Alvo de críticas, seja pelas greves anuais ou pelo serviço insatisfatório, os Correios integram atualmente a lista de privatizações do governo federal. A expectativa da equipe econômica é que a abertura de mercado gere mais concorrência e atraia investimentos, além de gerar caixa em um momento de aperto fiscal. Segundo o ministro das Comunicações, Fabio Faria, cinco grupos estão interessados na compra do serviço postal, entre eles Magazine Luiza e os estrangeiros Amazon, DHL e Fedex.
A estatal está inscrita no programa de desestatização do governo federal, mas, para sua venda, será preciso modificar a Constituição para permitir que a entrega de correspondências seja feita por uma empresa privada. Hoje, é competência exclusiva da União.
Atualmente, outras empresas privadas, inclusive estrangeiras, já competem com os Correios no serviço de frete. O monopólio da empresa pública está na entrega de correspondências, ou seja, de cartas e cartões postais. Mesmo que seja um serviço em declínio, ele chega a todos os brasileiros, por mais distantes ou isolados.
Para especialistas, a saída do poder público dos Correios trará benefícios, como o aumento da concorrência e a modernização de uma serviço tão essencial para a população e que não tem recebido investimentos. Eles citam que há espaço para aprimorar a logística, o tempo de entrega e a digitalização dos serviços. Porém, é incerto se a simples entrada de um ator privado será o suficiente para manter os preços baixos para os consumidores.
"Os Correios têm uma espécie de monopólio nacional, porque ocupam grande parte do espaço logístico de entregas no Brasil. Com a privatização, vai abrir portas para mais empresas ocuparem esse espaço. A instituição vai perder aquela falta de flexibilidade de uma empresa pública. Sai a influência política e entra a empresa privada para disputar o mercado", avalia o professor e Marketing e Vendas da Fucape Emerson Mainardes.
O mestre em Logística e professor do Ifes Bernardo Carvalhaes aponta que, embora os Correios façam um bom trabalho, a prestação de serviço está aquém do que é oferecido em outros países. Em alguns casos, não por conta do serviço da empresa em si, mas por conta de outros fatores que acabam atrasando a chega das encomendas. Um exemplo é a compra feita em sites do exterior que depende de outros serviços públicos para acontecer.
Quando alguém faz uma compra de outro país, a encomenda demora cerca de dez dias para chegar a um posto da Alfândega no Brasil que, após cobrar uma taxa de R$ 15 pelo manuseio do objeto, o envia para uma central de distribuição no Brasil. A partir daí, ela pode demorar até 45 dias para chegar ao destino final, mesmo que ele não fique do outro lado do país.
"O objeto chega da China em dez dias e demora 45 para ir do Rio de Janeiro até Vitória. Isso é fora de qualquer razoabilidade. Ainda mais que paguei taxa só para despacho. Dá para modernizar, para tentar aumentar a eficiência e a confiabilidade do serviço de entregas. Em comparação com outros países, há uma diferença considerável", afirma.
Uma das preocupações quando à privatização dos Correios é que cidades menores, mais distantes e com acesso mais difícil acabem ficando sem o serviço, já que entregar essas correspondências pode não ser rentável para empresas privadas.
O ministro das Comunicações, Fabio Faria, já afirmou que a empresa que adquirir o ativo terá que fazer com que o serviço chegue a todos os locais, principalmente o serviço de correspondência (cartas), que é feito hoje exclusivamente pelos Correios.
"Quem comprar vai ter de continuar entregando [correspondências] em Tabatinga (AM), Macapá (AP), Santarém (PA) e Caixas do Sul (RS)", disse Faria em uma live realizada pelo site de investimentos Traders Club.
O especialista em logística Bernardo Carvalhaes afirma que, ainda que a empresa pública tenha tido lucro nos últimos anos R$ 640 milhões de Ebitda [lucro antes de juros, impostos, amortizações e depreciações] em 2019 , o setor de correspondências é deficitário, justamente por conta do tamanho do país e da dificuldade de chegar a todas as localidades.
Ele concorda que é preciso que o governo inclua essa exigência no processo de privatização, já que garantir o serviço postal é uma obrigação da União.
Carvalhaes alerta, contudo, que garantir que correspondências cheguem aos quatro cantos do país pode encarecer o serviço para todo mundo. "O governo pode impor que áreas que não são viáveis sejam atendidas mesmo que não sejam rentáveis, e a empresa embute o 'custo afundado' com esses locais e dilui na tarifa que todo mundo paga", diz.
Já Mainardes acredita que, mesmo que a empresa que adquira os Correios opte por não atuar nos locais mais afastados dos centros urbanos, há oportunidades para que empresas locais entrem nesse nicho. "A demanda existe, então quem aproveitar vai acabar se beneficiando. Se a própria empresa que comprar deixar espaço em algumas regiões é bem provável que os empreendedores locais vejam nisso uma oportunidade. Abre-se espaço para esse tipo de empreendedorismo", avalia.
Para ele, a concorrência com outras empresas será suficiente para provocar uma disputa de preços que favorecerá os consumidores. "Onde há competitividade há concorrência, os preços são menores e as empresas acabam mais eficientes", diz.
O especialista em logística acredita que é preciso que órgãos reguladores ajam para garantir que os preços fiquem em um patamar acessível para a população.
"Há um benefício potencial se houver essa abertura para a concorrência, desde que seja garantido o serviço a preços viáveis, razoáveis para a população", ressalta.
Em artigo publicado em A Gazeta, o juiz do Trabalho Cassio Moro argumentou que se os Correios dominam o mercado de encomendas, mesmo competindo com outras empresas, é porque oferece preços menores.
"O intento das pretensas compradoras é adquirir o sofisticado sistema de logística a preço infinitamente inferior que começar do zero. Não é um mercado de livre concorrência, sempre será um monopólio ou, na melhor das hipóteses, um oligopólio de muito poucos", escreveu.
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