A proposta de criar um imposto sobre transações financeiras dentro da reforma tributária não é unanimidade no governo federal, porém tem sido vista pela equipe econômica como a única alternativa para desonerar a folha de salários e impedir o avanço do desemprego durante a crise.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, quer incluir o tributo, semelhante à Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), extinta em 2007, na segunda fase de reformulações que ainda será enviada ao Congresso.
O tema foi discutido neste sábado na palestra "Os impactos da reforma tributária no ES e no Brasil pós-pandemia", promovido pelo Instituto Brasileiro de Executivo de Finanças (Ibef) do Estado. A mediação do debate foi feita pela ex-secretária do Tesouro Nacional e economista-chefe do Santander, Ana Paula Vescovi, que também foi secretária da Fazenda do Espírito Santo.
Uma das convidadas, a assessora especial do Ministério da Economia, Vanessa Canado, disse que o novo modelo de tributação não é algo que atrai a simpatia do Planalto, porém as vantagens do sistema, neste momento, seriam maiores que seus impactos negativos. Um dos benefícios é o combate à informalidade, na visão dela.
As pessoas que estão dispostas a trabalhar informalmente são menos qualificadas, consequentemente produzem menos, ou produzem mal. E o mesmo ocorre com as firmas, que têm dificuldade de concessão de crédito por atuarem também na informalidade. Tudo isso é muito ruim para a economia.
A fim de aumentar a arrecadação, o governo federal estuda ressuscitar o modelo, com alíquota a partir de 0,2%, cobrada em cada operação financeira. O novo imposto é defendido como a única forma de bancar a desoneração da folha de pagamentos para todos os setores produtivos.
A CPMF foi um tributo que incidiu sobre as movimentações bancárias, exceto nas negociações de ações na Bolsa, saques de aposentadorias, seguro-desemprego, salários e transferências entre contas-correntes de mesma titularidade. A alíquota cobrada variou de 0,2% a 0,38% ao longo dos anos.
Não é uma tributação que agrada integralmente ao ministro, ao Ministério da Economia, muito menos ao Congresso, e talvez a sociedade, destacou. Canado complementou que mais detalhes sobre a tributação devem ser esclarecidos quando a proposta estiver próxima de ser encaminhada ao Congresso, mas observou que a polêmica envolvendo o tributo tem tirado o foco de seu propósito.
Hoje, a desoneração é uma opção oferecida a empresas de 17 setores, como comunicação, tecnologia, entre outros. Porém, há um prazo de validade que se encerra em dezembro deste ano. O presidente Jair Bolsonaro vetou a possibilidade de extensão do benefício para esses segmentos até o final de 2021.
Caso o veto não seja derrubado pelo Congresso, os encargos trabalhistas pagos pelas empresas, que hoje empregam cerca de 85 mil trabalhadores no Espírito Santo, aumentarão, levando a uma retração na geração de novos empregos ou mesmo a demissões.
A desoneração apenas para alguns segmentos da economia foi criticada pelo economista e diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCIF), Bernard Appy, que participou também dos debates. Idealizador da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45 - reforma tributária da Câmara que unifica os impostos federais e estaduais - ele fez uma ressalva sobre a decisão do governo de vetar a ampliação de redução dos encargos da folha. A desoneração setorial é muito ruim, mas acabar com a possibilidade em meio à crise é ainda pior.
Discutida há anos, a reforma tributária ganhou novos apoiadores recentemente, na medida em que a pandemia do novo coronavírus aprofunda a dívida pública. Diante desse cenário, o governo federal apresentou, no mês passado, a primeira etapa de sua reforma ao Congresso. A proposta, entretanto, não é a única. Pelo menos mais dois projetos, um da Câmara dos Deputados e outro do Senado, estão sendo analisados.
Apesar de divergirem sobre qual a proposta mais adequada no momento, em debate sobre os impactos da reforma tributária na economia do Brasil e do Espírito Santo, realizado na manhã deste sábado, membros do governo, parlamentares, e especialistas concordaram que a reforma administrativa poderia tornar ainda mais branda a tributação proposta pela reforma tributária, já que os gastos com a máquina pública seriam reduzidos. Apesar disso, foram categóricos em afirmar que uma mudança não pode esperar pela outra.
Já não há tanto espaço para incrementar a arrecadação. Para reduzir a tributação do consumo, a gente precisa reduzir o tamanho do Estado. Se a gente depender do amadurecimento da discussão da reforma administrativa, que eu acho legítima e muito importante, para redesenhar o sistema tributário, a gente corre o risco de ficar patinando por mais alguns anos, observou a assessora especial do Ministério da Economia, Vanessa Caiado.
Ela destacou, entretanto, que há ganhos em uma discussão preliminar da reforma tributária, uma vez que aumentar a alíquota de contribuição para determinados setores tende a elevar a pressão para que o governo reduza seus gastos.
Bernard Appy frisou que as duas reformas são complementares e que, sem uma, parte dos efeitos da outra são anulados. Não adianta fazer a reforma tributária, que aumenta a arrecadação do governo, e isso virar gasto automaticamente porque a gente não fez a reforma administrativa, declarou.
O economista destacou ainda que a reforma pode ser a diferença entre a solvência e a insolvência do setor público, num momento em que a dívida da União já se aproxima de 100% do Produto Interno Bruto (PIB).
O economista e ex-deputado Luiz Carlos Hauly, autor do projeto de reforma tributária do Senado (PEC 110), destacou que é tempo de fazer uma reforma completa, que permita ao país crescer novamente.
Há 40 anos o país vem definhando. E não há solução econômica para o Brasil se não for um novo sistema tributário, amplo, completo. Cada dia que passa é um prejuízo. A reforma está pronta. Pega a PEC 45 e a 110 e faz um check-list. A partir daí, a decisão é política. Quer alíquota única ou cinco? Quer um fisco único ou dois fiscos? Nós já passamos por tudo isso. É bom que o governo faça o que o Congresso está fazendo, uma reforma completa.
A primeira etapa da proposta do governo prevê a unificação de PIS e Cofins, que podem ser substituídos pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Alíquota: de 12% e terá como base de cálculo a receita bruta das empresas. Para as próximas etapas, o governo estuda mudanças no Imposto de Renda (IR) e no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), e também a criação de um imposto sobre movimentações financeiras, nos moldes da extinta Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Este novo tributo será usado para financiar a desoneração da folha de pagamento. Período de transição: cerca de seis meses.
A proposta trabalha com a extinção de nove tributos, o IPI, IOF, PIS, Pasep, Cofins, CIDE-Combustíveis, Salário-Educação, ICMS, ISS; que seriam substituídos por um Imposto sobre bens e serviços (IBS), nos moldes dos impostos sobre valor agregado cobrados na maioria dos países desenvolvidos. Alíquota: pode diferir, dependendo do bem ou serviço, mas haveria uma alíquota padrão, aplicada de maneira uniforme em todo o território nacional, a ser definida por lei complementar. Benefícios fiscais: autoriza a concessão de benefícios fiscais, por lei complementar, nas operações com alimentos; medicamentos; transporte público; saneamento básico; e educação. Período de transição: duraria, em média, seis anos.
Prevê a unificação de IPI, PIS, Cofins, ICMS, ISS, que seriam substituídos por um Imposto sobre bens e serviços (IBS). Alíquota: todos os bens e serviços destinados a determinado Município/Estado são taxados por uma mesma alíquota, mas a tributação não é uniforme em todo território nacional, pois cada município/Estado pode fixar sua alíquota. Benefícios fiscais: não permite a concessão de benefício fiscal. Período de transição: duraria, em média, dez anos.
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