigos por zoom e trocas de mensagens.
Se de um lado as redes sociais ampliaram o alcance das matérias e o acesso a outras fontes, por outro, também são um espaço fortemente ocupado pela proliferação de desinformação. Neste aspecto, qual seu ponto de vista para essa relação conflituosa entre as redes x o jornalismo?
Murilo: O impacto de uma reportagem online é gigantesco nos dias atuais. Enquanto as redes sociais tendem a crescer absurdamente a cada ano, é de extrema importância fomentar o trabalho dos profissionais da comunicação no combate das fake news.
É por isso que a relação de redes + jornalismo precisa ser harmoniosa, é uma questão de trabalho de equipe na construção de um bom jornalismo atual e com credibilidade. Para isso temos diversas ferramentas jornalísticas, como os que trabalham com o ‘fact check’ para quem não consulta a fonte de qualquer informação repassada nas plataformas.
Carol: Infelizmente, as redes potencializaram a velocidade de transmissão de notícias falsas e cabe a nós, jornalistas profissionais, combater a desinformação. O trabalho das agências de checagem e dos veículos de imprensa, com projetos como o "Fato ou Fake" do grupo Globo, é essencial nesse aspecto. Por isso também é importante estar presente em diferentes bolhas da internet, seguindo perfis de vários espectros, até para mapear e identificar as notícias falsas e suas fontes.
Para além do jornalista, qual a relação pessoal de vocês com as redes sociais? E, especialmente para Carol: como é isso também com a sua filha?
Murilo: Como eu trabalho diretamente com redes sociais, a minha relação foi sempre muito próxima e eu costumo levar um pouco do que aprendo com essas experiências para o meu trabalho. As reações, as percepções, o que já está em desuso, o que está começando a chamar a atenção, alguns alertas e aprendizados.
Tento manter até o limite máximo entre o prazeroso e saudável, já que a internet é um terreno bem perigoso e ainda mais se tratando de questões pertinentes hoje em dia (especificamente na pandemia), como a nossa saúde mental. É um pouco da minha identidade inserida no meu trabalho, mas com aquela filtrada necessária, sem a necessidade de criar um personagem diferente da vida real, pois a ‘tiktokzação’ das profissões é algo real.
Carol: Eu sempre estive presente nas redes sociais, mas até alguns anos de uma forma mais reservada. Meu Facebook, por exemplo, é pessoal. Ali posto fotos da minha filha e da minha vida pessoal, de maneira restrita aos amigos. Já no Instagram, misturo mais vida pessoal e profissional, mas evito postar fotos da minha filha, por exemplo. O Twitter é uma conta mais profissional, e intensifiquei minha participação nessa rede nos últimos anos. É ali que interajo mais com os ouvintes, compartilho reportagens, faço algumas análises do noticiário, mas também acabo revelando parte da minha rotina e gostos pessoais. Acho que é impossível ser 100% institucional nas redes, é preciso saber mesclar pessoal e profissional, sempre tendo cautela com a exposição excessiva.
Para finalizar, aquela dica básica de quem já tem experiência: o que um jovem jornalista hoje não pode deixar de saber/usar nas redes sociais?
Murilo: É de bom tom (rs) o jovem jornalista ao menos criar uma conta em todas as redes sociais em atividade. Por mais que ele não vá utilizar, é necessário observar o que está nos trendings. Ter uma experiência diante de notícias e usuários, principalmente entre os mais jovens, amplia a sua visão na profissão, que há muito tempo passou a ser multimídia – hoje em dia temos até uma seção especializada em notícias no Tik Tok, aplicativo conhecido pelas dancinhas virais.
É bom saber dosar tudo que vem a público. A resposta dos internautas é rápida e é preciso um jogo de cintura experiente para lidar com as reações e com o rumo que isso pode tomar.
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Carol: Acredito que os mais jovens dominam a linguagem e a forma de produção de conteúdo nas redes, mas talvez acabem se expondo em excesso. É preciso lembrar que o print é eterno, uma vez nas redes um post, comentário, foto ou vídeo não tem volta. Então vale lembrar que a vida é longa e a carreira também, e não sabemos que tipo de trabalho podemos vir a fazer no futuro. Outra tentação creio que é a confusão entre ser jornalista e celebridade. É claro que é importante ter seguidores e construir uma audiência, mas jornalista não é personalidade e não deveria ser o foco da notícia.
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