O Fundo Previdenciário, onde estão investidos os recursos de aposentadoria dos servidores estaduais que ingressaram no serviço público depois de 2004, está há dois anos rendendo menos do que o esperado. A previsão é de que esses recursos, aplicados pelo Instituto de Previdência dos Servidores do Espírito Santo (IPAJM), tenham a inflação (medida pelo IPCA) mais 5% em rentabilidade anual. Em 2021, o rendimento, contudo, foi de 1,55%, bem menor que os 15,4% previstos. Ano passado, o rendimento foi de 5,52%, cerca de metade do objetivo em pontos percentuais. Em ambos os anos, o fundo rendeu menos que a poupança.
O Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCES) já emitiu um alerta. No parecer técnico da prestação de contas do governador Renato Casagrande, o órgão afirmou que, caso o cenário atual de baixa rentabilidade seja mantido, o Fundo Previdenciário pode se tornar deficitário.
Isso porque é previsto para os próximos anos (a partir de 2030) um aumento no número de aposentados que estão nesse fundo. Ou seja, em breve vai ter mais dinheiro saindo do fundo em pagamento de aposentadoria em relação ao que entra sob forma de cotização dos servidores.
O TCES diz que a baixa rentabilidade detectada é causada pelo risco assumido na Política Anual de Investimentos (PAI/2022). Embora esteja dentro dos limites legais, a política permite aplicação em ativos de risco, como fundos de ações e BDRs, que são investimentos em bolsas de valores internacionais.
Além disso, segundo especialistas ouvidos por A Gazeta, os dois anos anteriores não foram favoráveis para os ativos de renda fixa em que o fundo mais investe, que é o NTN-B, também conhecido como Tesouro IPCA.
Segundo o relatório consolidado de 2022 do IPAJM, 81% dos mais de R$ 6 bilhões do fundo estão investidos em renda fixa, e o restante, pouco menos de 20%, está em renda variável. Considerando só a renda fixa, o fundo teve rentabilidade de 10,48% ao ano, bem próximo dos 11% esperados.
Contudo, os investimentos em renda variável tiveram trajetória oposta. Aqueles feitos em fundo de ações caíram 2,85% no ano e os investimentos no exterior tiveram retração de 28%. Os fundos multimercado e imobiliário avançaram pouco mais de 1% no período.
"Quando você compra ações, não tem como dizer ao mercado o que elas vão fazer. É uma questão de perfil do fundo, de questionar se deve ou não ter ativos em renda variável. Quando se trata de alocação ao longo prazo, o ideal é que seja tática, técnica e bastante linear em termos de classe de ativos", afirma o especialista em mercado financeiro Lelio Monteiro.
Ele explica ainda que, no caso dos investimentos em Tesouro IPCA, é normal que esses ativos tenham anos melhores e anos piores. No longo prazo, porém, mesmo com as oscilações, é esperado que o ativo entregue o que promete. "Não acho que há erro (nas alocações). São títulos que, se você olha com visão de curto prazo, pode dar esse tipo de marcação negativa, dando a impressão de que o fundo está rendendo pouco. Ao longo do tempo, ele deve se recuperar", avalia o especialista.
O auditor do Núcleo de Previdência do TCES Diego Torres esclarece que o fundo precisa do rendimento das aplicações financeiras para ser sustentável e poder pagar os benefícios no futuro.
"Caso ocorra retorno muito abaixo do esperado para esse fundo, a consequência mais possível no médio e longo prazo seria a necessidade de aumentar as contribuições para esse fundo. O Estado teria que aumentar a sua contribuição para cobrir essa diferença", aponta.
Atualmente, o Fundo Previdenciário é considerado saudável porque é superavitário, ou seja, há mais dinheiro entrando do que saindo dele. Também opera em regime de capitalização, em que cada servidor contribui para a própria aposentadoria. Já no Fundo Financeiro – deficitário –, os servidores ativos pagam a aposentadoria dos servidores que já estão inativos. Como há muitos aposentados, todo ano o governo estadual precisa fazer aportes milionários no Fundo Financeiro para tapar o rombo.
É para evitar que o Fundo Previdenciário tenha o mesmo destino, que o TCES tem chamado a atenção para a baixa rentabilidade dos investimentos. "Por isso que precisa ter recurso e formar recursos agora, enquanto os servidores estão contribuindo. Porque vai chegar o momento em que a maioria estará recebendo", explica o auditor.
Gestor da previdência dos servidores, o Instituto de Previdência dos Servidores do Espírito Santo (IPAJM), anualmente, emite um documento onde detalha qual será a política de investimento para aquele período.
No texto, na parte sobre governança, o IPAJM admite que a equipe de investimento, formada exclusivamente por servidores efetivos, é exígua (pequena), mas aponta que está capacitada para operar no mercado financeiro. Diz ainda que Conselho Administrativo do IPAJM atua como órgão deliberativo e tem representatividade de diversos poderes, além de servidores ativos e inativos.
Em nota enviada para A Gazeta, o órgão estadual diz que a avaliação do Tribunal de Contas deve ter se baseado "no período abrangido pela pandemia da Covid-19, em que os investidores em todo o mundo sofreram com um mercado muito volátil e desafiador". Ainda de acordo com o IPAJM, em 2023, até o momento, a meta foi superada em quase dois pontos percentuais.
"Espera-se que, em breve, os resultados ruins do período pandêmico sejam totalmente compensados", diz a nota.
O órgão ressalta ainda que os recursos dos segurados poderão ficar investidos por mais de 30 anos, e que resultados sazonais não afetam significativamente o objetivo futuro. "Historicamente, num horizonte mais longo, tem sido demonstrada a capacidade de atingir e até superar a meta de rentabilidade estabelecida."
O IPAJM informa que a avaliação do TCEES deve ter se baseado no período abrangido pela pandemia da Covid-19, em que os investidores em todo o mundo sofreram com um mercado muito volátil e desafiador. Mas neste ano, por exemplo, a meta já foi superada em quase dois pontos percentuais e espera-se que, em breve, os resultados ruins do período pandêmico sejam totalmente compensados.
O Instituto informa, ainda, que muitos fatores devem ser analisados antes de se afirmar que o Fundo Previdenciário pode se tornar deficitário. O primeiro ponto é o horizonte de investimento. Os recursos oriundos das contribuições dos segurados, que serão utilizados para pagar seus benefícios no futuro, poderão ficar investidos por mais de trinta anos, e resultados sazonais de curto prazo não afetam significativamente o objetivo futuro.
Historicamente, num horizonte mais longo, tem sido demonstrada a capacidade de atingir e até superar a meta de rentabilidade estabelecida. Outro ponto importante é o atual superávit que o Fundo Previdenciário vem mantendo acumulado. Com mais de 6,5 bilhões de reais investidos, é o quarto RPPS com maior volume de recursos capitalizados. Os estudos atuariais, que são atualizados anualmente, demonstram que o fundo capitalizado do regime de previdência estadual é estruturalmente equilibrado em relação ao seu plano de benefícios e às alíquotas de contribuição, e ainda possui um superávit técnico na sua poupança atual capaz de suportar com boa margem de segurança eventuais acidentes ou distorções em relação ao modelo de cálculo.
Além disso, o Espírito Santo é um dos poucos Estados da federação que possui nota A de Capacidade de Pagamento - CAPAG e também está bem classificado no Índice de Situação Previdenciária - ISP. O ES foi um dos primeiros Estados a implementar a Previdência Complementar, em 2014, e manter essa liderança na implementação da reforma da Previdência, em 2019.
O Relatório de Sustentabilidade, publicado anualmente com o balanço atuarial da autarquia previdenciária, demonstra claramente que a previdência do ES é sustentável e ocupa posição privilegiada em relação aos demais Estados. Por fim, o IPAJM destaca que a equipe que cuida da gestão dos investimentos é experiente e capacitada. Todos possuem certificação profissional acima da média e cumprem rigorosamente todos os requisitos da norma, aplicando os recursos da previdência com o máximo zelo, segurança e responsabilidade.
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