A economia brasileira vai ter um longo e árduo caminho pela frente para conseguir deixar para trás os impactos brutais que a pandemia do novo coronavírus tem deixado no faturamento e nos investimentos de empresas, na renda dos trabalhadores e na arrecadação dos governos. Uma retomada rápida, como se previa inicialmente, parece cada vez mais difícil, uma vez que a desigualdade social deve ser ampliada.
A Gazeta questionou três economistas sobre o que será necessário fazer desde já para garantir uma recuperação o mais breve possível da economia. Os caminhos apontados não são pautas novas e nem fáceis. O ponto central das propostas é consenso entre a maioria dos especialistas: fazer reformas e melhorar o ambiente de negócios de forma a reduzir as incertezas e dar mais confiança.
Isso se fará ainda mais necessário no pós-pandemia para que as pessoas tenham renda e coragem para consumir, e também para que as empresas decidam investir, criando mais emprego e renda. Hoje tudo isso está travado, como lembra o economista Orlando Caliman:
"Ninguém está comprando: o governo está injetando um volume de recursos enorme na economia, seja através do auxílio emergencial, do saque do Fundo de Garantia (FGTS), ou do crédito. Mas nesse período a gente vê que o volume de recursos em poupança aumentou porque as pessoas não estão gastando justamente pela falta de confiança de que vão manter o emprego ou recuperar a renda".
Pesquisador da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), Marcel Balassiano lembra um fator social preocupante que precisará ser levado em conta nas medidas para recuperação do país: "Praticamente todo mundo vai sair dessa crise mais pobre do que entrou. Mesmo com a ajuda do governo, a queda de renda ainda é muito grande".
Por isso, a economista e professora da Fucape Arilda Teixeira avalia que ter um olhar social é uma obrigação do governo. Para isso, ela defende um profundo corte de gastos na máquina pública para abrir espaço no orçamento.
Os economistas elencaram cinco medidas necessárias para estimular a retomada do crescimento econômico. São propostas já em debate há algum tempo, mas que, segundo eles, ganham mais urgência agora. As aplicações vão além do governo federal e também podem ser feitas ao nível local, no Espírito Santo, como iniciativas para melhorar o ambiente de negócios. Confira:
A crise vai deixar como consequência um cenário de desemprego elevado, queda de renda e aumento da desigualdade, ou seja, as pessoas vão ficar mais pobres. No momento atual, medidas como o auxílio emergencial tem ajudado nesse sentido, mas ele não resolverá o problema nem poderá ser eterno.
"Os gastos temporários não podem se tornar permanentes. Mas talvez seja sim uma boa hora para pensar numa política de renda mínima mais ampliada que no pós-pandemia ainda dê alguma ajuda", disse Marcel Balassiano, pesquisador do Ibre/FGV.
O governo federal já anunciou, por exemplo, que pretende lançar até o final do ano o programa Renda Brasil, com maior abrangência que o Bolsa Família e que terá um auxílio mensal maior que o programa criado no governo Lula (PT).
Para seguir bancando os investimentos sociais e também ajudando empresas, se torna mais urgente uma redução dos gastos públicos e uma política de maior austeridade fiscal. Para além de ver onde cortar no Orçamento, para Orlando Caliman é preciso repensar todo o governo. Ele cita, por exemplo, a necessidade de se avançar com a reforma administrativa:
"Tem que rever o gasto público, qualificá-lo. A reforma administrativa tem que passar para isso, reduzir o astronômico gasto com pessoal e enxugar o Estado", diz.
Caso isso não aconteça, a economista Arilda Teixeira faz um alerta: "A iminência de um calote da dívida é algo possível se não for feito um corte de gastos na máquina pública. Há uma dificuldade, que foi a decisão do Supremo Tribunal Federal que proibiu cortes de salário para servidores. Isso é algo ruim para as contas públicas porque dificulta esse ajuste".
Promover melhorias no ambiente de negócios para atrair investimentos é algo que já está na pauta há algum tempo, mas que agora exige ainda mais celeridade, na avaliação dos economistas, tanto a nível federal como local, para recuperar a confiança do investidor.
No caso da reforma tributária, o economista defende que se vá além da unificação de impostos, mas que também se repense a forma de se arrecadar recursos públicos no Brasil. "Essa tributação regressiva acaba prejudicando os mais pobres", lembra Caliman.
A redução da burocracia como um todo, segundo Marcel Balassiano, é uma agenda que precisará ser retomada com urgência. "Esse debate hoje está paralisado. A gente vai ter que voltar nele para melhorar o ambiente econômico, aumentar a produtividade e assim voltar a ter anúncios de investimentos e de criação de empregos".
Nessa linha, o governo federal estuda, por exemplo, uma nova desoneração da folha de pagamentos das empresas visando a incentivar a abertura de vagas formais. A criação de um imposto único federal também deve ser proposta pela equipe econômica visando à simplificação do sistema.
As obras de infraestrutura deverão são apontadas como potenciais molas propulsoras para a retomada do crescimento no pós-pandemia. A primeira boa sinalização para isso já foi dada com a aprovação do novo marco legal do saneamento básico, setor que deve demandar investimentos da ordem de R$ 9 bilhões só no Espírito Santo nos próximos anos.
Acelerar essas obras é fundamental, tanto a nível federal como estadual. Em ambos os casos, como faltam recursos diante da crise fiscal, os economistas apontam a necessidade de andar com a agenda de privatizações e concessões, trazendo dinheiro privado, sobretudo do exterior, para garantir esses investimentos e gerar empregos.
"É uma agenda em que estamos atrasados até. Precisamos que essas concessões e obras de infraestrutura saiam do papel para a economia funcionar. A mobilização que já está sendo feita nesse sentido é bem-vinda e precisa ganhar celeridade", comenta a economista Arilda Teixeira.
No governo federal, projetos como leilões de rodovias, portos e aeroportos foram mantidos para este ano. A ideia nem é tanto gerar caixa com as concessões, e sim garantir que investimentos aguardados saiam do papel, como é o caso no Espírito Santo da duplicação da BR 262.
Para realizar todas as medidas citadas anteriormente e mesmo assim transmitir um sinal maior de tranquilidade à população e aos investidores, é preciso que os ânimos sejam acalmados em Brasília de forma a reduzir as incertezas políticas.
"Na pandemia tivemos crises políticas relacionadas ao vírus e também outras sem relação com isso. Uma coleção de crises. Como a divergência entre presidente e governadores e as trocas de ministros. Tudo isso eleva a incerteza e a crise política em um momento já de dura crise sanitária e econômica", diz Marcel Balassiano.
Ele conclui: "para que seja possível fazer as reformas, por exemplo, precisamos que haja harmonia entre os Poderes e até da ajuda dos governadores. Toda essa animosidade é um empecilho que acaba prejudicando muito e que precisa ser deixado para trás".
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