O cenário é de terra de chão. À noite, se torna ainda mais complicado de se chegar. Morro e buracos na estrada apontam que poucas pessoas devem se arriscar a passar por ali. Do Centro de Fundão até a casa dele, gasta-se mais de uma hora. E é no meio da mata, sem nenhuma visão para qualquer vestígio de cidade, que se encontra o padre Dom Columba.
“Fui procurando alguns lugares, para o lado de Santa Teresa, outros lugares mais altos, que tivessem essa parte mais solitária, e fui achar aqui na localidade da Serra do Cavalo, justamente na divisa dos municípios de Aracruz, Fundão e Ibiraçu. Estou muito bem aqui. Gosto muito daqui. Muita mata, né?”, explica ele.
Dom Columba de Gethesemani (nome de padre) nasceu em Minas Gerais e se formou na região da Andaluzia, na Espanha, sob um grupo católico tradicionalista, que difunde, entre outras crenças, a missa antiga, em que, por exemplo, o padre fica de costas pros fiéis e de frente para a figura de Jesus no altar, ao contrário do que é pregado pela Igreja Católica atual.
“A missa não é para o povo. O povo participa. A missa é para Deus. O padre e o povo devem estar de frente pra Deus!”, defende.
Não é um padre comum, digamos. Ele veste batina preta e explica que é uma forma de protesto, uma maneira de expressar a fé. “A batina é a farda do padre. Eu sou um dos poucos padres que seguem independentes, de não estarem canonicamente regularizados com a Igreja Católica oficial atual, por acreditarem em outra forma de religião católica”, conta.
A casa do padre é bem simples. Há um grande quintal, onde ele cuida de centenas de cachorros. Não há televisão, mas, em compensação, tem uma biblioteca com mais de 40 mil livros e dos mais variados estilos, inclusive, best-sellers como “Harry Potter” e “Crepúsculo”. E para surpresa de muita gente, em alguns pontos pega internet.
Sereno na forma de falar, Dom Columba vai contando como é a rotina do lugar. Diz que tudo é bem tranquilo e que acorda bem cedo. Uma rotina de quem vive no campo, ele exemplifica.
“Queremos desfrutar das coisas da natureza, ouvir coisas aqui que éramos incapazes de ouvir na cidade. Então, é uma vida de alimentação frugal (que se alimenta de frutos). Comemos tomate no café da manhã, sopa de inhame no jantar, não comemos carne, e tomamos conta da área, preservando a floresta, vigiando contra os caçadores de animais, todas essas circunstâncias que aqui a área nos requer”, relata.
SONHO DE MOSTEIRO
Dom Columba vive no lugar há mais de 18 anos, onde ele decidiu montar uma igreja também. A área adquirida por meio de doações de fiéis e algumas boas economias é grande: são 150 alqueires de terra. Ainda mais complicado de chegar do que na casa do padre, o local onde a igreja está sendo construída é um cenário à parte. É uma obra grandiosa que lembra cenário de filme.
“Será no mesmo lugar que ergui minha primeira capela. Tem paz e isso faz com que ajude as pessoas a se encontrarem, a resolver suas questões existenciais; a religião serve para isso”, reflete ao ver o sonho se tornando realidade aos poucos.
A obra já começou há alguns anos, mas como ele depende de doações para construir, a igreja é erguida aos poucos. Inclusive, o religioso coloca a mão na massa quando precisa, apesar de ter pedreiros específicos para a construção. Esta, aliás, tem uma importância não só para Fundão, mas para toda a América Latina, porque é lá que funcionará o primeiro mosteiro da Igreja Católica Ortodoxa Russa latino.
A ideia é abrir os espaços para outros padres russos e a igreja para os fiéis capixabas. “Todos os cristãos católicos que quiserem vir assistir à missa, podem vir. Eu já comprei dois ônibus que cabem umas 40 pessoas para que essas pessoas possam vir aqui. Vai ter missa diária e, quem vier, pode vir tranquilamente que todos serão muito bem recebidos aqui”, afirma.
OUTROS MORADORES
Dom Columba mora sozinho, mas a comunidade em que vive possui outras casas, ocupadas por 12 pessoas que, assim como ele, resolveram se retirar, se isolar do mundo da cidade e que acreditam na fé como forma de expressão. Mas todas são pessoas leigas, o único religioso da comunidade é Dom Columba.
Brígida Solé, por exemplo, era dona de uma pizzaria em Manguinhos, conheceu a história do padre, largou tudo e resolveu se retirar há nove anos em prol da vida espiritual. Atualmente, ela se dedica à pintura iconográfica, que é a pintura que retrata símbolos religiosos.
“A iconografia traz esse retiro, te leva para outros valores, para outros momentos que é a ausência do cotidiano comum. É uma pausa do mundo para a paz e para o encontro comigo mesma, com minha essência”, justifica ela. l
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