O começo do fim da Telexfree aconteceu há dez anos, quando a 2ª Vara Cível da Comarca de Rio Branco (Acre) julgou procedente uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Acre e suspendeu os pagamentos e a adesão de novos contratos à empresa, investigada sob a suspeita de funcionar com esquema de pirâmide financeira.
A decisão envolvendo a companhia que lesou milhares de pessoas no país ocorreu em 18 de junho de 2013, mas a Telexfree não foi o primeiro nem o último escândalo envolvendo esquemas de pirâmides no Brasil.
Confira os casos mais famosos:
Fazendas Reunidas Boi Gordo
Na década de 1990, a empresa oferecia a investidores a opção de lucrar com a engorda de bois, sobretudo no interior de Goiás. O investidor fazia aplicações mensais na compra de arrobas de boi magro, com garantia de engorda de, no mínimo, 42% sobre o peso inicial em 18 meses.
Como em outros esquemas de pirâmide, porém, a empresa remunerava os investidores mais antigos com a entrada de novos clientes, até que o negócio colapsou, em 2001, deixando mais de 30 mil pessoas no prejuízo. O rombo deixado pela Boi Gordo foi estimado em cerca de R$ 4 bilhões.
O único contato localizado foi de atendimento aos credores. A reportagem está aberta ao posicionamento da empresa.
Avestruz Master
Assim como a Boi Gordo, a Avestruz Master também fisgou investidores com a promessa de lucro envolvendo a criação de animais — neste caso, de avestruzes.
O número de animais era inflado pela empresa, que dizia ter vendido 600 mil animais, quando, na realidade, o número era bem menor (38 mil). A Avestruz Master faliu em 2005 e foi condenada a indenizar as vítimas em R$ 100 milhões.
Nenhum contato foi localizado. O canal está aberto para o posicionamento da empresa.
Telexfree
A Ympactus, que fazia a representação da Telexfree no país, começou a atuar em território brasileiro em 2012, oferecendo planos de telefonia pela internet, o chamado VoIP. A empresa dizia lucrar “rios de dinheiro” com o setor e adotou um sistema de venda direta remunerada para divulgar o produto.
Para se tornar um “divulgador”, o interessado precisava pagar uma taxa de adesão de US$ 50, que permitia a compra dos pacotes com desconto para que pudesse revender. A promessa era de que, para lucrar, era necessário estimular os compradores a se tornarem revendedores. Ou seja, era preciso atrair mais compradores/divulgadores, que, sem saber, pagavam pela remuneração dos clientes mais antigos.
Em 2013, o Ministério do Acre solicitou a proibição das atividades da empresa no país, mas, mesmo que houvesse forte indícios de crime, a Telexfree ainda chegou a patrocinar o Botafogo, time de futebol do Rio de Janeiro, e um show do ex-Beatle Paul McCartney no Espírito Santo em 2014.
A empresa foi considerada culpada pela prática de pirâmide financeira, condenada a pagar R$ 3 milhões de indenização por danos morais coletivos e a devolver toda a quantia investida pelos seus antigos divulgadores. Quase um milhão de brasileiros foram prejudicados e, ainda hoje, muitos nunca recuperaram a soma investida. A cifra devida chega a R$ 2 bilhões.
Hoje, a grande maioria dos processos envolvendo os chefes do esquema, Carlos Costa e Carlos Wanzeler, está tudo em fase recursal, conforme esclareceu o advogado Rafael Lima. Assim, embora tenha sido condenados em 1ª Instância, continuam soltos.
Já a Laspro Consultores, administradora judicial do processo de falência da Ympactus Comercial (Telexfree), informou que, atualmente, a ação se encontra em fase de arrecadação e avaliação de ativos da massa falida (Telexfree). Somente encerrada essa etapa, o rateio será feito.
BBom
Condenada em 2017, a BBom “sustentava” seu negócio com um rastreador de veículos, que, segundo a Justiça, era a isca para recrutar novos associados. Os integrantes eram remunerados pela indicação de novos participantes no negócio, sem levar em consideração a quantia gerada pela venda dos produtos.
Assim como no caso da Telexfree, era preciso pagar taxas para fazer parte do negócio, havendo uma de cadastro, no valor de R$ 60, mais uma de adesão, que variava de R$ 600 a R$ 3 mil, de acordo com o plano escolhido. Quanto maior o número de novos integrantes, maior seria a premiação ou bonificação que seria oferecida pela empresa.
Embora a condenação só tenha vindo em 2017, as primeiras sanções, incluindo o bloqueio de bens da empresa, ocorreram em 2013. Atualmente, segundo informações que constam no site da BBom, a empresa trabalha para reestabelecer os direitos dos microfranqueados.
A reportagem tentou contato, via ligação e mensagem, para o único número de contato disponibilizado pela BBom. Não houve retorno.
Atlas Quantum
Com a promessa de rendimentos exorbitantes baseados em um robô de arbitragem — como se denomina a busca por preços de compra mais baratos e de venda mais caros —, a Atlas Quantum despontou como destaque do ramo no primeiro semestre de 2019 e cresceu tanto e tão rapidamente que chegou a veicular peças publicitárias em horário nobre na televisão brasileira.
Em agosto daquele ano, porém, multiplicaram-se relatos de investidores com problemas para realizar saques, o que levou a Comissão de Valores Mobiliários a autuar a empresa e suspender seu serviço, enquadrando-o como uma “oferta irregular de contrato coletivo”.
A empresa, que chegou a vender bitcoins para mais de 200 mil clientes ao redor do mundo, deixou um rombo estimado em R$ 4 bilhões.
A Atlas Quantum foi procurada via e-mail e redes sociais, mas não houve resposta.
'Sheik do Bitcoin'
A Rental Coins, chefiada por Francisley Valdevino da Silva, conhecido como “Sheik do Bitcoin” ou “Sheik das Criptomoedas”, fazia promessas de lucros mensais de até 13,5% sobre o investimento em criptoativos, que são conhecidos pela volatilidade extrema.
O negócio começou a ruir entre 2021 e 2022, quando a empresa passou a enfrentar problemas para honrar os pagamentos aos clientes. Entre os prejudicados estavam famosos, como jogadores de futebol e a modelo Sasha Meneghel, filha da apresentadora Xuxa, e o marido dela, João Figueiredo, que investiram R$ 1,2 milhão nos ativos.
A Atlas Quantum foi procurada por meio das redes sociais, mas não houve resposta.
GAS Consultoria: “Faraó dos bitcoins”
A GAS Consultoria, de Glaidson Acácio dos Santos, oferecia a investidores um rendimento mensal de 10% supostamente a partir de compra e venda de criptomoedas. A estrutura criada por ele e seus colaboradores chegou a atrair mais de 67 mil clientes em 13 Estados do Brasil e em outros sete países.
A suspeita é que o rendimento dos investimentos em criptomoedas não era suficiente para suportar o retorno prometido por Glaidson. O esquema, segundo o Ministério Público Federal (MPF), dependia do depósito de novos clientes para cumprir o acordo com os antigos.
Glaidson, que era ex-garçom e ex-pastor da Igreja Universal e, até poucos anos, vivia em um bairro de periferia de Cabo Frio (RJ), acumulou milhões em contas bancárias em um breve espaço de tempo. Apenas em 2017, mais de R$ 18 milhões teriam passado por uma única conta. As movimentações levaram aos primeiros alertas sobre as atividades da GAS.
Já a movimentação financeira de empresas suspeitas de integrar o esquema alcançou cifras bilionárias, segundo investigação da Polícia Federal. Glaidson foi preso em agosto de 2021, e, da cadeia, meses depois, chegou a divulgar uma carta alegando inocência e lamentando não poder cumprir com seus compromissos. A esposa de Glaidson, a venezuelana Mirelis Zerpa, suspeita de envolvimento no crime, está foragida.
A defesa não foi localizada. O canal está aberto para o posicionamento da empresa.
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