A representatividade feminina em cargos de poder ainda é muito pequena, mas a presença de mulheres nesses espaços afeta significativamente a execução de políticas públicas. É o que revela um estudo realizado por pesquisadores brasileiros que relaciona a taxa de mortalidade infantil ao gênero dos dirigentes municipais do país, no período de 2000 a 2015.
Em 3.167 cidades analisadas, a queda da taxa de mortalidade de crianças menores de cinco anos foi maior onde havia prefeitas. Os resultados também foram melhores em locais com mais de 20% de representatividade feminina nos Legislativos.
A análise foi feita com base em dados disponibilizados pelo Ministério da Saúde e pelo Tribunal Superior Eleitoral e envolveu pesquisadores da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade dos Andes, em Bogotá, e do Banco de Desenvolvimento Interamericano, em Washington. A pesquisa foi publicada na revista científica Health Affairs.
De acordo com o estudo, entre 2000 e 2015, houve um aumento de 4,5% para 9,7% de mulheres à frente das cidades no país. No mesmo período, o Brasil experimentou uma grande queda na mortalidade infantil. As taxas caíram de 25,1 para 13,6. Esse resultado foi alcançado, em grande parte, pelo aumento da cobertura de programas como o Bolsa Família e de atenção primária à saúde.
Ao serem cruzados, contudo, esses dados revelaram que era não apenas o investimento em assistência social que havia contribuído para a redução da mortalidade infantil. O fato de ter uma prefeita estava associado à queda 0,027 pontos percentuais nos municípios. Além disso, em Estados com 20% ou mais de mulheres nas Assembleia, houve uma diminuição de 0,038 pontos.
"Embora o aumento desses programas seja importante, a queda da taxa de mortalidade infantil, ao longo dos anos foi maior nos municípios que possuem mais representatividade feminina. Nesses locais, a curva foi mais acentuada. As mulheres foram mais eficazes na redução da morte de crianças do que os homens, explica Ana Clara Duran, que faz parte do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Alimentação da Unicamp, e é uma das responsáveis pelo estudo.
De acordo com Duran, uma série de hipóteses pode explicar esses resultados, entre elas o olhar mais amplo das mulheres para questões sociais.
À frente do município, elas são responsáveis pela tomada de decisões. Isso ajuda a neutralizar estruturas sociais desiguais e acesso desigual a recursos sociais, culturais e econômicos, o que pode levar a um padrão social de doença", destaca.
A melhora nas taxas de mortalidade infantil pode ainda ser relacionada ao modelo de gestão adotado por mulheres, que é mais compartilhado.
Mulheres são mais democráticas e menos centralizadoras, o que também favorece para perceber as necessidades do município. Além disso, mulheres na política são menos afetadas por corrupção e os recursos costumam ser tratados com muito cuidado", destaca.
O estudo revelou também que não importa em qual partido a mulher se encontra, os resultados são os mesmos. "Quando colocamos os partidos políticos das mulheres a análise se mantém."
Ela acredita, contudo, que a atual conjuntura política pode trazer alguma diferença nos próximos anos, caso os dados sejam analisados novamente.
"A gente vê um crescimento da extrema direita, o que pode de alguma forma interferir nas políticas sociais. Eu acredito que fará diferença em âmbito estadual e federal, mas não tanto na política local. Geralmente, a ideologia não tem tanto reflexo em uma cidade. Mas teríamos que esperar uns cinco, dez anos para verificar se algo vai mudar."
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