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É advogado criminalista e professor de Processo Penal

Prisão imediata após Tribunal do Júri: os equívocos da decisão do STF

A decisão do STF, que deveria zelar pela Constituição, fere os direitos fundamentais dos cidadãos e promove um ambiente de insegurança jurídica

  • Rivelino Amaral É advogado criminalista e professor de Processo Penal
Publicado em 17/09/2024 às 17h10

Uma recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que permite a execução imediata da pena para condenados pelo Tribunal do Júri levanta preocupações profundas sobre o cumprimento da Constituição. O STF — que é, por força da própria Constituição, o seu guardião — tem demonstrado uma postura que, em vários momentos da história do país, se distancia desse papel fundamental, garantido contra os princípios constitucionais que deveriam proteger.

Uma das situações mais notórias em que o STF teria trabalhado contra a Constituição foi quando, contrariando o texto constitucional, determinou que os réus condenados em primeiro grau, caso mantida a condenação em segunda instância, deveriam iniciar o cumprimento da pena, mesmo antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.  Isso fere gravemente o texto legal da Constituição de nosso país.

 Esse episódio representou, para muitos, uma clara violação ao princípio da presunção de inocência, resultando em uma decisão que foi posteriormente revertida. No entanto, o estrago já havia sido feito, e o desrespeito à Constituição ficou evidente.

Agora, mais uma vez, o STF teria rasgado a Constituição para determinar a prisão imediata de pessoas condenadas pelo Tribunal do Júri, ignorando as várias etapas do processo e dos recursos que a própria lei assegura. A condenação pelo júri, embora seja uma decisão de primeiro grau, não encerra o processo judicial. Há um longo caminho de recursos que pode levar à anulação da sentença, como ocorre em muitos casos, ou a modificação da pena. A decisão de prender imediatamente alguém que ainda tem o direito de recorrer representa um grave desserviço à justiça e também à sociedade.

É importante lembrar que as prisões são medidas extremas e de exceção, que impactam não só a vida do condenado, mas também a de seus familiares, com repercussões permanentes. A decisão do STF é vista como equivocada, especialmente em um momento em que o país atravessa um período politicamente carregado, com decisões que aparentemente estão sendo tomadas para criar uma falsa sensação de que as leis estão sendo rigorosamente cumpridas.

A execução imediata da pena, sem esgotar os recursos cabíveis, pode resultar em uma situação em que pessoas inocentes, ou cuja culpa ainda não tenha sido comprovada, sejam presas de forma indevida. E quem, afinal, reparará os danos causados a essas pessoas, caso se comprove que a sentença foi injusta?

Sede do STF
Sede do STF. Crédito: Valter Campanato / Agência Brasil

A história do sistema de justiça brasileiro está repleta de exemplos de pessoas que foram presas de forma equivocada, apenas para serem libertadas após longos períodos, muitas vezes após a revisão de suas condenações.

Além disso, a soberania dos veredictos do Tribunal do Júri não deve se sobrepor ao direito de defesa e à presunção de inocência. O STF, ao validar esta decisão, estaria ignorando a necessidade de revisão por instâncias superiores, que podem tanto anular quanto reduzir a pena imposta pelo júri. A história já demonstrou que muitas dessas condenações são revistas, o que torna a prisão imediata um erro ainda mais grave.

A decisão do STF, que deveria zelar pela Constituição, fere os direitos fundamentais dos cidadãos e promove um ambiente de insegurança jurídica. A presunção de inocência é um princípio basilar que não pode ser negligenciado, e a prisão imediata de réus que ainda têm o direito de recorrer atenta contra os fundamentos da justiça.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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