O chargista de A GAZETA, Amarildo Lima, é mais um capixaba a vencer a covid-19. Depois de ficar 8 dias internado - chegou a ir para a UTI semi-intensiva e perdeu seis quilos neste período - ele agora está em casa. Durante este tempo sempre teve pensamentos positivos de que iria vencer. Mas sabia que a batalha seria grande. E a vitória só foi possível, ele diz, com a solidariedade de muitas pessoas. "Passei a acreditar um pouco de novo no ser humano", conta.
Referência do traço que há 34 anos conta a história do Estado, do Brasil e do mundo, ele continua se emocionando e se colocando no lugar do outro para exercer o seu trabalho. Aos 58 anos, casado e pai, relata nesta entrevista como foram os momentos durante o período em que ficou internado num hospital de Vitória. Vencido o coronavírus ele passou a valorizar ainda mais as coisas simples da vida. "Fiquei com saudades de ver o pôr do sol da minha varanda".
Quando você percebeu que não estava bem?
No dia 31 de maio, um domingo, acordei sentindo o corpo um pouco doído e tossindo. No dia anterior tinha feito uma faxina, então achei que os sintomas eram resquícios da limpeza. Estava tentando me enganar. Eu e a minha família estávamos cumprindo o isolamento social, só saíamos de casa para pegar as encomendas que chegavam na portaria – sempre de máscara e usando álcool em gel. Estava tomando todos os cuidados.
Você procurou um médico?
Não procurei. Só tive esses sintomas e não senti mais nada. No outro dia a dor foi diminuindo, a tosse ficou bem leve. A coisa foi progredindo muito devagar. Usava o oxímetro e monitorava o estado febril. Na quinta-feira, mesmo insistindo para trabalhar, senti o baque. Nesse momento fiquei fraco e a respiração começou apresentar complicações. A sensação era muito estranha. Falava duas palavras e tinha que puxar mais ar. Fui piorando gradualmente.
Você chegou a fazer o exame para ver se estava com a covid-19?
Eu e minha filha fizemos o exame. O meu foi o conhecido como swab nasal e o dela o de sangue. Dois dias depois saiu o resultado positivo. Liguei para o editor de produção de A Gazeta pedindo para não divulgar a notícia, porque a minha mãe estava com chikungunya e em estado muito grave. Não queria deixá-la ainda mais preocupada.
E quando teve que ir para o hospital ficar internado?
Uma semana depois das primeiras dores. Cheguei durante a noite, fiz alguns exames e o médico constatou um pouco de infecção no pulmão, uma pneumonia bacteriana. Foi preciso entrar com o antibiótico para tratar a pneumonia. Fui orientado a voltar para casa acompanhado da minha filha. No dia seguinte foi aniversário da Ana Cláudia, a minha esposa. Pelo menos consegui curtir o dia com ela, que também passou a sentir os sintomas do vírus. Mas eu já não conseguia falar e não telefonava para ninguém. Na terça-feira fui internado. Foi colocado um cateter de oxigênio no meu nariz para eu respirar. E a tomografia do pulmão mostrou que em 8 dias a doença atingiu 50% dele.
Como foi despedir da sua filha Camila (ela que levou Amarildo para o hospital)?
Me despedi da Camila e tive a sensação que iria ficar sozinho e sem saber o que ia acontecer. Neste momento a ficha caiu que eu dependia de um equipamento para viver. Já não respirava sozinho. Mas mesmo com a situação num estágio grave fiquei tranquilo.
O tempo todo da internação você ficou lúcido?
Nos 8 dias internados eu não fui entubado em nenhum momento. No primeiro dia piorei e tive que ir para UTI semi-intensiva, mas durante todo período de internação estive lúcido e acordado. E como levei o celular pude ter contato com a minha filha e esposa. Mas não foi fácil, fiquei muito combalido. Não conseguia ficar em pé e respirar era muito difícil. Também não me alimentava, fazia um esforço para comer 1/3 das refeições. Perdi seis quilos nesse tempo.
Nos momentos isolado no hospital o que pensava?
Sempre estive confiante porque sou positivista. E estava seguindo as recomendações dos médicos. Tinha quase a certeza de que não seria entubado. Não ficava pensativo, mas o que posso relatar é o tratamento dos profissionais do hospital. Essa solidariedade é que me deu a força para vencer. As enfermeiras parecem anjos.
Amarildo Lima
Chargista de A Gazeta
"A solidariedade dos profissionais de saúde me deu a força para vencer o vírus. As enfermeiras parecem anjos."
O isolamento total também é muito difícil de encarar. Enfermeiros, técnicos de enfermagem e médicos estão todos paramentados e só é possível ver os seus olhos...
É isso. As pessoas que iam limpar o quarto, as enfermeiras, mesmo com a máscara a gente sempre conversava. Uma delas estava com a mãe e a sogra internadas em hospitais da Grande Vitória. E ela estava ali cuidando de mim. Todo dia anotava os nomes das enfermeiras no celular para chamá-las pelos nomes. Quando tive alta enviei uma mensagem agradecendo pelo carinho e dedicação de cada um.
Tudo isso sem poder receber a visita de sua esposa e filha….
A minha filha foi me visitar uma vez, porque ela é médica. E o meu irmão, que também é médico, fez visitas. Durante esses 8 dias eu fiquei preocupado com o estado de saúde da minha esposa, que também foi contaminada, mas estava em casa. Outra coisa bacana foi a solidariedade das amigas médicas da minha filha. Tinha uma que ia ficar 20 minutos comigo, outras enviavam mensagens.
E sua mãe, como soube?
Liguei antes de ir para o hospital e disse: “Estou com covid”. Falei fazendo um esforço danado. Disse que estava indo para o hospital. Ela chorou, se apavorou. Mas o que deu a tranquilidade foi que eu tinha ligado.
E como foi receber alta?
Foi uma surpresa e aconteceu na véspera do meu aniversário. Consegui comemorar em casa. Na saída do hospital teve palmas representando a vitória. Tirei foto com os enfermeiros e na hora do agradecimento a voz embargou. Não tem como não se emocionar. Fiquei numa situação muito ruim e eles me ajudaram a sair. Fico muito agradecido.
Amarildo Lima
Chargista de A Gazeta
"Foi uma surpresa e aconteceu na véspera do meu aniversário. Consegui comemorar em casa. Na saída do hospital teve palmas representando a vitória. Tirei foto com os enfermeiros e na hora do agradecimento a voz embargou. Não tem como não se emocionar."
Diante de tudo que viveu, o que você aprendeu com essa doença?
Que a gente desacredita da humanidade e da solidariedade. A maior lição foi ver que as pessoas têm um lado muito bom. A solidariedade dos amigos, dos meus colegas de trabalho, dos vizinhos, dos familiares, dos profissionais do hospital… Passei a acreditar um pouco de novo no ser humano. É a sensação de chegar perto da morte e voltar. Sempre valorizei as coisas simples. Tinha saudades de ver o pôr do sol da varanda da minha casa. Voltei uma pessoa melhor.
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