O Ministério da Agricultura (Mapa) está investigando sementes vindas principalmente da China e entregues em diferentes endereços pelo Brasil. Os pacotes são enviados pelo correio como brindes de outras compras feitas pela internet ou mesmo de forma aleatória, sem que o destinatário tenha pedido nada no exterior.
A enfermeira aposentada Ilona Lachowski Loewen, 63, de Curitiba, foi uma das que recebeu o pacote sem mesmo ter feito uma encomenda de fora do país. Como ela já tinha lido sobre casos parecidos em outros países, decidiu não abrir a embalagem, que continha vários de seus dados, como CPF e telefone.
"Acho que pegaram [os dados] de algum site, de alguma compra. Estava escrito no pacote em inglês 'seeds' (sementes) e já me lembrei das notícias internacionais, mas aí fiz uma pesquisa e, para minha surpresa, ainda não tinha nada parecido registrado no Brasil", conta.
Buscando informações com autoridades do estado, Ilona conseguiu dar o devido destino às sementes, que foram encaminhadas ao Mapa. Hoje, já são 36 pacotes entregues ao órgão, de oito estados diferentes, que vieram não só da China, mas também da Malásia e de Hong Kong.
O material está sendo analisado por técnicos do Laboratório Federal de Defesa Agropecuária de Goiânia (GO), que devem apurar a origem e a natureza das sementes. Como elas podem ser de espécies ainda não introduzidas no país, podem virar plantas daninhas, e representam perigo de disseminação de insetos e até mesmo de doenças.
"Até o momento, ainda não é possível apontar os riscos envolvidos", esclareceu o Ministério.
Em Santa Catarina, a Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola (Cidasc) chamou os pacotes de "brindes perigosos", já que o primeiro registro ocorreu com um destinatário de Jaraguá do Sul que havia comprado um objeto de decoração pela internet e, junto com a encomenda, "ganhou" as sementes.
Outros pacotes distribuídos pelo estado contêm até mesmo a descrição do conteúdo interno como "joias". Em geral, as embalagens não são completamente identificadas.
Só no Paraná, outro estado entre os primeiros a emitir um alerta sobre as sementes misteriosas, no dia 18 de setembro, 14 pacotes foram recolhidos -seis deles de moradores de Curitiba. Grande parte apareceu sem que o recebedor tenha solicitado qualquer encomenda.
O Ministério e os órgãos estaduais têm orientado para que o material não seja aberto, descartado e, muito menos, utilizado. Quem receber as sementes deve contatar a instituição agrícola do seu estado ou a unidade do Mapa mais próxima para o recolhimento do produto.
Mesmo assim, em ao menos três cidades do Paraná, houve registros de pessoas que plantaram as sementes. Nestes casos, a Agência de Defesa Agropecuária do estado (Adapar) fez a coleta e vai analisar as plantas, já que o Ministério avalia apenas as sementes. Depois, elas serão destruídas.
Ainda que as tenha plantado, não é necessário se identificar para entregar o material, já que não haverá sanções. O Mapa quer saber apenas como o pacote chegou até o destinatário.
A introdução de plantas não nativas no Brasil representa riscos especialmente para o meio ambiente e a agricultura, já que pode haver necessidade de controle com agrotóxicos, levando a uma maior contaminação ambiental e ao aumento de custos na produção.
"Isso gera impacto direto nas cadeias de produção vegetal e, consequentemente, na economia", ressalta Renato Blood, gerente de Sanidade Vegetal da Adapar.
O plantio das sementes podem representar perigo mesmo que elas pareçam sadias. "Muitas das pragas e doenças que elas podem conter são invisíveis a olho nu, e somente podem ser detectadas por meio de análises laboratoriais", afirma o coordenador do Programa de Certificação, Rastreabilidade e Epidemiologia Vegetal da Adapar, Juliano Galhardo.
Outros países do mundo, como Portugal e Canadá, também já emitiram alertas sobre o recebimento de sementes da Ásia. Em julho, agricultores dos Estados Unidos denunciaram o caso. Autoridades do país cogitam a hipótese de vendedores chineses usarem dados e endereços de consumidores americanos que compram pela internet para fazer vendas falsas, e, com isso, aumentar a classificação positiva dos seus produtos em sites de compra e venda.
"Não sei quem mandou, a origem disso tudo, mas, qual a intenção, por que eles fazem isso? Vamos supor que seja uma boa intenção, de espalhar sementes, não precisava ser escondido", diz Ilona, que comemora o fato de agora haver uma orientação para quem recebe o material. "Temos enfim um canal de comunicação, mas, quando eu procurei, não tinha".
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta