Dos 412 cargos de juízes que existem formalmente na Justiça Estadual (considerando juízes de Direito e substitutos), 108 estão vagos, o que corresponde a 26%. Restam 305 magistrados em atividade no primeiro grau, de acordo com o Portal da Transparência do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES).
Já na Justiça Federal há 50 cargos para juiz no Estado, dos quais 40 encontram-se preenchidos e, portanto, 10 estão vagos. A informação é da Corregedoria Regional da Justiça Federal da 2ª Região.
Enquanto isso, em julho, deve ser implementado o juiz das garantias, aquele que vai atuar na fase de investigação de um processo, autorizando ou não, por exemplo, prisões preventivas, apreensões e quebras de sigilo. Outro magistrado é que terá que expedir a sentença, ou seja, decidir se condena ou absolve o réu.
Serão, então, dois juízes para cuidar de um mesmo caso. O objetivo é fazer com que as decisões sejam imparciais, que o juiz que vai decidir não seja "contaminado" pelas informações da fase de investigação. A medida foi aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), mas tem vários problemas práticos a serem solucionados. Um deles é a falta de juízes.
Diante de críticas e ações ajuizadas por entidades de magistrados, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, decidiu, na quarta-feira (15), ampliar o prazo para a implementação da medida. Pela Lei 13.964/2019, isso deveria ocorrer já no próximo dia 23. Agora serão mais seis meses.
"Isso (o déficit de juízes) já é um complicador para o bom desenvolvimento dos trabalhos pelos juízes capixabas, mesmo sem o juiz das garantias, vez que há muitas varas e comarcas sem titulares, causando imenso prejuízo para a população. Agora que o Poder Judiciário vinha fazendo um estudo para minimizar essa situação, criaram mais um complicador, com necessidade de mais juízes", afirma o presidente da Associação dos Magistrados do Espírito Santo (Amages), Daniel Peçanha.
"Os juízes capixabas, como em todo o país, já estão assoberbados, pois há grande carência de magistrados, e criaram uma nova figura no direito brasileiro. Mas, talvez até pior, seja o reflexo negativo nas ações penais já em trâmite e na persecução penal como um todo. Quando a população clama por mais rigor nas leis penais e mais efetividade da apuração dos crimes, foi criado um complicador na lei", avalia.
Se o juiz das garantias vai ser melhor ou pior para o sistema judicial brasileiro não é uma questão pacífica. De qualquer forma, a lei está em vigor e o Judiciário terá que se adaptar. Em um primeiro momento, o TJES chegou a afirmar que o tempo previsto na lei, de 30 dias (o texto foi sancionado em 24 de dezembro), era insuficiente. Mesmo com a ampliação do prazo para seis meses, porém, especialistas ainda acreditam que o tempo não será suficiente para a implementação da regra.
Com ou sem juiz das garantias, há outros entraves além da falta de magistrados. A maioria dos processos consiste, basicamente, em pilhas de papel. A digitalização está em curso em 99 das 313 unidades da Justiça Estadual no Espírito Santo, mas ainda é pouco.
Em 2019, por exemplo, o TJES, como de praxe, eliminou a papelada referente aos processos arquivados definitivamente. Foram 30 toneladas descartadas.
Em artigo compartilhado semanalmente por e-mail, o desembargador Pedro Valls Feu Rosa trata do número de juízes e da demanda do Judiciário. Ele avalia que aumentar o quantitativo de magistrados também não solucionaria a questão. Ele não trata especificamente do juiz das garantias no texto, mas da carga de trabalho e da consequente morosidade do Judiciário.
"Tramitam hoje pelo Poder Judiciário brasileiro 95,14 milhões de processos, aguardando julgamento por 16.429 magistrados - ou 5.790 para cada um deles. Cada processo desses consome tempo com audiências, leituras, atos diversos e, evidentemente, a decisão. Imaginemos, inflados de otimismo, que cada juiz decida um deles por dia. Aí concluiríamos, facilmente, que se fechássemos as portas dos juizados hoje, levaríamos 5.790 dias só para colocar o serviço em dia - algo como 15,8 anos, trabalhando 365 dias por ano, sem férias ou repousos semanais", escreve o desembargador.
"Durante estes 15,8 anos as portas dos juizados estariam fechadas - e os processos estariam sendo acumulados do lado de fora. Como a cada ano são propostas 28,3 milhões de novas ações, ao fim deste período nossos juízes abririam suas portas e encontrariam uma montanha com 447.140.000 processos aguardando julgamento 4,6 vezes mais do que hoje!", prossegue.
"Diante destes dados, resumir o problema a um singelo 'aumento do quadro de juízes e servidores', ou a uma 'melhor estrutura de trabalho' chega às raias do simplório", avalia o desembargador.
O presidente do TJES, Ronaldo Gonçalves de Sousa, que assumiu o cargo no mês passado, já disse que não há previsão de realização de concursos públicos. Ele pretende investir na digitalização de processos.
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