Orquestra Sinfônica do ES retorna nesta quarta (12)
Orquestra Sinfônica do ES retorna nesta quarta (12). Crédito: Lorenzo Savergnini

Orquestra Sinfônica do ES apresenta duas obras sacras

Por tudo que ambas as composições representam, seja o leitor uma pessoa religiosa ou não, certamente encontrará algo a desfrutar nas duas obras que serão apresentadas

Tempo de leitura: 5min
Publicado em 24/09/2024 às 12h54
  • Erico A. Mangaravite

    É delegado de polícia e crítico de música

O compositor argentino Mauricio Kagel disse certa feita que nem todos os músicos acreditam em Deus, mas todos eles acreditam em Johann Sebastian Bach – mestre alemão que, não à toa, compôs algumas das maiores obras sacras de todos os tempos. O fato é que tanto agnósticos como Giuseppe Verdi quanto crentes fervorosos como a monja alemã Hildegard von Bingen compuseram, ao longo dos séculos, música sacra.

A imensa maioria delas com textos ligados a rituais católicos, ou, pelo menos, cristãos – sendo uma exceção notável os Hinos do Rig Veda, de Gustav Holst, enraizados no Hinduísmo. Em comum, a infindável busca do ser humano pelo sentido desta vida e por respostas acerca do que encontraremos – se é que encontraremos algo – quando o fim da nossa existência terrena chegar.

E serão justamente duas obras sacras que a Orquestra Sinfônica do Espírito Santo (Oses) apresentará na quinta (26) e na sexta-feira (27)  desta semana no Teatro Sesc Glória, em Vitória. A primeira é mais intimista, tendo sido apresentada pela primeira vez na Igreja de La Madeleine, em Paris, em uma cerimônia em memória ao falecimento de um arquiteto, ocorrido um ano antes.

A segunda é grandiosa e foi ouvida em primeiro lugar na Musikverein, sala de concertos em Viena, sendo que na dedicatória o compositor fez questão de dizer que a obra era dedicada à maior glória de Deus, com “gratidão por ter me ajudado a passar com segurança por tantas angústias em Viena”.

Gabriel Fauré (1845-1924) passou boa parte da sua vida profissional atuando mais como organista e professor de música do que como compositor. Apenas no final da vida passou a ser reconhecido como o maior compositor francês de seu tempo. Fauré começou a compor no crepúsculo do Romantismo e encerrou seus dias na aurora do Modernismo, sendo assim um artista de transição.

E justamente por seu refinamento técnico Fauré deixou um significativo legado para a geração que o sucedeu, influenciando decisivamente nomes como Maurice Ravel, Georges Enescu e Nadia Boulanger. Em alusão ao centenário de sua morte, a Oses apresenta o Réquiem em ré menor, Opus 48, que estreou em 1888. Fauré declarou que tal obra, composta como um memorial para ocasiões fúnebres, era “dominada, do início ao fim, por um sentimento muito humano de fé no descanso eterno”.

Tais palavras não deixam de ser uma crítica ácida ao texto original do Réquiem, em latim, que traz trechos um tanto quanto peculiares, como a sequência “Dies Irae” (ou o “Dia da Ira”), que narra como o mundo será transformado em cinzas e os amaldiçoados serão silenciados e condenados às chamas – palavras não muito acolhedoras, a bem da verdade. Até por conta desse “sentimento muito humano” o compositor preferiu seguir uma prática adotada por alguns de seus antecessores do período barroco e suprimiu boa parte da intimidadora sequência (obrigado, Monsieur Fauré!), enfatizando o belíssimo “Pie Jesu”, em que uma angelical voz solista (na estreia, uma criança) pede ao Misericordioso Jesus que conceda o descanso eterno àqueles que partiram.

Foi por conta dessas e de outras inovações, tanto em termos de texto quanto em termos de música, que o nada simpático padre responsável pela igreja disse a Fauré após a estreia que novidades como aquela não eram necessárias na Madeleine, cujo repertório já era rico o suficiente...

Anton Bruckner (1824-1896) cresceu no interior da Áustria e, por muito tempo, foi organista de uma igreja católica situada em um vilarejo com cerca de três mil habitantes. Sua personalidade era um tanto quanto peculiar. Bruckner era visto como um sujeito simplório e inseguro: praticamente todas as suas sinfonias passaram por várias revisões, motivadas até por comentários despretensiosos de outros músicos ou críticos musicais. Além disso, lidava diariamente com várias obsessões, como a contagem de tijolos e de janelas dos prédios pelos quais passava.

Esse aspecto de sua personalidade, às vezes bastante perturbador para quem convivia com ele, também se refletiu em sua vida musical, de modo que o compositor, por conta de seu emprego como organista, chegava a praticar mais de doze horas por dia. Porém, de alguma forma Bruckner conseguia fazer com a música por ele criada não soasse mecânica ou desprovida de sentimentos.

Orquestra Sinfônica do Estado do Espírito Santo
Orquestra Sinfônica do Estado do Espírito Santo. Crédito: Marcelo Siqueira

Ao contrário: seu Te Deum em dó maior, concluído em 1883, é uma obra vigorosa, cujo texto em latim é uma exaltação ao poder do Criador. A música é bem característica: desde o início as cordas repetem, com pequenas variações, sequências de notas que dão suporte à melodia principal entoada pelo coro, enquanto os metais reforçam algumas das frases cantadas, gerando um efeito grandioso.

Há momentos mais reflexivos, incluindo um solo para tenor acompanhado por um violino, mas no geral a partitura é marcada pelo tom de celebração. O Te Deum, obra da qual Bruckner muito se orgulhava, fez grande sucesso durante a vida do compositor, com quase trinta apresentações em nos treze anos finais de sua existência. Trata-se de uma escolha muito adequada e representativa para celebrar os duzentos anos do nascimento deste imenso compositor.

Por tudo que ambas as composições representam, seja o leitor uma pessoa religiosa ou não, certamente encontrará algo a desfrutar nas duas obras que serão apresentadas. Contrição, conforto, paz, exaltação, força e grandiosidade – tudo isso materializado sob a forma de notas musicais que fizeram e até hoje fazem história.

Fauré: 100 anos de morte e Bruckner: 200 anos de nascimento

Com a Orquestra Sinfônica do Estado do Espírito Santo – Oses

Gabriel Rhein-Schirato, regente

Solistas: Débora Faustino, soprano; Luciana Bueno, mezzo-soprano; Giovanni Tristacci, tenor; Alfonso Mujica e Marcelo Ferreira, barítonos.

Participações especiais: Coro Vox Victoria (Reg. Sanny Souza) e Coro Opus Libere (Reg. Cláudio Modesto).

SERVIÇO

  • Série Pré-estreia e Concertos Sinfônicos
  • Dias: 26 e 27 de setembro, às 20h
  • Local: Teatro Sesc Glória, - Av. Jerônimo Monteiro, 428, Centro, Vitória
  • Ingressos: R$ 20 (inteira), R$ 13 (conveniado), R$ 15 (comerciante), R$ 10 (meia-entrada e comerciário) e R$ 10 + 1kg de alimento (meia solidária).

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