Carla da Victória diz que chega a fazer 150 panelas de barro por semana
Carla da Victória diz que chega a fazer 150 panelas de barro por semana. Crédito: Ricardo Medeiros

Paneleira trans faz do barro a arte de vencer o preconceito no ES

Vítima de abusos e perseguição na adolescência e juventude, Carla da Victória, de 46 anos, aprendeu com a mãe a produzir panelas de barro, tradição que vem de família

Tempo de leitura: 3min
Vitória
Publicado em 01/06/2024 às 09h13

Ela aprendeu o ofício aos 9 anos vendo a mãe fazer as tradicionais panelas de barro. Filha, neta e bisneta de paneleiras, Carla da Victória, hoje com 46 anos, chega ao galpão de Goiabeiras logo cedo e já começa a produção das panelas.  Por questões de saúde, entrega seus produtos para outras colegas, que dão os retoques finais, ou seja, fazem o polimento e a queima, antes da venda.

A vida de Carla, que também é conhecida como Cacá, sempre foi de muito trabalho – em meio a preconceitos. Além dela, as irmãs também ganharam a vida como paneleiras. Uma delas, inclusive, continua em um box ao lado de Carla. Como ela mesma diz, praticamente não teve infância, porque sempre trabalhou. A luta também é um marco na vida dela. Foi aos 13 anos que a paneleira se assumiu como uma mulher trans.

Na época, ela não entendia muito bem o que seria isso. Sofreu preconceitos e violência por conta de sua identidade de gênero.

“Não tive muito apoio da minha família. Sofri abuso sexual e até invadiram a minha casa para tentar me matar. Desde o início, contei apenas com o apoio de minha avó, que já faleceu, e dizia que me amaria independentemente de eu ser menino ou menina. Até tomei hormônio por conta própria. Hoje, já sou aceita e minha mãe me valoriza como filha, mas sofri durante muito tempo”, revela.

Os anos se passaram e hoje Carla se identifica como uma pessoa simples e brincalhona. A paneleira conta que ia com a mãe para o local onde são feitas as panelas de barro, famosas no Brasil inteiro, usadas para preparar moqueca capixaba, pirões e muitas outras delícias.

“Saía da escola e ia com a minha mãe para o galpão. Por curiosidade, ficava olhando o que ela fazia e foi assim que aprendi a produzir as panelas. Já são 36 anos trabalhando com isso. O barro chega, faço a panela e no dia seguinte coloco as alças. Chego a fazer 150 peças por semana”, comenta.

Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Victória trabalha com a produção de panelas de barro há 36 anos. Crédito: Ricardo Medeiros

Carla nasceu como menino e, apesar de se assumir como mulher ainda adolescente, só conseguiu trocar o nome social há seis anos. Ela nunca trabalhou com carteira assinada, apenas por conta própria.

“Fui começar a entender isso tudo aos 25 anos. Passei muita coisa na escola e parei de estudar quando estava na 5ª série do ensino fundamental. Hoje, as coisas já estão melhores. Apesar de amar a cultura das paneleiras, faço porque preciso. Já pensei em desistir várias vezes, mas acredito que Deus escreve nossas histórias e dou continuidade até Ele permitir”, conta.

O número de pessoas que trabalham na fabricação de panelas de barro vem caindo ao longo do tempo, como observa Carla. Segundo ela, pessoas mais novas não se interessam pelo ofício, o que pode provocar o encerramento da atividade daqui uns anos.

O sonho de Carla é conseguir comprar a casa própria e trabalhar como influencer. Em suas redes sociais, ela produz vídeos contando sua história, faz apresentação de danças, entre outros conteúdos. 

Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitcória utiliza o barro para moldar as panelas. Crédito: Ricardo Medeiros

O ofício das paneleiras é reconhecido como patrimônio imaterial pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A Associação das Paneleiras de Goiabeiras foi fundada em 1987 e garante a organização do espaço do galpão e divisão das funções na fabricação das panelas, em Goiabeiras Velha, Vitória.

De acordo com o Iphan, o processo de produção conserva todas as características essenciais que identificam as panelas. O produto típico capixaba continua sendo modelado manualmente, com argila sempre da mesma procedência e com o auxílio de ferramentas rudimentares.

Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro

Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panela de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panela de barro. Ricardo Medeiros
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro. Ricardo Medeiros
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro. Ricardo Medeiros
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro. Ricardo Medeiros
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro. Ricardo Medeiros
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro. Ricardo Medeiros
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro
Carla da Vitória, ela é uma mulher trans e faz panelas de barro

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