“Nada que eu disser será suficiente”. Esse é o sentimento que muitas mulheres têm quando são vítimas de violência e vão continuar tendo a partir da absolvição de Daniel Alves pela justiça espanhola.
Daniel Alves, que tinha sido condenado por ter praticado violência sexual contra uma mulher em 2022, agora está livre das acusações. E não é que o tribunal espanhol tenha entendido que ele é inocente. Os julgadores entenderam que o depoimento da vítima era insuficiente e que existe “uma série de lacunas, imprecisões, inconsistências e contradições quanto aos fatos”.
No caso, se existem contradições a serem consideradas são as cinco versões apresentadas por Daniel ao longo do processo, que iniciou dizendo que não conhecia a vítima e não tinha encontrado com ela e terminou o processo dizendo que tinha mantido relações sexuais com ela, mas com total consentimento.
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A vítima preferiu o anonimato e só queria justiça pelo mal que lhe foi feito. Quando veio a sentença condenatória, ela e tantas outras pessoas pelo mundo acreditaram que a justiça tinha sido feita, ainda que do outro lado o poder econômico e a pressão de ser um astro pudessem ser maiores. Mas não demorou muito pra realidade voltar a aparecer bem na nossa frente.
A realidade que nos assombra é a de que as vítimas são transformadas em acusadas em muitos casos. A realidade é a de que a palavra da mulher vítima é sempre contestada e vista com certo cuidado para não “acabar com a carreira desses homens queridos”. A realidade é a de que a palavra da mulher continua sendo a última a ser ouvida; quando é.
Muitos podem se perguntar o porquê de a palavra da vítima ter relevância quando se trata de crimes sexuais e a resposta de prontidão é justamente pela dinâmica da prática desses crimes, que geralmente acontecem sem testemunhas.
Há quem questione que isso seria dar valor maior à palavra da vítima, o que violaria o devido processo legal. Como bem aponta a professora Soraia Mendes, não é para sacralizarmos a palavra da vítima, por óbvio. O objetivo é garantir que a palavra da vítima seja considerada como a principal prova desse tipo de crime e que sejam afastados estereótipos e discriminações geralmente impostos à mulher vítima.

As mulheres não precisam provar que “merecem estar na condição de vítima”, o que acontece em tantos e tantos casos de violências praticadas com direcionamento de menosprezo ou ódio às mulheres. Ser vítima já é muito difícil. Ter que se provar digna de ser atendida pelo Estado, pior ainda.
Este dia 28 de março de 2025 fica registrado como um dia de derrota para a luta das mulheres pelo fim das violências sexuais, pelo fim da objetificação dos corpos. A sensação que fica é de tristeza, de impotência, de nos perguntar quanto vale a palavra da mulher.
Mas, mesmo diante disso tudo, sabemos que é preciso seguir para avançar, seguir para não deixar que os retrocessos se instalem. Apesar disso tudo, nós vamos seguir até que não seja mais comum que mulheres sejam estupradas e homens saiam absolvidos de cabeça erguida.
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