O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, afirmou nesta quarta-feira (24), que considera "difícil" o Brasil obter dos Estados Unidos a liberação para compra de milhares de vacinas da AstraZeneca/Oxford estocadas e ainda não aplicadas contra a covid-19 no país. Ao falar em audiência na Câmara dos Deputados, o ministro também indicou que o Ministério da Saúde pode sofrer novos atrasos no fornecimento de doses do imunizante que são fabricadas na Índia. Ele não citou a quantidade exata. Mas disse que dificuldades na produção podem impactar o fornecimento de milhares de unidades já contratadas pelo governo federal.
O chanceler disse que não poderia dar prazos para que o Brasil efetivamente receba uma parte das vacinas solicitadas ao governo norte-americano. Segundo Ernesto, apesar de apelos do Itamaraty e do Congresso ao governo Joe Biden, o excedente de vacinas "está se materializando devagar" nos EUA.
Pressionada pela comunidade internacional, a Casa Branca anunciou ter 7 milhões de doses em estoque e já autorizou o envio de parte para o México (2,5 milhões) e o Canadá (1,5 milhões). Isso porque a vacina da AstraZeneca/Oxford ainda não obteve autorização de uso no país.
"O Brasil está negociando para procurar receber uma parte desse excedente, mas por enquanto esse excedente é algo extremamente limitado, porque está sujeito à regulação dos Estados Unidos", disse o chanceler aos deputados.
Em paralelo, ele indicou que o governo tem "boa perspectiva" de conseguir "kits de intubação" e máquinas de produção de oxigênio nos EUA.
Em relação às doses da AstraZeneca que seriam enviadas de fábricas na Índia, de onde veio o primeiro lote comprado pelo governo federal, há dúvidas se o Brasil continuará a ser abastecido. Segundo ele, há um problema generalizado na cadeia de insumos para fabricação e os países enfrentam um "mar revolto". O ministro diz que tenta conseguir as doses pendentes apesar da barreira dos insumos.
"Existe na Índia um problema interno para a continuação do fornecimento de mais alguns milhões de vacinas que já estão contratadas por escassez de insumos, que são importados de outros países", explicou o ministro.
Segundo ele, o Brasil já recebeu 4 milhões de doses, mas a Índia enfrenta desafios grandes para suprir vacinas internamente e o país proíbe a exportação do insumo farmacêutico ativo (IFA). O chanceler disse que a China enfrenta dificuldades e depende de outros componentes das vacinas fornecidos por fábricas dos EUA.
"Estamos num mundo em que existem essas limitações para todos os países", disse o ministro.
O chanceler afirmou que a China não proíbe, mas aplica controles sobre exportação de imunizantes e do insumo farmacêutico ativo, usado na produção das vacinas. Segundo o ministro, a demora é burocrática. "Nenhum problema com relação às exportações provenientes da China", disse.
O ministro foi questionado sobre a posição do Brasil contra a quebra de patentes de vacinas até o fim da pandemia, na Organização Mundial do Comércio (OMC). Alinhado a países desenvolvidos que vetam a ideia, o Brasil se posicionou contra a proposta levantada pela Índia e África do Sul.
Os dois países são parceiros do Brasil no Brics, bloco formado também por China e Rússia, e buscam a suspensão de patentes como forma de permitir a produção de forma genérica em diversos laboratórios ao redor do mundo. Isso, segundo os dois países, permitiria ampliar a oferta e o abastecimento de países pobres.
O deputado Aécio Neves (PSDB-MG), presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, disse que a posição brasileira poderia levar países pobres ao "caos".
"Não se verifica essa necessidade. Mesmo que se quebrassem patentes, o Brasil não teria capacidade de produção e levaria muito tempo para ter uma unidade de produção da Pfizer, por exemplo. A quebra generalizada de patentes não necessariamente se refletiria no aumento da oferta", rebateu o ministro.
Araújo afirmou que o "desmantelamento" do sistema de patentes pode ter "consequências não-intencionais prejudiciais". Ele afirmou que o Brasil vai tentar mediar uma posição intermediária na OMC e argumentou que a suspensão geral de patentes não resolveria o problema, por causa da escassez de insumos usados na produção dos imunizantes.
"O Brasil faz parte de um grupo de países que busca uma solução intermediária, factível. Tentamos criar essa ponte entre diferentes interesses, com a ideia de haver uma coordenação mundial, para haja uma produção mais coordenada sem a necessidade de uma quebra generalizada de patentes, que poderia desarticular todo um sistema propriedade intelectual, um sistema que funcionou bem e permitiu em tempo recorde que várias empresas chegassem com vacinas ao mercado e não há indícios de abuso de preços porque não há monopólio", disse o chanceler.
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