O deputado estadual Lorenzo Pazolini (Republicanos) vai assumir uma cadeira no Executivo pela primeira vez, a partir de 1º de janeiro, como prefeito de Vitória, e já vai chegar sendo cobrado por posicionamentos firmes sobre a pandemia de Covid-19, que traz consequências para a saúde e para a economia da cidade. O prefeito eleito promete priorizar o diálogo, ouvindo a ciência e o setor produtivo para "equilibrar a balança".
Com o fim da ajuda financeira extra do governo federal em 2021 e o risco de uma segunda onda da doença provocada pelo novo coronavírus, que pode levar a novas restrições, ele também deve ter que adotar medidas para estimular especialmente comércio e serviços, maiores fontes de arrecadação municipal.
Outra tarefa diagnosticada por ele é a de aprimorar a capacidade de a máquina pública se financiar. Ou seja: atacar a dependência fiscal, o endividamento, o alto custo com servidores e o nível de investimento nos municípios. Isso porque a Capital, segundo Pazolini, vai começar o ano com uma capacidade muito pequena de investimentos com recursos próprios.
Em entrevista para A Gazeta, o prefeito eleito analisou o cenário que está herdando na gestão da Prefeitura de Vitória, detalhou planos e metas e comentou sobre questões políticas com as quais terá que lidar em sua administração.
Conforme o que já foi analisado pelo senhor e pela equipe de transição até agora, quais são as maiores dificuldades ou desafios esperados para este início da gestão em Vitória? O que mais te preocupa? O que fará para superá-los?
Sem dúvida nenhuma, o desafio da cidade é retomar a sua capacidade de investimento com recursos próprios. A prefeitura precisa ter condições de, efetivamente, fazer entregas à sociedade, em equipamentos públicos, melhoria de qualidade de vida, projetos, programas. E, hoje, essa capacidade de investimentos está muito comprometida. Considerando o orçamento de R$ 2 bilhões, há cerca de R$ 100 milhões, o que é um valor irrisório. Além disso, temos o cenário da pandemia, que é um grande desafio também. Trazer e manter a atividade econômica, preservando a vida das pessoas. Para essa equação, será necessário muito diálogo e muita humildade e vamos ter que atender às necessidades da cidade. E, ainda, aumentar a sensação de segurança na cidade. Temos que dar condições de as pessoas saírem de casa no pós-pandemia com o mínimo de segurança. Sabemos que o crime é dinâmico, acontece, mas temos estratégias de planejamento, preparação e equipe qualificada para entregarmos um plano de segurança.
A arrecadação menor é uma preocupação? O orçamento previsto para 2021 ficou apenas 1% maior do que o de 2020, ano em que houve ainda o dinheiro do socorro da União a Estados e municípios. Vitória recebeu um auxílio de R$ 48,6 milhões, mas não há previsão de isso se repetir em 2021.
A questão da arrecadação nos preocupa muito, por isso que vamos ter que buscar alternativas de não majorar alíquota de tributo, a base de cálculo, e não aumentar imposto. Nós temos que ser eficientes na gestão, fazer mais realizações com menos, e esse é o nosso desafio. E, ao mesmo tempo, temos que trabalhar para que a atividade econômica seja retomada e expandida. Aí, vamos aumentar a arrecadação porque os atos de comércio e serviços aumentaram na cidade, e não porque aumentamos impostos. Queremos dinamizar a atividade econômica da cidade, atrair empresas, renda, gerar emprego, mas também com foco na arrecadação.
Como lidará com a pandemia assim que assumir? Vitória é a terceira cidade do Estado com maior número de casos e mortes. Em relação ao atendimento dos doentes pelo município e quanto às normas de circulação de pessoas e abertura de estabelecimentos, o senhor pretende fazer alterações? Considera que a estratégia atual está atendendo?
Primeiro vamos ouvir muito a ciência. Ouvir profissionais da saúde, médicos, quem está se dedicando a isso, para tomar as melhor decisões. E, a partir daí, em um diálogo com o setor produtivo, comércio, serviços, bares, restaurantes, pessoas que geram emprego e renda, vamos tentar chegar a um denominador comum. Se a atividade econômica não estiver funcionando, nós não vamos ter dinheiro para pagar para que as pessoas tenham o cuidado básico do Sistema Único de Saúde (SUS), da área médica. É fundamental equilibrar essa balança.
Vai ter alguma reforma administrativa na estrutura das secretarias? Hoje são 17 pastas. O senhor vai reduzir alguma, fundir, criar?
Estou avaliando algumas questões pontuais, como a secretaria de Planejamento, Gestão e Comunicação, pode ser uma que esteja com excesso de atribuições e isso gera prejuízo para o cidadão, as coisas acabam ficando mais lentas. Então, vamos avaliar essas questões, visando uma maneira de atender mais rápido o cidadão. Não vamos aumentar o número. Vamos manter ou diminuir.
"Temos que trabalhar para que a atividade econômica seja retomada e expandida. Aí, vamos aumentar a arrecadação porque os atos de comércio e serviços aumentaram na cidade, e não porque aumentamos impostos"
10 momentos da trajetória eleitoral de Pazolini
O senhor conversou na última semana com o prefeito eleito de Vila Velha, Arnaldinho Borgo (Podemos). O que falaram? Pensam em alguma parceria para alguma questão específica entre os dois municípios?
Nós ainda não tínhamos nos falado após a eleição. Parabenizei pela vitória, desejei boa sorte a ele e coloquei a prefeitura à disposição para nós debatermos tudo que for de comum interesse entre as cidades. Deixamos as portas abertas para esse diálogo, também com as equipes técnicas, em um segundo momento, com os secretários. Vamos selecionar alguns itens da pauta. Mobilidade urbana é importante para iniciar essas conversas.
E como será com os demais prefeitos? Enxerga um trabalho conjunto na Região Metropolitana? É uma agenda que sempre é citada nas mudanças de gestão, mas pouco é feito.
Nós queremos debater desafios, gargalos comuns, ou seja, que existem para toda a Grande Vitória. A nossa característica é que temos uma área conurbada, pois os limites entre as cidades não são bem definidos e os problemas de uma afetam as outras. Esse debate precisa ser feito, junto com o governo do Estado, entendendo o que podemos solucionar em conjunto.
O senhor já se aconselhou com o ex-governador Paulo Hartung, conquistou vários aliados dele para sua campanha e, agora, tem ex-secretários dele em sua equipe de transição e no secretariado. Em seu último governo, Hartung ficou marcado por ter promovido o ajuste fiscal, mas que também custou a queda nos investimentos e críticas a ele sobre poucas políticas sociais. O senhor pretende seguir a linha Hartung de governar? Em quais pontos?
Nós temos a nossa linha, de maneira muito serena e humilde. Nós sabemos que para fazer entregas à população e materializar políticas públicas precisamos de recursos. Então, se não tivermos capacidade de investir, não vamos conseguir fazer nada. Essa linha eu trago do tempo que fui auditor do Tribunal de Contas. O que vamos fazer é economizar onde puder ser economizado, com razoabilidade, para sobrar dinheiro para chegar às pessoas, com investimento social, melhoria na segurança, na saúde e na educação. Não temos nenhum tipo de pré-conceito e quem quiser contribuir, tiver currículo, tiver condições e tiver sido testado – pois não podemos cometer erros – tem espaço aqui conosco, não tem dificuldade nenhuma. E essa é a mudança de paradigma para a cidade que, infelizmente, nos últimos anos, a questão técnica ficou esquecida. Estamos resgatando isso e estamos valorizando os bons quadros.
A atual gestão se situa no campo da centro-esquerda, e o senhor se identifica como centro-direita. Quais mudanças substanciais essa mudança de projeto político vai trazer para as políticas públicas?
Nós temos uma linha de centro-direita, razoável, ponderada, mas eu sinceramente não me preocupo com isso, e sim em realizar políticas públicas que levem melhorias à vida das pessoas, independentemente de qualquer viés. Neste momento, precisamos ter bom senso, razoabilidade. Esse Fla-Flu não está sendo bom para o país, essa disputa não está sendo boa para ninguém, todos estão perdendo e, desde o domingo da eleição, meus atos estão sendo nesse sentido. Eu liguei para o candidato João (Coser), fui ao governador (Renato Casagrande), dialoguei com o prefeito Luciano (Rezende), com todos os sinais claros para gerar um distensionamento, superar a eleição. Estou buscando todos os segmentos: igrejas, sociedade civil organizada, setor produtivo, independentemente de viés ideológico. Sou de centro-direta, não tenho problema com isso, mas vou governar para toda a cidade e reconstruir a cidade, que hoje está dividida entre alguns que têm e outros que nada têm.
"E essa é a mudança de paradigma para a cidade que, infelizmente, nos últimos anos, a questão técnica ficou esquecida. Estamos resgatando isso e estamos valorizando os bons quadros"
O senhor pretende buscar algum tipo de reaproximação com Fabrício Gandini, deputado estadual que tem base eleitoral na Capital, e que pode auxiliá-lo com emendas e outras articulações?
A minha primeira fala após a eleição foi solicitando ajuda aos 29 deputados da Casa. Sempre dialoguei muito bem com todos os deputados, consegui aglutinar colegas e estou à disposição. Não tive oportunidade de encontrá-lo ainda no plenário pessoalmente, mas estou aberto. Assim como fiz com o prefeito Luciano Rezende. Ainda no dia da eleição, tive um diálogo com ele, estive na prefeitura depois, tivemos uma conversa de cerca de três horas, com total desprendimento, olhando para frente. Não tenho dificuldade nenhuma em conversar com o deputado Gandini, muito pelo contrário.
Para a Câmara de Vitória, deve ser eleito presidente o vereador Davi Esmael (PSD), seu aliado e amigo. O vereador, contudo, tem uma atuação bastante ligada aos valores religiosos. Ele foi autor do projeto "Escola sem partido" para a cidade, defendeu o corte de verbas para o Carnaval de Vitória. O senhor diz que não se pautará nas bandeiras do conservadorismo. Como vai dialogar com o presidente da Câmara nesse sentido?
Nós não estamos participando de debates da presidência da Câmara. Eu disse, desde o início, que tenho respeitado muito a independência da Câmara, até por cobrar isso na Assembleia Legislativa, até por coerência da minha parte. Algumas matérias são muito "interna corporis", então em um primeiro momento, não iremos avançar. Os vereadores estão debatendo e vão tomar a melhor decisão. Prefiro aguardar para avançarmos nesse diálogo.
Na campanha eleitoral passada, uma das principais promessas foi a criação do Parque Tecnológico em Vitória, já que a cidade não tem como atrair investimentos industriais, por exemplo. A primeira parte desse projeto já deveria estar sendo entregue neste final de ano, que é um dos prédios, o Centro de Inovações. Qual é a sua opinião sobre o Parque Tecnológico? Vai dar prioridade a ele?
Ele é importante, mas nós, ao assumir, vamos ter que fazer o nosso juízo de valor. E para ter essa condição de decidir eu vou ter que ouvir. Vamos refazer esse debate com a comunidade, com as empresas, todos os envolvidos nessa cadeia produtiva que é extremamente importante. Temos limitação territorial de 90 km² na cidade, então não temos como receber uma planta industrial, e temos que partir para a área de tecnologia, que agrega valor, paga ISS (Imposto sobre serviços) e certamente vai ser ainda mais importante nos próximos anos. Houve, inclusive, uma alteração recente na lei que trata sobre o ISS e grande parte de nossa arrecadação vem desse imposto. A tendência é que Vitória perca ISS, precisamos nos preparar. O local da arrecadação não será mais a sede da empresa, e sim onde o serviço foi executado. Hoje, a maioria dessas empresas está em Vitória, mas eventualmente prestam serviço fora. Era uma arrecadação que ficava conosco, não vai ficar mais e isso será um desafio também.
O senhor pretende atrair investimento privado, como por meio de PPPs (parcerias público-privadas), para auxiliar a prefeitura em serviços públicos como iluminação pública, saneamento e concessões na área de coleta e destinação final de lixo, por exemplo? Ou algum outro ramo?
Estamos absolutamente inteirados nessa agenda, buscando caminhos legais. Houve a alteração na Lei de Licitações, que foi aprovada pelo Senado, e deve ser sancionada. A lei atual é de 1993, precisava ser atualizada e, com a mudança, esperamos que ajude a destravar investimentos, trazer PPPs, investidores e investimentos para toda a cidade. É o que precisamos para o cenário pós-pandemia.
Para a área de mobilidade, o senhor prometeu a extinção da Linha Verde. Mas há outras duas promessas antigas na cidade: a integração dos ônibus com o sistema Transcol, e o aquaviário, ambos que devem ser feitos em parceria com o governo do Estado. Qual é o grau de prioridade que o senhor dará a esses projetos? Avalia que são viáveis?
Nós não tratamos do aquaviário na campanha, por uma razão: fizemos avaliações internas que demonstraram que ele seria deficitário. Infelizmente, ele precisaria de repasse municipal, teria que ser subsidiado pela prefeitura. E, nesse contexto orçamentário e fiscal, não teríamos condição de fazer isso. Vamos buscar alternativas: tentar um modelo que não seja deficitário, mas ainda não o definimos. Em relação à integração do sistema municipal com o Transcol, vamos avançar nessa pauta. Esse foi um dos assuntos que conversei com o governador. Não tem prazo, mas vamos priorizar. Também é um sistema deficitário, então há essa dificuldade.
Após a realização desta entrevista, o governo do Estado anunciou, no dia 21 de dezembro, a quarta e última etapa do processo de integração das linhas municipais de Vitória ao sistema Transcol. Eles vão operar de maneira integrada a partir do dia 7 de março de 2021. Os passageiros poderão fazer a integração de uma linha alimentadora de Vitória com uma linha troncal e vice-versa por meio de terminais virtuais de integração, que ficarão em pontos específicos de grande movimento na Capital.
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