A economia do Espírito Santo desenvolveu-se principalmente baseada na exploração, produção e exportação de recursos primários ou semimanufaturados. Minério, rochas ornamentais, café, petróleo e celulose se tornaram essenciais para garantir o crescimento do Estado e a geração de renda da população capixaba.
Esse modelo produtivo, no entanto, traz desafios que, hoje, precisam ser superados para garantir a competitividade capixaba nos mercados nacional e internacional. A dependência por produzir e vender matéria-prima, que perdura mesmo com o desenvolvimento industrial, torna a economia capixaba vulnerável às oscilações financeiras mundiais.
O cenário exige do Estado, que é uma pequena economia aberta, uma intensa atividade na extração e beneficiamento desses recursos, além de espaços e um sistema de transporte e comercialização nada simples.
“Mesmo com a industrialização, nós continuamos prisioneiros desse modelo. Seja com o café, seja com proteína animal, seja com minério de ferro, todas essas commodities que são produzidas em larga escala são comercializadas sem muito valor agregado. Para exportá-las, é preciso dispor de uma logística gigantesca”, pontua o economista e conselheiro do Conselho Regional de Economia do Espírito Santo, Ricardo Paixão.
Os efeitos desse tipo de produção, que liderou o crescimento econômico do Estado nos anos 1970 e ainda exerce grande impacto no Produto Interno Bruto (PIB) estadual — de 50% a 55% —, são diferentes nos dias de hoje. No presente, cada vez mais, os mercados investem em tecnologias e buscam soluções mais sustentáveis, explica o economista Orlando Caliman.
Neste contexto de transformações, para que o Espírito Santo consiga produzir bens mais competitivos nos mercados globais, é necessário que a economia capixaba torne-se mais complexa e consolide novas cadeias produtivas. “É preciso olhar mais para a frente do que para trás em termos de definição de estratégia ou de política de desenvolvimento”, defende Caliman.
Em outras palavras, esse “olhar para a frente” significa buscar alternativas para diversificar a produção e expandir o mercado atendido pelo Estado. Isso inclui a implementação de novas tecnologias tanto para oferecer mais opções de produtos quanto para agregar ainda mais valor ao que já é produzido.
Caliman explica que é fundamental que o Espírito Santo passe a construir uma estrutura produtiva mais diversificada, com utilização de tecnologia. “Temos que produzir não só para os mercados que já atendemos, mas também e, principalmente, para os mercados que ainda não conseguimos atender.”
A necessidade de inovação tecnológica também diz respeito à segurança econômica.
O especialista também considera essencial melhorar os processos existentes para que os produtos capixabas já comercializados não percam espaço para os de outras origens. Refletindo sobre o futuro, Paixão afirma que “precisamos dar maior dinamismo para fortalecer aquilo que já fazemos bem. No primeiro momento, é importante fortalecer o que fazemos para manter a competitividade.”
Uma das estratégias defendidas por Caliman para equilibrar inovação e a importância econômica das commodities no Estado é tornar a economia do Espírito Santo mais complexa a partir, justamente, das commodities, como já acontece em algumas produções.
O café solúvel é um dos exemplos citados pelo economista. Antes, o Estado exportava apenas café em grãos e verde, sem processamentos e sem a adoção de tecnologias avançadas. Agora, o produto tem mais valor agregado e é mais uma opção para ser comercializada.
O setor de mármore e granito também pode absorver mais tecnologias, de acordo com Caliman. “É possível avançar mais para aproveitar esses recursos que estão disponíveis em diversidade. O Espírito Santo tem uma característica de expor reservas de granito de várias qualidades, cores e matizes. Isso o torna competitivo do ponto de vista da natureza.” De acordo com o economista, aplicando as tecnologias necessárias, é possível ofertar produtos acabados sofisticados que atendam aos mercados mais refinados e exigentes.
Para o CEO da DVF Consultoria, Durval Vieira de Freitas, é importantíssimo verticalizar a economia.
Além disso, o especialista considera que o turismo capixaba é outra grande alternativa que pode contribuir para que o Estado seja mais independente em relação às commodities. Para que o setor se torne relevante economicamente, no entanto, é necessário, de acordo com ele, investir em divulgação e também na qualificação da mão de obra.
“Tem que profissionalizar o turismo, melhorar as nossas alternativas de ofertas e também a qualidade do atendimento e das instalações para ter um turismo de qualidade sendo promovido”, afirma Freitas.
A qualificação da mão de obra capixaba em todos os setores esbarra em três pontos, de acordo com Freitas. O primeiro, aponta ele, é o assistencialismo, que não incentiva a busca por profissionalização. O segundo é a oferta de conteúdos programáticos, que não se adequam à realidade. E o terceiro é a falta de logística para pessoas em vulnerabilidade social, que têm dificuldades para se alimentar e se transportar para os locais de curso.
Outro ponto que dificulta o desenvolvimento do Espírito Santo e de todo o Brasil, segundo Paixão, é o custo do transporte. “O Brasil tem dimensões continentais, assim como a Rússia, mas a Rússia é cortada por trilhos. Se há diversificação da matriz do transporte, é possível baratear o custo, mas aqui o transporte é basicamente rodoviário.”
O economista explica que grande parte das cargas fica pela estrada no país, causando um desperdício enorme e um consequente aumento no custo do produto transportado. “Há uma leve perda de competitividade. Por mais que nossos produtos ainda sejam competitivos, perdemos com essa logística.”
Além do aumenta da malha ferroviária, outra solução mencionada por Freitas é a melhora do sistema portuário no Estado. De acordo com ele, o Espírito Santo não está suficientemente qualificado para receber navios de grande porte nem cargas frigorificadas e, por isso, é preciso ter investimentos mais robustos na infraestrutura capixaba.
Dinamizar a economia capixaba e os processos de outros setores — como indústrias e turismo — passa pelo aumento das tecnologias aplicadas nas etapas de produção. Para Paixão, elementos como a robotização, desenvolvimento de novos softwares e aplicação de inteligência artificial são importantes para acelerar a independência do Estado e para melhorar a eficiência das empresas.
Viabilizar essa transformação, no entanto, não é algo que ocorre da noite para o dia. O economista pontua que no Brasil não há um projeto de longo prazo para garantir o avanço de forma constante, independentemente do governo vigente.
“Nós não temos um grande projeto, um projeto integrado, bem articulado, com vários atores envolvidos desenvolvendo isso. Nós temos ações pontuais de governos mas, para desenvolver parques tecnológicos, que impactem significativamente em vários setores da economia, é preciso um investimento de longo prazo”, explica Ricardo Paixão.
Os parques tecnológicos são espaços que buscam promover a integração entre centros educacionais, como universidades e institutos federais, empresas e órgãos de pesquisas, para desenvolver projetos que solucionem os problemas atuais com aplicação de tecnologia e produção de conhecimento. Além disso, os ambientes também são capazes de formar profissionais capacitados para atender às demandas de um mercado cada vez mais dinâmico e exigente.
Tornar tais ideias realidade requer, segundo Paixão, “uma grande articulação com vários atores envolvidos, como os entes federativos, municípios, Estado, setor privado e instituições não governamentais. Todos esses atores precisam estar envolvidos nesse projeto.”
Pensar no futuro demanda consciência dos desafios ambientais que devem ser levados em conta para tornar as produções menos poluentes e destrutivas. Caliman defende que o desenvolvimento tecnológico deve possibilitar uma produção com menor utilização de insumos não renováveis, por exemplo.
Para o economista, tornar os produtos capixabas mais tecnológicos e “verdes” é fundamental para melhorar a produtividade e manter a competitividade. "No fundo, o que vai fazer o país e o Espírito Santo crescerem, e vai levar à população a capacidade de se beneficiar da geração de riqueza, é o aumento da produtividade."
O desenvolvimento tecnológico, tão essencial, não fica restrito apenas aos setores produtivos industriais, do agronegócio e do comércio. “Ele ajuda na medicina, no trânsito e até em outros segmentos. É o que chamamos de externalidade positiva”, explica o economista.
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