O Ministério Público Federal (MPF) solicitou à Justiça Federal em Belo Horizonte (MG) a concessão de tutela de urgência para garantir a adoção de medidas que resguardem a saúde da população de Colatina, no Noroeste do Espírito Santo, com o objetivo de evitar consumo de água fora dos padrões de potabilidade. A cidade está localizada na Bacia do Rio Doce, que teve as águas contaminadas por rejeitos após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em novembro de 2015.
Na manifestação enviada à Justiça no dia 5 de julho, o MPF reiterou os pedidos feitos nas alegações finais do processo. Entre eles, a suspensão da captação de água do Rio Doce para distribuição em Colatina, pois teria se tornado imprópria para o consumo após o rompimento da barragem de Fundão e com a chegada da pluma de rejeitos ao Estado (veja as medidas solicitadas no final do texto).
Concessão de tutela de urgência é uma espécie de decisão liminar antecipada para evitar que a ação tramite por muitos anos até a sentença sair definitivamente. Ou seja, funciona para dar celeridade ao processo e garantir que as decisões sejam cumpridas o mais rápido possível.
De acordo com o MPF, o pedido de tutela de urgência foi feita com base em laudos que registraram a presença de metais pesados na água, como mercúrio, arsênio, manganês, chumbo, cádmio, cobre, vanádio e alumínio, em quantidades superiores aos padrões de segurança estabelecidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e pela Portaria 2.914/2011, do Ministério da Saúde.
A petição do Ministério Público destacou trechos da perícia realizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com o Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes), que demonstram a contaminação da água que abastece a cidade de Colatina.
A poluição foi comprovada a partir de elementos associados diretamente ao derramamento de rejeitos, como o aumento expressivo da turbidez da água, a alta concentração de cianeto livre e o volume de chumbo total.
Com base nas amostras colhidas até o ano de 2018, os estudos demonstraram que, embora o nível de alguns parâmetros tenha diminuído com o passar do tempo, a comparação com o período anterior à passagem da pluma apresentou diversos parâmetros aumentados, como alumínio dissolvido, cádmio total, níquel total e turbidez, que não retornaram às condições anteriores.
De acordo com os peritos, os resultados sugerem que parte desses poluentes ficou retida na calha do rio, sendo ressuspendidos em momentos determinados, como no aumento da vazão fluvial.
A manifestação do MPF ressaltou ainda que "a conduta da Samarco não somente poluiu de maneira intensa e perene o Rio Doce, como agravou de forma altamente relevante outros impactos já existentes, perpetuando-os".
Isso porque, segundo o laudo pericial, para tratamento e limpeza da água, a empresa forneceu ao Serviço Colatinense de Saneamento (Sanear) produtos coagulantes e floculantes, em especial, o Tanfloc SG, que acabou por implicar novo risco à saúde humana.
O Tanfloc SG é um coagulante auxiliar utilizado no tratamento de águas em geral e de efluentes industriais. O uso do produto químico teria sido sugerido e fornecido pela Samarco para municípios afetados pelo desastre.
De acordo com o laudo, nas Estações de Tratamento de Água de Colatina, a dosagem utilizada do Tanfloc não cumpriu o previsto na norma ABNT NBR 15.784/2014, “em quadro de incalculável perigo”. Segundo os peritos, o produto pode causar perda de peso e neoplasias, sendo classificado pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer como carcinogênico, tumorigênico e teratogênico.
“Tais malefícios são causados pelos resíduos de formaldeído, usado como uns dos reagentes químicos no processo de fabricação do floculante, sendo normal que o processo de reação química não seja completo, deixando resquícios dos reagentes”, assevera o documento.
Os testes apontaram que todas as dosagens testadas do Tanfloc SG foram maiores do que a dosagem máxima recomendada de 10 mg/l.
A Samarco informou que "presta os devidos esclarecimentos nos autos do processo".
Já o Serviço Colatinense de Saneamento de Colatina (Sanear) disse que "a captação e o tratamento da água são monitorados por equipe técnica que realiza exames mensais sobre a qualidade da água na bacia do Rio Doce, e a situação da água após o tratamento realizado pelo Sanear".
O órgão disse ainda que os resultados são acompanhados pela Vigilância Sanitária e regulados pela ANA (Agência Nacional de Águas). Os dados também são divulgados para os moradores da cidade no Portal da Transparência do município.
"Atualmente, a Samarco não financia nenhum programa para monitorar a saúde da população de Colatina. Até o momento, a prefeitura já teve aprovado o montante de R$ 53.385.308,99 junto ao Comitê Interfederativo (CIF), que aprova os projetos encaminhados pelos municípios. Porém, até agora, esse dinheiro não chegou à prefeitura. Esse recurso, quando chegar, será utilizado em 34 projetos e obras que visam melhorar o tratamento de água e a coleta de esgoto na cidade", completou.
A Fundação Renova, que administra as ações de recuperação do rio, disse que não vai comentar o caso porque a ação está em discussão na Justiça.
A reportagem entrou em contato com a Prefeitura de Colatina sobre o assunto, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
Com informações do g1 ES
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