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O que é plasma convalescente? Entenda a aposta de Trump no combate à Covid-19

O que é plasma convalescente? Entenda a aposta de Trump no combate à Covid-19

Para entender como funciona e quais os riscos desse processo, A Gazeta conversou com especialistas no assunto - que afirmam haver algumas complexabilidades no método, que ainda passa por pesquisas

Publicado em 2 de setembro de 2020 às 16:23

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Data: 15/03/2020 - Coronavírus Freepik - Imagem do vírus coronavírus analisado no laboratório
Cientistas em todo o mundo estudam melhores tratamentos no combate à Covid-19. (Freepik)

Após uma autorização de emergência, os Estados Unidos anunciaram nas últimas semanas o uso de plasma sanguíneo de pacientes recuperados da Covid-19 como tratamento para quem está com a doença. 

Para entender como funciona e quais os riscos desse processo, A Gazeta conversou com especialistas no assunto - que afirmam haver algumas complexabilidades no método, que ainda passa por pesquisas.

Plasma convalescente consiste em um tratamento que busca utilizar anticorpos presentes no plasma (paste liquida do sangue) de pacientes recuperados do doença, neste caso, da Covid-19. De acordo com o imunologista Daniel Gomes, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), dentre os componentes da parte líquida há anticorpos que o ser humano produz normalmente. Todos  podem ser isolados no plasma.

"No caso da Covid-19, os pesquisadores têm feito o isolamento de plasmas de pacientes convalescentes, que são os que tiveram Covid-19 e se recuperaram, e injetam esse plasma em pacientes que estão com a doença ativa. Por que eles fazem isso? Porque uma das características que os anticorpos possuem é a capacidade de neutralizar os organismos, como o vírus", explicou. 

TRATAMENTO É INDICADO PARA PACIENTES DE RISCO

Para alguns pesquisadores, o tratamento é indicado para pacientes com maior risco de complicações, com comorbidades como diabetes, hipertensão e obesidade. O médico infectologista Estevão Urbano, que é diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), explicou que os anticorpos utilizados são específicos contra a Covid-19. A transfusão, realizada como uma doação de sangue, deve ser feita ainda na primeira semana em que o paciente que receberá o plasma foi infectado pela Covid-19. 

"O objetivo é inibir a multiplicação do vírus em um momento que organismo ainda não consegue produzir anticorpos, normalmente na primeira semana. Como a grande maioria dos pacientes tem uma evolução favorável natural, para um grupo seleto - com mais chances de evoluir para a forma grave da doença, não seria benéfico o tratamento logo na primeira semana para diminuir a multiplicação do vírus? Essa é a lógica do plasma convalescente. Mas é importante lembrar que esse processo não é razoável quando o paciente já está em estado avançado, quando o indivíduo já produz próprios anticorpos", disse. 

"ESTUDOS SÃO CONTROVERSOS", DIZ MÉDICO

Porém, os especialistas afirmam, ainda, que os estudos - assim como todos destinados à Covid-19, ainda são pouco conclusivos. O médico Estevão Urbano completou que ainda é preciso saber se o tratamento funciona ou não.

"Os estudos estão sendo feitos às pressas, com metodologia inadequada e dificuldade de conclusões definitivas. Recentemente esse tratamento foi liberado de forma mais rápida porque há algumas evidências de que pode ajudar pacientes com disponibilidade de evoluírem para a forma mais grave, mas essas evidências são muito diferentes do que estamos acostumados na medicina, são frágeis. O uso é uma decisão individual, vai de acordo com a opinião do médico, sem ser obrigatório, mas com um respaldo para ser aplicado", disse.

Ele completou que futuramente, após novos estudos publicados, será possível concluir com dados definidos se realmente o tratamento pode ajudar. O médico infectologista Crispim Cerutti concorda com a afirmação. Para ele, o tratamento é um adjunto terapêutico e sua eficácia precisa ser observada nos próximos dias.

"Os resultados dos estudos ainda são bem controversos. Em algumas pesquisas o plasma ajudou pacientes, em outras isso não foi tão evidente. Existe uma crítica muito forte de vários pesquisadores que acreditam que houve a liberação desse produto sem que as evidências disponíveis fossem suficientes para dar o respaldo necessário. É algo que precisamos aguardar os desdobramentos, pois muitos produtos são liberados para uso e continuam sendo estudados", explicou.  

Data: 12/03/2020 - Profissional em laboratório realiza teste de coronavírus. Freepik
Os resultados dos estudos ainda são bem controversos, segundo especialistas. (Freepik)

ANTICORPOS NÃO TRATAM TODOS OS EFEITOS DA COVID-19

O imunologista Daniel Gomes completou que o tratamento é conhecido como imunoterapia e apenas o uso dos anticorpos não seria eficaz para tratar os outros efeitos doença. Para isso, seria necessário usar em conjunto com os tratamentos convencionais, que incluem os remédios corticoides e anti-inflamatórios.

"Esse tratamento não é novidade. Ele já foi usado na primeira pandemia mundial, a Gripe Espanhola. Há dois grandes grupos no mundo estudando esse tipo tratamento. O menos recente é um estudo chinês, mas na ocasião não conseguiram chegar em uma conclusão. A mais recente é de um grupo americano, com dados mais robustos, ostentando mais sucesso nesse tratamento", disse. 

Já o médico infectologista Estevão Urbano, afirmou que o que mais tem matado pacientes de Covid-19 são, justamente, os problemas inflamatórios que a doença acarreta. "Esses problemas respiratórios muitas vezes estão isentos de vírus. Para tratá-los,  os corticoides e anti-inflamatórios são os indicados", explicou.

TRANSFUSÃO É COMPLEXA E EXIGE CUIDADOS 

Embora os Estados Unidos estejam animados com o tratamento, o imunologista Daniel Gomes salientou que a transfusão é complexa e exige cuidados específicos para que possa funcionar sem acarretar outros riscos. Uma das preocupações, por exemplo, é a garantia de que o paciente convalescente não tenha nenhuma infecção que possa contaminar o paciente que receberá a transfusão de plasma.

"Esse plasma transferido precisa ser muito bem avaliado para não conter outros organismos. Podem ser transferidos no plasma o vírus do HIV, Zika, Chikungunya e Dengue, por exemplo. Então antes de ser transferido, precisa ser certificado que o paciente não tenha nenhuma dessas doenças. Não é uma terapia muito simples, é um pouco mais complexa e antes de ser adotada como medida de tratamento necessita de uma série de notificações", disse. 

Outra preocupação é com o tempo de infecção do paciente convalescente para fazer o processo de isolar o plasma e injetar no paciente contaminado. Isso porque nem todo anticorpo que o ser humano produz tem capacidade proteger. No caso da Covid-19, Gomes explica que os neutralizantes protetores diminuem após cerca de três meses de infecção pelo novo coronavírus. Ou seja, a retirada de anticorpo deve ser realizada dentro desse tempo para que o tratamento possa funcionar.

"Essa é mais uma ferramente que a ciência tem buscado. Mas o conjunto de todo do cenário ainda não apontou um tratamento especifico ou vacina aprovada. Então é necessário mantermos as medidas de distanciamento social, uso de máscara e higiene", afirmou. 

TRATAMENTO SERÁ TESTADO NO ES

No último sábado (29) A Gazeta divulgou que uma pesquisa liderada pelo Centro de Hemoterapia e Hematologia do Espírito Santo (Hemoes) vai utilizar plasma no tratamento de pacientes internados com Covid-19. As transfusões poderão começar nesta semana, segundo Rachel Lacourt, diretora-técnica da instituição.

Até agora, 20 pessoas curadas já doaram o plasma, que é coletado por um equipamento específico. O doador também deve atender a todos os requisitos da doação de sangue, como peso, idade e demais critérios de saúde.

Hemoes já teme que comece a faltar bolsas de sangue para atender a demanda de hospitais do Estado
Tratamento com plasma será testado em pacientes com Covid-19 no ES. (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Já nos Estados Unidos, o presidente Donald Trump anunciou no último dia 23 de agosto que a Food and Drug Administration (FDA) - agência reguladora de alimentos e medicamentos, na sigla em inglês, autorizou em caráter emergencial o uso de plasma convalescente no tratamento de pacientes diagnosticados com Covid-19.

Na ocasião. Trump afirmou que o tratamento teve uma "taxa incrível de sucesso" e o classificou como "seguro". Ele ainda afirmou que a autorização foi baseada na ciência e em uma determinação independente da FDA.

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