Um e-mail foi anexado, nessa segunda-feira (16), como uma nova prova, ao processo onde vão ser julgados os seis acusados pelo assassinato da médica Milena Gottardi. O advogado Leonardo Gagno, que faz a defesa do ex-marido Hilário Frasson, afirma que a mensagem foi escrita por Milena e que foi localizada no computador de Hilário — e que por isto fez o registro em cartório de uma ata notarial, há dois anos.
No texto do e-mail, Milena Gottardi relata estar “confusa”, “que precisava de um tempo para pensar”, que “foi incentivada por algumas pessoas” a recorrer a uma medida judicial contra ele e que sua “consciência pesou” diante de sua “postura precipitada”. O elogia pelos cuidados com as filhas e conclui a mensagem: “eu ainda te amo”.
Gagno informa que a mensagem foi encontrada no computador de Hilário e que fez o registro em cartório de uma ata notarial, em 5 de abril de 2018. “Para comprovar que a mensagem foi retirada do e-mail do Hilário, para onde foi enviada por Milena. Lembrando que ele foi preso semanas após o crime e não tem acesso à internet. Ele forneceu a senha e me autorizou a entrar em sua nuvem, onde está o e-mail”, relatou.
A mensagem foi anexada nessa segunda-feira (16) ao processo, que já conta com mais de 12 volumes. O crime aconteceu em 14 de setembro de 2017 e seis pessoas vão ser julgadas, incluindo o ex-marido. Também foi anexado a ata notarial, registrada no Cartório do 3º Ofício de Notas.
O documento cartorial aponta que o e-mail tem data de 6 de abril de 2017, e que foi enviado às 4h14. "Acessando a caixa de entrada do e-mail Hotmail, com o endereço [email protected], que figura como em nome de Hilário Antônio Fiorot Frasson, acessado pela solicitante no computador desta serventia, através do endereço https:/outlook.live.com/owal/?path-/mailinbox/rp, as 09:51h(nove horas e cinquenta e um minutos), constatei a seguinte mensagem de correio eletrônica", diz o texto.
E-mail que Milena enviou para Hilário
A mensagem foi anexada como uma nova prova, ao processo, nessa segunda-feira (16)
No dia anterior, 5 de abril de 2017, a médica tinha registrado em cartório uma carta onde relatava seus medos, angústias e as dificuldades no processo de separação de Hilário. Pediu ainda que caso algo acontecesse com ela, que a guarda das filhas fosse entregue a seu irmão, Douglas Gottardi. Esta carta foi encontrada pela família após o crime e entregue à polícia.
Leonardo Gagno aponta que há uma sincronia entre as duas provas: a carta que Milena registrou e o e-mail que Hilário recebeu. “Uma sincronia que confirma o ato de arrependimento de Milena. Há a questão temporal, uma ação foi realizada em seguida da outra. Ou seja, Hilário não tinha como abordar um assunto sobre algo que ele nem imaginava, visto que ele somente soube da carta deixada por Milena após a sua morte”, observa.
O QUE DIZ O TEXTO DO E-MAIL
No primeiro parágrafo são relatados os problemas no casamento e que ela precisava de um tempo para avaliar a situação. “Confesso que estou confusa, porque não imagino ficar sem você”.
Ata notarial
É o registro feito em cartório da nova prova apresentada pela defesa de Hilário Frasson
Na sequência é feito um comentário sobre a medida judicial que Milena obteve para conseguir deixar a sua casa onde vivia com Hilário, com as filhas. “Entrei com uma medida judicial porque na verdade fui incentivada por algumas pessoas e acabei fazendo isso, muito embora não tenha motivo para isso”. (sic)
No terceiro parágrafo há um relato sobre os cuidados de Hilário com as filhas, dizendo que ele sempre cuidava das crianças “em razão da minha profissão e carga horária”. Informa ainda que ela gostaria de ficar com as filhas no caso de uma separação. “Simplesmente porque sou mãe, muito embora, repito, não tenho condições de ficar com elas e nem sei como vou fazer para dar atenção a elas se a gente se separar mesmo”.
Em seguida fala sobre dificuldade para dormir e diz o motivo de ter enviado o e-mail. “Minha consciência pesou diante da minha postura um tanto precipitada”. Em seguida pede para que Hilário “não fique chateado”. “Você é o melhor pai e eu ainda te amo, mas como disse estou confusa”. Informa ainda que uma das filhas não conseguia dormir. “Ela sempre dormiu com você”.
Encerra a mensagem dizendo: “Com certeza a gente vai se entender”. Assina: “Sinceramente. Milena”
DEFESA DE HILÁRIO: “E-MAIL MOSTRA ARREPENDIMENTO DE MÉDICA”
Segundo Leonardo Gagno, o e-mail enviado para Hilário foi escrito meses antes do crime, quando ainda estava em discussão a separação do casal, e sem que ele soubesse da carta escrita por Milena.
“A Milena escreveu a carta e a reconheceu em cartório no dia 5 de abril de 2017. De acordo com o e-mail, também registrado em cartório, Milena afirma que o conteúdo da carta não era verdadeiro. Ela própria escreveu que foi induzida a entrar com uma ação contra o Hilário”, explica Gagno.
Outro ponto, segundo Gagno, diz respeito a produção da carta deixada por Milena. “As advogadas da médica a orientaram a tomar tal atitude, para terem essa prova contra o Hilário, para fazer com que Milena entrasse na justiça contra o marido e obtivesse a guarda das meninas. Mas o e-mail da médica mostra que não era o que ela desejava”.
Leonardo Gagno
Advogado que faz a defesa de Hilário Frasson
"Milena foi influenciada e entrou com a ação contra Hilário. No entanto, como ela mesma admitiu, se arrependeu"
Em denúncia do Ministério Público do Espírito Santo (MPES) é relatado que Hilário era uma pessoa controladora, que chegou a colocar rastreador no carro e no celular da médica, que tentou colocar câmeras na casa e que tinha acesso às redes sociais de Milena.
“O Hilário não tinha acesso ao e-mail dela. Não há nenhuma prova nos autos que possa comprovar tal especulação”, afirma o advogado Leonardo Gagno .
Em relação ao rastreador, Gagno explica ser devido à regra contratual para contratação do seguro do veículo. “Tratava-se de uma exigência da própria seguradora. Sobre as câmeras na residência, o objetivo era o de monitorar o dia a dia das crianças, uma prática tida como normal na sociedade atual. As câmeras não foram implantadas, de modo a evitar especulação sobre o assunto, visto que a separação já estava em andamento”.
E sobre a medida judicial que Milena obteve para ter direito de sair de casa com as crianças, Gagno explica que ela não foi necessária. “Quando Hilário fica ciente sobre essa medida, ele próprio sai de casa”, relata.
ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO: “MANOBRA DO RÉU”
O advogado Renan Sales, que atua como assistente de acusação - representando a família da vítima - no julgamento dos acusados de matarem a médica, assinala não haver dúvidas de que os seis réus são, de fato, os responsáveis pelo feminicídio que vitimou a médica Milena Gottardi. “O processo não mente, sendo a verdade uma só”.
Em relação ao e-mail apresentado pela defesa de Hilário, ele considera se tratar de uma manobra.
Renan Sales
Advogado que reoresenta a família de Milena Gottardi
"A divulgação desse documento, na verdade, é só mais uma manobra do réu Hilário que, ao longo desse processo, se utilizou de vários artifícios para esconder a verdade. Tentou afastar o juiz, depois os jurados. Agora, apresenta uma "cortina de fumaça". Do que tem medo o réu?"
Para ele não há dúvidas das condenações ao final do julgamento. “Estamos certos que ao final, todos, sem exceção, serão condenados, de modo a trazer alento à família, além de fazer justiça ao caso concreto e, ainda, desencorajar práticas covardes e ofensivas à sociedade capixaba, sobretudo às mulheres”, assinala.
MPES: “QUEREM CONFUNDIR OS JURADOS”
O promotor Leonardo Augusto de Andrade Cezar dos Santos, do Ministério Público do Espírito Santo (MPES), um dos três que acompanham o caso, avalia que o objetivo da defesa de Hilário de apresentar este e-mail, a poucos dias do julgamento, tem o objetivo de confundir os jurados. Avalia ser um ato de desespero da defesa.
“É mais uma estratégia da defesa para confundir os jurados e colher a impunidade. As provas que constam nos autos são robustas e não há dúvidas sobre a participação de cada um dos seis réus no crime. Agora surge esse e-mail, datado do 2017, quando já houve a denúncia, Hilário já se defendeu, foi ouvido em juízo, houve recursos e só apareceu agora com esta prova?”, questiona.
Leonardo Augusto de Andrade Cezar dos Santos
Promotor do MPES
"Um dos objetivos da defesa, com esta nova prova, é para criar dúvidas para os jurados. Um ato de desespero diante do medo de enfrentar o júri popular. Com ou sem a carta, a estrada para a condenação é tranquila. Não tem contradição no que o MPES defende. A linha da tese de acusação é reta"
CRIME E JULGAMENTO
O crime aconteceu no dia 14 de setembro de 2017. A médica Milena Gottardi, de 38 anos, foi baleada no estacionamento do Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes (Hucam), em Vitória. Ela tinha acabado de sair do trabalho e estava acompanhada de uma amiga quando foi surpreendida por um homem que simulou um assalto. A morte foi declarada no dia seguinte.
O julgamento será realizado no Fórum Criminal José Mathias de Almeida Netto, no Centro de Vitória, às 9 horas, a partir desta segunda-feira (23). O tribunal do júri será presidido pelo juiz Sanches, que julgará seis pessoas pelo crime.
Este vídeo pode te interessar
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.