Conteúdo investigado: Vídeos com alegações de que o arroz que o governo federal importará é feito de plástico. Um deles mostra o processo de produção da empresa chinesa SunPring acompanhado da frase “Este é o arroz chinês. Se o que está sendo colocado a venda é este, não sei, mas seria muito interessante alguém mandar analisar”. Outro conteúdo mostra gravação em que uma mulher afirma que comprou e consumiu arroz de plástico, que derrete ao ser colocado no fogo.
Onde foi publicado: X e Kwai.
Conclusão do Comprova: Vídeos enganam ao sugerir que o arroz a ser importado pelo governo federal é feito na China com plástico e papel. Posts com vídeo do processo de fabricação de arroz em máquinas da empresa chinesa SunPring, verificados pelo Comprova, sugerem incorretamente que o grão produzido por esse equipamento é feito de plástico e será comprado pelo Brasil. Na verdade, a empresa reprocessa grãos quebrados e dá ao produto o formato de um grão de arroz normal.
A SunPring explica em seu site que seu arroz é artificial e pode ser feito com milho, trigo, aveia e soja, além de grãos quebrados de arroz como matéria-prima. É possível ainda incrementar nutrientes como cálcio, zinco e ferro. Em nenhum momento é cogitado o uso de papel ou plástico na produção do grão.
“O valor dos nutrientes do arroz artificial é de 5 a 10 vezes maior que o do arroz normal”, garante a empresa. Ainda segundo a companhia, “o preço do arroz artificial é mais alto do que o arroz normal, mas ele pode ser cozido diretamente ou cozido no vapor com arroz normal na proporção”.
Segundo informou a Associação Brasileira da Indústria do Arroz (Abiarroz), esse processo existe há muitos anos, mas é de baixa produção por não ser economicamente viável.
“O arroz do vídeo é um arroz produzido em máquina extrusora e é fabricado a partir dos grãos quebrados de arroz, quirera, canjica e canjicão de arroz, extrusado por meio de um tubo formatador que corta o amido em forma de arroz”, afirmou a entidade. Neste vídeo, publicado no YouTube pela empresa chinesa, é possível ver a produção em detalhes.
O governo federal não prevê a importação de arroz artificial, como o produzido pela empresa chinesa. O edital da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) evidencia que o arroz importado deve ser tipo 1, ou seja, o de melhor qualidade, da safra 2023/2024. O documento detalha ainda que o produto deverá ter aspecto, cor, odor e sabor característico de arroz beneficiado, sendo vedada a aquisição de arroz aromático. A medida adotada pelo governo federal tem por objetivo suprir a demanda após perdas na safra do Rio Grande do Sul, maior produtor do país, devido às enchentes.
A Conab disse que o arroz poderá ser comprado de todos os países produtores e exportadores de arroz, mas as variedades precisam ser compatíveis ao consumo brasileiro, conforme Instrução Normativa do Ministério da Agricultura e Pecuária n.º 06/2009. Essa normativa da Conab especifica que o arroz importado é proveniente da espécie Oryza sativa L., uma das mais cultivadas globalmente, como mostra detalhamento feito pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
O autor do post enganoso foi procurado pelo Comprova, mas não respondeu até a publicação deste texto.
Enganoso, para o Comprova, é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 28 de maio, o post tinha 128,2 mil visualizações, 2 mil curtidas, 1 mil compartilhamentos e 208 comentários.
Fontes que consultamos: Entramos em contato com a Conab, com a Abiarroz e entrevistamos Manoel Maradini Filho, professor do Departamento de Engenharia de Alimentos da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Também procuramos pelas regras definidas para o leilão de importação do arroz e fizemos uma busca reversa no Google para identificar a origem de um dos vídeos enganosos verificados.
Em outro vídeo, publicado no Kwai, uma mulher afirma que comprou “arroz de plástico”. Ela coloca os grãos diretamente nas chamas do fogão e alega que estão pegando fogo e “derretendo”. Nem o Rio Grande do Sul, nem a China são citados na gravação, mas o vídeo, que circula pelo menos desde maio de 2022, voltou a viralizar no contexto da discussão da importação de arroz pelo Brasil.
O professor Antônio Manoel Maradini Filho, da Ufes, analisou o vídeo a pedido do Comprova. Ele, que atuou por 30 anos no desenvolvimento de produtos e no controle de qualidade em empresas alimentícias, afirma não ser possível dizer que o material que aparece na gravação é arroz. “Parecem ser peletes de material plástico com formato parecido com grão de arroz”, diz. Segundo Maradini, o arroz exposto a uma chama como a do vídeo viraria carvão e não derreteria. “Não tem nenhuma informação do fabricante, não apresenta nenhuma embalagem”, alerta.
Há cerca de duas semanas, o governo federal editou uma medida provisória que autorizou a importação de 104 mil toneladas de arroz pela Conab. O objetivo é evitar o aumento preço do do produto após as enchentes no Rio Grande do Sul, maior produtor do grão no país. A previsão era a de que o leilão ocorresse no último dia 21, mas foi suspenso.
A Conab divulgou no dia 20 um comunicado informando que a nova data de realização “será publicada oportunamente”.
Durante reunião extraordinária, o Comitê Executivo de Gestão (Gecex) da Câmara de Comércio Exterior (Camex) zerou as tarifas para dois tipos não parboilizados e um tipo polido/brunido do grão até 31 de dezembro. A Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) informou que vai monitorar a situação para reavaliar o período de vigência, caso necessário.
Para zerar as tarifas, os três tipos de arroz foram incluídos na Lista de Exceções à Tarifa Externa Comum (Letec) do Mercosul. A medida, conforme disse o MDIC, foi solicitada pelo Ministério da Agricultura e Pecuária e pela Conab.
A maior parte das importações de arroz no Brasil vem do próprio Mercosul, sem pagar tarifa de importação. O MDIC diz que a redução a zero da alíquota abre espaço para a compra de arroz de outros grandes produtores, como a Tailândia. Até abril deste ano, o país asiático respondia por 18,2% das importações brasileiras de arroz.
Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: O Estadão e a Agência Aos Fatos também concluíram ser falsas as alegações de que o Brasil vai importar arroz de plástico da China. O Comprova já checou outras informações relacionadas às chuvas no Rio Grande do Sul e entendeu ser enganoso o vídeo que alega que a Anvisa impediu o transporte de medicamentos ao estado e explicou que detentos em abrigos gaúchos são do regime semiaberto.
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