No último debate do segundo turno entre os candidatos ao governo do Espírito Santo, promovido pela TV Gazeta, a pandemia da Covid-19 conduziu boa parte do enfrentamento entre o governador Renato Casagrande (PSB), que tenta a reeleição, e o ex-deputado federal Carlos Manato (PL). Em discussão, a gestão da crise sanitária, alegações sem comprovação e críticas sobre a postura de cada um nesse período. Muitas trocas de acusações sobre outros temas também marcaram o confronto.
No primeiro bloco, o tema era livre e foi pouco propositivo. Manato começou questionando Casagrande sobre o médico que realizou aborto legal numa criança de 10 anos que havia sido estuprada em São Mateus, no Norte do Estado. O governador não se recordava do nome e o adversário resgatou o episódio, tentando conferir ao socialista a acusação de "abortista". O procedimento feito na criança precisou de autorização judicial, embora a menina tivesse direito por ter sido vítima de violência sexual.
O caso ganhou repercussão nacional e o nome da criança, que não poderia ter sido identificada, foi divulgado indevidamente por grupos extremistas. A menina ganhou outra identidade e precisou se mudar do Espírito Santo. Durante a discussão sobre esse episódio, os candidatos trocaram acusações sobre quem protege ou não a vida.
Neste momento, Casagrande retomou a pauta da participação de Manato na Scuderie Le Cocq, apesar de a Justiça Eleitoral ter determinado que o governador retirasse do ar as propagandas eleitorais que tratam do assunto. O socialista queria saber da participação do adversário no grupo de extermínio, porém Manato não esclareceu.
Casagrande também tentou imprimir em Manato a acusação de coordenação da greve da Polícia Militar, em 2017, enquanto o oponente retrucou dizendo que o socialista foi beneficiado com o movimento porque se elegeu após o movimento grevista. De parte a parte, os candidatos apontaram aliados que teriam relação com a paralisação.
Outro ponto de tensão foi a discussão sobre a pandemia da Covid-19. Manato fez várias declarações sem apresentar provas e alegou que o tratamento precoce poderia ter sido adotado no Estado para o enfrentamento da doença. Contudo, várias pesquisas científicas já demostraram que os remédios anunciados para essa finalidade não são eficazes.
Casagrande disse que se surpreendeu com o fato de o adversário, mesmo sendo médico, se posicionar contra a ciência. Também criticou o que chamou de falta de empatia e sensibilidade com as vítimas da doença e seus familiares.
Com temas determinados, o segundo bloco teve a primeira discussão dos candidatos a governador envolvendo propostas. Casagrande escolheu perguntar sobre Educação a Manato e destacou a implantação de escolas em tempo integral na sua gestão, que somam 132 atualmente, segundo o atual governador.
O candidato do PL, por sua vez, citou sua proposta de implantação de escolas cívico-militares no Estado, alegando que ao redor desse tipo de escola "não tem bandidagem". Manato mencionou a intenção de autorizar os professores a cumprirem a parte da jornada referente ao planejamento escolar em casa, inclusão nas escolas de um psicólogo e de um assistente social, investir em escolas técnicas agrícolas, democratizar a escolha de diretores escolares e a criação de estágio para alunos de ensino médio.
Nos cinco minutos que tinha direito a falar sobre educação, Casagrande ressaltou que seu governo tem feito projetos em parceria com os municípios, incluindo o financiamento de mais de 100 creches já feitas e a mais 100 previstas, implantação de mais cinco escolas técnicas estaduais e a criação de uma linha de crédito para quem se formar nas escolas técnicas, assim como os que concluírem os cursos do Qualificar-ES.
Entre os nove temas disponíveis, Manato escolheu perguntar a Casagrande sobre corrupção. A partir daí, as acusações entre os candidatos voltaram ao centro do debate. Com citação ao artigo do Código Penal que fala sobre formação de quadrilha, Manato questionou se o atual governador era membro ou chefe de uma suposta quadrilha envolvendo ex-membros do atual governo, como o ex-secretário da Fazenda Rogélio Pegoretti e o subsecretário estadual de Agricultura Rodrigo Vaccari, que são alvos de investigações policiais por suspeitas de corrupção.
O candidato do PSB cobrou respeito do adversário e afirmou que o caso do ex-secretário da Fazenda só foi descoberto porque a sua gestão tem transparência e agora cabe à Justiça analisar todos os fatos. Em seguida, passou a citar os 16 anos que Manato foi deputado federal e, segundo o atual governador, "sem apresentar nada para o Brasil e o Espírito Santo". Ele ainda disse que o candidato do PL estaria ligado a uma "fábrica de fake news" tentando assassinar a honra de pessoas decentes e comprometendo o futuro da política capixaba e o respeito que o Estado tem dos brasileiros.
A tensão entre os candidatos aumentou com a menção de Manato a um pen drive do Detran-ES, que Casagrande esclareceu se tratar de uma licitação do cerco inteligente que teria sido liberada pelo Ministério Público Estadual. Então, o candidato do PL trouxe à tona que o ex-secretário da Casa Civil e deputado estadual eleito, Tyago Hoffmann (PSB), seria alvo de quase 40 investigações no Ministério Público, sendo rebatido por Casagrande, que disse não ter compromisso com erro e que seria tentativa do adversário "de assassinar a honra alheia" e citou que na pandemia o grupo do ex-deputado federal teria espalhado notícias falsas e desinformação, enquanto o governo estava salvando vidas.
No terceiro bloco, o tema do debate voltou a ser livre e também retornaram assuntos que já haviam sido explorados no início do enfrentamento dos dois candidatos — aborto, Le Cocq, negação da ciência e pandemia — e mais uma vez houve trocas de acusações.
Nessa disputa de provocações, Casagrande e Manato também tentaram medir a experiência administrativa de cada um, falando sobre a passagem que tiveram em funções públicas. O governador questionou o adversário sobre a razão para a sua demissão de um cargo no governo Bolsonaro, enquanto o candidato do PL quis saber por que o socialista não atua na sua área de formação e está sempre ligado a atividades político-partidárias.
Casagrande argumentou sobre sua capacidade de articulação e diálogo, ressaltando que, se reeleito, vai governar para todos no Estado, e não apenas para os que o apoiam. Essa foi uma estratégia para lembrar de um episódio registrado no interior de Alegre, cidade natal de Manato, onde o candidato do PL disse que não faria investimentos por ter recebido poucos votos. Ao ser confrontado sobre o assunto, ele afirmou que já se desculpou com a população local e levou recursos para a comunidade.
Em contrapartida, Manato questionou Casagrande sobre obras paradas em sua administração, apontando a existência de 270 nessas condições. O socialista disse que, na verdade, do Estado são 34 paralisações. Porém, não entrou em detalhes sobre motivos e procurou reverter a crítica afirmando que há investimentos em obras em todos os municípios capixabas.
Na sequência, o governador perguntou sobre projetos do concorrente na área social e também falou um pouco de suas propostas. Depois, quis saber sobre um ponto do plano de governo de Manato que sugere a separação de crianças da educação especial dos demais alunos, o acusando de segregação e apontando que essa é uma política educacional ultrapassada. O candidato do PL garantiu que não é essa a sua intenção e que seu projeto visa à contratação de profissionais mais capacitados para os cuidados de estudantes com alguma condição de saúde que exija esse suporte.
Manato não administrou bem o tempo neste bloco e Casagrande conseguiu fazer mais apontamentos ao final desta etapa do debate, destacando estar participando do confronto para reassumir "o seu compromisso em torno de princípios e valores da família capixaba, fé cristã e da administração pública, sempre com transparência, responsabilidade e resultados." Concluiu usando uma declaração feita por bispos da Igreja Católica sobre não permitir o retrocesso no Estado.
Em mais um bloco com temas definidos, os candidatos debateram sobre saúde, agricultura e sustentabilidade. Manato questionou Casagrande sobre o que ele tem feito efetivamente na área da saúde, já que a pergunta era sobre fila para exame e consulta. O candidato do PSB respondeu que desde junho tem trabalhado na microrregionalização da saúde, projeto cuja implantação estava prevista para 2020, mas precisou ser adiado em razão da pandemia da Covid-19.
O candidato à reeleição destacou ainda que foram feitos contratos com hospitais filantrópicos de diversos municípios para tornar efetiva a microrregionalização de exames e consultas, ou seja, que os cidadãos pudessem procurar atendimento perto de casa, sempre precisar se deslocar longas distâncias. Ele ainda mencionou o fato de ter expandido o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) para os 78 municípios capixabas, sendo que assumiu o governo com base em 17 cidades.
Mesmo falando sobre propostas e temas específicos, as provocações entre os candidatos continuaram. De um lado, Manato acusou o adversário de falar de uma realidade que parece ser de outros países e não a do Espírito Santo e prometeu descentralizar a saúde. De outro, Casagrande rebateu afirmando que o candidato do PL precisava estudar para ser candidato a governador, porque muitas das coisas que estava prometendo já foram feitas pela atual gestão. "Quer ser candidato a governador? Não é ir lá na esquina, tem que estudar", provocou.
Manato afirmou, então, que a descentralização começa com a atenção primária e argumentou que o governador não soube responder quantos municípios já têm um atendimento completo nessa área, que segundo ele seriam apenas 32. "O senhor não sabe esses números", alegou o candidato do PL.
Ao tratarem sobre agricultura e sustentabilidade, os candidatos novamente trocaram farpas sobre demora em licenciamentos ambientais. Casagrande trouxe o tema ao debate e questionou o adversário sobre o que poderia ser feito em relação aos efeitos das mudanças climáticas e na área de sustentabilidade. Manato citou empresas que estariam aguardando há mais de dois anos para obter licença ambiental e disse que outras estariam deixando o Estado por conta da "letargia" do setor.
Sem negar que haja atrasos nas licenças ambientais, Casagrande argumentou que isso se deve ao fato de estar reestruturando o Instituto Estadual de Meio Ambiente (Iema) e outros órgãos que atuam na área de meio ambiente no Estado. Ele garantiu que, com essa estruturação, os órgãos poderão atuar cada vez mais rapidamente. "Pegamos esses órgãos sucateados. Estamos recuperando. Já passamos para os municípios muitas funções para dar agilidade. O Iema está saindo da era analógica para a era digital", sintetizou o candidato do PSB.
Manato finalizou cobrando mais normatização na área e comparou o número de normas feitas pelo governo de Minas Gerais, mais de 700, enquanto no governo estadual teriam sido apenas 47 até dezembro de 2021. "O governo do Estado atrapalha os investimentos para quem quer investir no Estado. Queremos mudar essa realidade", concluiu.
Os dois candidatos tiveram, ao final, três minutos para fazer suas considerações. Casagrande aproveitou o tempo para falar que o que está em jogo no momento é o futuro. Pediu, mais uma vez, a confiança da população para ser reconduzido para outros quatro anos de governo e ressaltou o fato de o Espírito Santo ser bem avaliado e motivo de orgulho para os capixabas. Ele disse ainda que o Estado já foi desorganizado administrativa e financeiramente e que não se pode permitir retrocessos.
"Estivemos juntos defendendo a vida e a ciência e espero que a gente continue juntos num momento melhor, sem tantos desafios. Mas, se vierem os desafios, teremos condições de enfrentar", declarou Casagrande. O governador acrescentou que tem capacidade de unir o Estado e que, independentemente do candidato que se eleger para a presidência, assegurou que vai somar esforços para ajudar o Brasil e desenvolver o Espírito Santo.
Manato começou suas considerações afirmando que o Estado se desorganizou no período em que Casagrande foi vice-governador na gestão de Vitor Buaiz e que foi na administração de Paulo Hartung (sem partido) — que oficialmente não declarou apoio a nenhum candidato — que o Estado se restabeleceu. O candidato do PL reforçou sua parceria com Jair Bolsonaro (PL) e falou que eleitor do presidente tem que votar nele.
"Nos dê a oportunidade de ter um governador alinhado com o presidente porque tudo o que está sendo feito lá, vai ser feito aqui", frisou Manato, dizendo ainda de sua intenção de atuar dando prioridade à meritocracia e ao combate à corrupção.
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