Maior cidade da Grande Vitória e que possui também o maior eleitorado do Espírito Santo, o município da Serra teve somente quatro nomes que chegaram à prefeitura do município até os dias hoje, desde a metade da década de 1970. Alternando-se em dois ciclos, primeiro José Maria Miguel Feu Rosa (PTB) e João Baptista da Motta (PSDB), e depois Sérgio Vidigal (PDT) e Audifax Barcelos (Rede), revezaram-se como prefeitos, gerando esta peculiaridade para a história da política municipal, já há 44 anos.
Com este resultado, a Serra é o município da Grande Vitória com menor alternância de poder, visto que, nos demais, houve pelo menos sete nomes eleitos em cada um deles durante esse período.
Nas próximas eleições, com Audifax encerrando o segundo mandato consecutivo impedido, portanto, de disputar , a situação pode se alterar, com nomes que se colocam no mercado político da Serra como terceira via. Mas o pleito também poderá não trazer surpresa, já que Vidigal é um dos principais pré-candidatos colocados, mesmo que ainda não oficialmente.
Nesta segunda-feira (20), a Executiva estadual do PDT se reuniu para discutir candidaturas, e decidiu que, seguindo a orientação nacional da sigla, e também o desejo do comando municipal, o PDT terá candidato próprio na cidade. Vidigal está na relação de pré-candidatos definida no encontro virtual.
Integrantes da legenda afirmam que o deputado federal ainda não bateu o martelo sobre a candidatura, por questões familiares. No entanto, não há outros quadros colocados dentro da sigla para concorrer na cidade.
Para especialistas e lideranças que participam da política da Serra há décadas, os fenômenos Feu Rosa-Motta e Vidigal-Audifax têm relação principalmente com o desenvolvimento da cidade e por gestões que, mesmo com as falhas, terminaram bem avaliadas. E é por esta razão, inclusive, que o resultado das urnas em 2020 ainda é imprevisível.
Até a década de 70, a Serra ainda era um município majoritariamente rural, em que poucas famílias tradicionais controlavam a política, entre elas a família Feu Rosa.
"Zé Maria" Feu Rosa (Arena) foi o último representante desse grupo, eleito em 1976, na segunda eleição municipal após o golpe militar de 1964. Na época não havia reeleição e o mandato de Feu Rosa durou seis anos. Ele foi sucedido por João Baptista da Motta (PMDB), o Mottinha. Eleito em 1982, era oposição ao regime militar e representou uma ruptura na gestão.
O período ficou marcado como uma época de planejamento urbano da cidade, com a construção de estradas e impulso à industrialização. No entanto, no final do mandato, sem ter preparado um sucessor forte, em 1988 os eleitores preferiram apostar em um nome já conhecido, elegendo Feu Rosa (agora no PTB) novamente.
Assassinado em junho de 1990, Feu Rosa não concluiu seu segundo mandato, e o vice Adalto Martinelli assumiu a vaga. Em 1992, Motta foi novamente eleito, pelo PSDB.
"Motta foi a transição entre a política tradicional da Serra e o ciclo moderno, veio na esteira da redemocratização, mas acabou o governo com desgastes junto ao funcionalismo. Neste clima, Vidigal venceu em 1996, que foi quando a Serra começou a se levantar como uma força econômica, tornando-se um local de oportunidades", relata o cientista político Fernando Pignaton.
Oito anos depois, o que era uma força só, dividiu-se em duas. Em 2004, quando Vidigal encerrava o segundo mandato consecutivo, lançou Audifax Barcelos pelo pDT. Ele foi colocado como um nome técnico, jamais testado nas urnas, integrante da equipe de governo, com a marca de sua gestão, além de perfeita identidade política com o chefe do Executivo.
O rosto então pouco conhecido pelo eleitorado serrano foi colocado como importante dentro da administração e com prestígio. Vidigal elegeu o aliado.
Representando a continuidade, Audifax assumiu a prefeitura, porém em 2008 o PDT negou a ele a chance da reeleição para que Vidigal disputasse. E Vidigal venceu, mais uma vez.
Já rompidos, em 2012 e 2016 Audifax e Vidigal passaram a se enfrentar diretamente nas urnas, em pleitos que resultaram na vitória de Audifax.
Para o diretor do Instituto Futura José Luiz Orrico, a disputa na Serra foi mostrando um eleitor mais conservador, que preferiu se apegar à experiência a arriscar o novo, a mudança.
"A população apostou na segurança de duas pessoas que foram resolvendo os problemas da cidade. Mesmo com outros nomes de visibilidade se articulando no cenário, os espaços ficaram estreitos para novas investidas no município que conseguissem quebrar a polarização que se estabeleceu."
"O crescimento da cidade gerou legitimidade a essas lideranças políticas. A cidade melhorou indicadores, gerou-se emprego, o que possibilitou a continuidade desses nomes. Mesmo adversários, representaram um projeto semelhante, de desenvolvimento", acrescenta Pignaton.
Para 2020, tendo em vista o cenário ainda de incertezas no município em que Vidigal, a quatro meses do pleito, ainda não se lançou oficialmente, e Audifax não fez tantos movimentos para fortalecer um sucessor há aqueles que analisam que há a possibilidade de que o processo político se oxigene.
O vereador Luiz Carlos Moreira (MDB), ex-deputado estadual que tem carreira política há mais de 30 anos na Serra, acredita que os nomes tradicionais se mantiveram até então por terem sido bem avaliados.
"A alternância entre Feu Rosa e Motta foi de rupturas, entre quem queria mudança e quem queria manter a tradição política. Já Vidigal e Audifax, alternadamente, tocaram um projeto de crescimento da cidade. Como o cenário político também aponta para um cansaço da população com essa alternância, tudo será definido no segundo turno", acredita.
Odmar Péricles, membro do PSB da Serra há algumas décadas, ressalta que o município tem um processo de renovação lento, mas que também teve uma renovação de eleitores.
"O município acabou se organizando em regiões muito autônomas: o Centro, o Civit, a região das praias, entre outras. Ainda há muito bairrismo na Serra, por falta dessa integração municipal. Isso facilita a criação de lideranças locais, como a de vereadores, mas dificulta para os cargos majoritários", opina.
"Os políticos mais antigos têm a vantagem de trazer essa memória do que já fizeram. E o novato tem que conquistar cada região, furar a bolha para se estabelecer essa confiança. O processo de organização urbana não é um facilitador para as novas gerações. Mas o eleitor também pode considerar que já houve um desgaste de ambas as lideranças", complementa.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta