Enquanto o país enfrenta o pior momento da pandemia da Covid-19, com mais de 2.000 mortos por dia, cresce o apoio da população a restrições dos setores de comércio e serviços para conter o avanço do vírus que já matou 285 mil brasileiros até a noite desta quarta-feira (17).
É o que mostra pesquisa Datafolha feita na segunda (15) e terça-feira (16) com 2.023 pessoas. Todas foram abordadas pelo telefone, em razão da pandemia. A margem de erro é de dois pontos percentuais.
De dezembro, quando o número de contaminações havia começado a subir novamente, até março, momento em que o Brasil se torna o país em que mais se morre pela doença no mundo, cresceu o apoio à diminuição do horário de funcionamento de comércios e serviços em geral. No fim do ano, 61% apoiavam a medida. Hoje, o índice subiu para 71%.
O mesmo ocorreu com o fechamento de igrejas e templos religiosos -que passaram a ser considerados serviços essenciais por decreto assinado pelo governador João Doria (PSDB) no começo do mês.
Em dezembro, se dividiam os que consideravam que esses locais deveriam fechar (49%) e os que diziam que deveriam permanecer abertos (49%). Agora, 59% defendem o fechamento.
Não variou além da margem de erro desde dezembro, mas a maioria da população continua aprovando o fechamento de lojas, bares e restaurantes (59% defendem a medida) e o fechamento de escolas (66%).
A educação foi um dos últimos setores a voltar a abrir ao público, e isso só depois que shoppings, bares e restaurantes já estavam funcionando há muito tempo.
Na capital paulista, por exemplo, a gestão Bruno Covas (PSDB) autorizou a retomada das aulas presenciais no ensino superior e médio só em outubro de 2020, e o ensino fundamental só em fevereiro deste ano, enquanto shoppings estavam liberados desde junho, ainda no auge da primeira onda da doença. Agora, com o recrudescimento da pandemia, as aulas na cidade foram novamente suspensas.
O Datafolha mostra também que é majoritária a opinião de que é preciso fechar serviços como salões de beleza e escritórios (62%).
Além disso, 75% dos entrevistados defendem o fechamento das academias. Em março deste ano, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), liberou a abertura de salões de ginástica mesmo no período de restrições mais severas na capital federal.
Mesmo espaços abertos, onde evidências científicas mostram que a contaminação é mais difícil, não escapam. A maior parte da população defende o fechamento de parques (78%) e praias (81%).
Em São Paulo, a atual fase emergencial, até agora a mais restrita da pandemia, com limite a serviços essenciais e toque de recolher, também proíbe o acesso a parques e praias --que registraram cenas de aglomeração de pessoas sem máscara durante toda a pandemia.
A paralisação dos jogos de futebol é defendida por 76% da população, segundo o Datafolha. Em São Paulo, as partidas estão suspensas durante a fase emergencial, mas, contrários à medida, os clubes e a Federação Paulista de Futebol tentam transferir os jogos do Campeonato Paulista para fora do estado.
Num momento em que especialistas defendem em coro a necessidade de uma quarentena rígida e as autoridades federais se negam a tomá-la, a pesquisa mostra que, para 59% da população, hoje é mais importante deixar as pessoas em casa, mesmo que isso prejudique a economia do país.
Do outro lado, 30% defendem que é preciso acabar com as medidas de isolamento para estimular a economia. Já outros 10% responderam que não sabem.
A pesquisa Datafolha mostra que a defesa de manter a população em casa para conter o avanço da doença é maior entre mulheres (65%) do que entre homens (54%), mas não varia além da margem de erro de acordo com a escolaridade, renda ou idade.
O Nordeste é a região que mais apoia essas medidas (67%), seguida por Centro-Oeste e Norte (59%), Sudeste (58%) e Sul (50%).
Mesmo pessoas desempregadas defendem as restrições (66% delas, segundo o Datafolha). A diferença é grande, porém, entre o empresariado: apenas 31% disseram defender essas medidas, enquanto 50% são contrários -outros 19% disseram que não sabem.
Também há discrepância entre os que consideram o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ótimo ou bom: 35% defendem restrições e 54% são contrários. Já entre os que o avaliam como ruim ou péssimo, 76% defendem manter a população em casa e 15% são contrários.
Desde o começo da pandemia, o presidente da República se manifesta contra as medidas de distanciamento social e promove aglomerações entre seus apoiadores --seja quando aparece em manifestações em frente ao Palácio do Planalto, seja em passeios, como no Ano Novo, quando apareceu em uma praia praia no litoral de SP.
Com o avanço da pandemia e sem iniciativa federal, governadores e prefeitos têm implementado por conta própria medidas de distanciamento e isolamento, ainda que repitam que essas medidas são pouco eficazes se não houver uma coordenação nacional.
Mesmo assim, Bolsonaro se mantém radicalmente contrário. Na última semana, ele chegou a ler ao vivo uma carta de suicídio para mostrar que as medidas adotadas por governadores, em sua opinião, podem ter consequências mais graves que o vírus. Foi, por exemplo, determinante para a escolha do novo ministro da Saúde, o médico Marcelo Queiroga, sua posição contrária do "lockdown".
Enquanto o governo federal joga contra, prefeitos tentam fazer o que podem, ainda que enfrentando pressão de comerciantes e empresários. Nesta quarta, Campinas (SP) decretou toque de recolher com multa e detenção até em festas de família.
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