Com o fim da necessidade de rodízio entre estudantes nas escolas da rede pública estadual no Espírito Santo, crianças e adolescentes voltam a ter uma rotina totalmente presencial nas unidades de ensino. Após um longo tempo em casa, com dinâmicas flexíveis e atividades virtuais, esse retorno, no entanto, pode ser diferente para cada um deles, gerando quadros de ansiedade, fobia social e medo. Especialistas ouvidas por A Gazeta dão dicas de como preparar a readaptação à nova realidade.
Na avaliação da professora titular no Programa de Pós Graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), Marili Moreira da Silva Vieira, é importante, primeiramente, ouvir os filhos e ter transparência ao lidar com o tema do retorno às aulas. Neste momento, é necessário que se faça uma reeducação, ressaltando a importância e a necessidade da escola.
"A escola é o trabalho da criança. Os pais estão voltados para o trabalho, e as crianças voltadas para a escola. Cada um na sua tarefa, retomando as tarefas que tínhamos antes da quarentena. É necessário reeducar, tomar consciência e explicar para que serve a escola. 'Você está indo para estudar, para ouvir o professor, rever seus amigos, socializar com eles'", evidencia.
A neuropsicopedagoga, psicopedagoga, terapeuta de família e escritora Penha Peterli ressalta a importância do diálogo com os filhos e a autoridade dos pais, respeitando os sentimentos das crianças e adolescentes. "Tem de dialogar com bondade a necessidade deles se readaptarem às aulas presenciais, porque, a partir de agora, com todos os cuidados, cumprindo os protocolos, será obrigatório."
Para Marili, este é o momento de analisar o que deve ser rompido e o que deve continuar no pós-quarentena. A possibilidade de estar mais perto dos filhos na execução das atividades escolares é um dos elementos que, na avaliação dela, precisa permanecer.
"A quarentena, para todos nós, adultos e crianças, gerou a possibilidade de criação de novos hábitos, como as crianças sentarem para fazer a lição com os pais olhando, por perto. Esse é um ganho que as famílias têm que tentar não perder. É uma ênfase neste fato de que agora a criança pode estudar nos dois lugares, em casa e na escola. "
Neste momento de retomada, a principal dica das especialistas é ouvir as crianças e adolescentes, para entender de fato o que eles estão sentindo a respeito da volta às atividades presenciais, às rotinas e do contato com o público.
"Às vezes, podemos pensar que eles estão com medo de voltar, e não, estão loucos da vida para voltar; ou pensar que eles estão animados para voltar, e ignorar algum medo que estejam manifestando. É importante ouvir, permitir que eles falem", explica Marili.
Já Penha evidencia que, na neurociência, os seres são capazes de reescrever a vida. "Nessa rotina diferente, eles vão se adaptar, vão se conectar com as novas coisas que vão surgindo. O cérebro tem a capacidade de se adaptar, de se modificar ao longo da experiência de vida. Então, à medida que o estudante vai retomando a ida à escola, o cérebro vai construindo a capacidade de conviver e viver bem no ambiente."
Marili ressalta que, tanto com as crianças quanto com os adolescentes, é importante ouvir. No caso dos mais novos, falar é a forma de extravasar, de "botar para fora", e o pai ou mãe conseguirem ouvir e orientar. Já em relação aos mais velhos, é importante falar porque eles já têm a capacidade de autorreflexão. "O diálogo é o que resolve todos os nossos problemas, com os filhos crianças ou adolescentes", frisa.
Ainda em relação aos adolescentes, a professora frisa que é uma situação mais complexa, mas que ainda assim é fundamental deixá-los falar e questioná-los sobre o motivo de não estarem querendo voltar. A decisão pelo não retorno, no entanto, implica em questões legais para os pais.
"Uma coisa é não querer voltar, outra é não cumprir uma determinação. Se não voltar há outros problemas, de justificar perante a lei por não estar levando o filho à escola", adverte.
A neuropsicopedagoga cita que se a criança ou adolescente já tiverem entrado em uma situação de transtorno, os pais devem buscar ajuda de profissionais médicos, para fazer o diagnóstico e entrar com o tratamento adequado. "A autoridade é importante, mas com respeito ao que o estudante estiver passando", observa.
Manter o contato com a escola e saber quais práticas estão sendo tomadas também são importantes, segundo Marili.
Nos primeiros dias, os professores também devem realizar esse papel de escuta e orientação, questionando o que os adolescentes estão sentindo, quais são os medos, para que todos vejam que isso é normal entre os demais colegas e não algo individual.
Já Penha cita que, de início, é recomendado que os professores ofereçam atividades mais prazerosas, de acordo com a vivência e interesse da faixa etária. "A criança vai aprendendo e aumentando a sua capacidade cerebral, para não se sentir estressada com tanto conteúdo."
Para Marili, ao perceber um aluno com muita dificuldade, a escola deve entrar em contato com as famílias. "Se um aluno está com ansiedade, medo ou depressão, ele precisa ser trabalhado de forma diferente. Nós somos educadores, não militares. Ele precisa voltar mais devagar, um dia sim, um não, e ir retornando aos poucos – o que precisa ser acordado com a família. Tanto pais quanto professores precisam olhar. Crianças e adolescentes são indivíduos e talvez tiveram medos e ansiedades até maiores que os nossos", finaliza a professora.
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