Diante da perspectiva de votação da medida provisória que cria uma nova versão do Mais Médicos, representantes de entidades médicas têm reforçado a pressão junto ao governo e Congresso contra a reinclusão de cubanos no programa. O grupo também tenta derrubar outras mudanças na proposta.
A possibilidade de retorno da atuação dos profissionais cubanos foi incluída em setembro por parlamentares em ajustes no texto da medida que cria o "Médicos pelo Brasil".
A ideia, sugerida em relatório do senador Confúcio Moura (MDB-RO) e aprovada em comissão mista da Câmara e do Senado, é permitir que cerca de 1.700 cubanos que ficaram no Brasil possam atuar no programa antigo por até dois anos. Nesse período, eles seriam submetidos a provas de revalidação do diploma, condição para que, passado esse prazo, possam continuar a atuar no país.
Em nota divulgada nesta terça-feira (5), entidades como a Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina dizem que as mudanças na proposta representam "um atentado à segurança do atendimento médico à população, permitindo que ele seja realizado por pessoas que não comprovaram conhecimento técnico e o domínio de habilidades e atitudes para exercer a profissão no Brasil."
Parlamentares, porém, afirmam que a medida visa atender a uma "questão humanitária" diante das dificuldades enfrentadas pelos médicos. Também afirmam que há postos não ocupados que poderiam ser preenchidos por esses profissionais.
A previsão é que a proposta seja analisada em plenário da Câmara dos Deputados nesta semana. Em seguida, o texto segue para o Senado.
A situação tem gerado uma queda de braço entre parlamentares, governo e entidades médicas. Na tentativa de reverter as mudanças, médicos têm organizado uma ofensiva para pressionar parlamentares a derrubar emendas feitas na medida provisória e voltar ao texto original.
Nos últimos dias, o Conselho Federal de Medicina chegou a criar uma plataforma que permite que médicos enviem emails a parlamentares de cada estado contra a proposta. Em uma semana, cerca de 50 mil médicos acessaram o sistema, diz o CFM.
O grupo também tem intensificado a pressão junto a membros do governo. Em outubro, entidades tiveram uma reunião com o presidente Jair Bolsonaro (PSL) para pedir que a mudança seja vetada. Nesta terça, também estava prevista uma reunião com o ministro da secretaria de governo, Luiz Ramos.
Entre os pontos polêmicos, além do retorno da atuação dos cubanos, está a inclusão de uma emenda que permite que municípios façam consórcios para contratar médicos por conta própria por meio do Mais Médicos.
O autor da medida, o deputado Alexandre Padilha (PT-SP), diz que a proposta visa facilitar a contratação de profissionais caso o novo programa não supra a necessidade de atendimento da população. Neste caso, diz, cidades poderiam fazer editais para contratar profissionais. Segundo ele, a prioridade a brasileiros seria preservada.
Já para as entidades médicas, ao permitir consórcios com apoio de organizações internacionais e editais no Mais Médicos, a medida abre novo espaço para atuação de profissionais sem validação do diploma.
"Existe uma tendência a dizer que somos corporativos. Não é questão de mercado, mas de segurança da população", afirma o presidente do CFM, Mauro Ribeiro.
Ele afirma ser a favor de dar apoio a médicos cubanos que permaneceram no Brasil, mas sem que haja permissão para atuarem antes da revalidação do diploma.
Nos últimos meses, deputados chegaram a discutir a possibilidade de que médicos cubanos atuassem apenas como auxiliares dos brasileiros. A proposta, porém, não chegou a ser formalizada.
Para o deputado Ruy Carneiro (PSDB-PB), que foi presidente da comissão mista que analisou a medida provisória em setembro, a reinclusão dos cubanos "é uma medida justa e temporária", diz. "Se não passarem no Revalida, é 'game over' para eles", afirma.
Questionado pela reportagem, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, disse que irá respeitar a decisão do Congresso. Mas faz críticas à possibilidade de reinclusão dos cubanos. "É um raciocínio imediatista", diz ele, que atribui a proposta à proximidade das eleições municipais.
Outro ponto que gera preocupação entre médicos são mudanças que alteram regras do Revalida, nome dado ao exame de revalidação do diploma para médicos estrangeiros. A proposta que segue para análise do plenário da Câmara prevê aplicação de até duas provas por ano e possibilidade de incluir faculdades privadas nesse processo.
Em nota divulgada nesta terça, entidades dizem que a medida "deixa o processo vulnerável a esquemas de venda de vagas, fraudes contra o Fies e outras irregularidades".
"Nos preocupa essa flexibilização em relação à revalidação dos títulos", diz Ribeiro, do CFM. "Não somos contra brasileiros e estrangeiros formados no exterior virem para o Brasil, desde que façam testes."
Já parlamentares têm alegado que a medida segue proposta já apresentada pelo Ministério da Educação de mudanças no exame.
Em meio às polêmicas, a criação do Médicos pelo Brasil, foco inicial da medida provisória, tem ficado em segundo plano nos debates no Congresso. Ainda assim, o governo diz que a expectativa é aprovar a medida até novembro deste ano.
Com isso, as primeiras seleções do novo programa seriam realizadas em 2020. A previsão é que ele contemple até 18 mil vagas, a maioria em municípios de difícil acesso e no Norte e Nordeste.
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