Auxiliares do presidente Jair Bolsonaro debatem uma reação ao ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), que em mensagem reservada a interlocutores, comparou o Brasil à Alemanha de Adolf Hitler e disse que bolsonaristas querem a ditadura. Para o grupo mais próximo do presidente, o texto enviado via WhatsApp é motivo para pedir a suspeição do decano no inquérito que investiga as acusações de interferência na Polícia Federal, de acordo com o jornal O Estado de S. Paulo. A investigação, aberta após acusações feitas pelo ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, pode levar ao afastamento de Bolsonaro do cargo.
Assessores jurídicos, no entanto, descartam por ora adotar a estratégia para retirar o decano do caso. O argumento dos defensores do pedido de suspeição é de que a mensagem de Celso de Mello, com ataques ao governo, é semelhante às críticas feitas pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, em reunião ministerial no dia 22 de abril, quando disse que "botava esses vagabundos todos na cadeia, começando no STF".
O ministro Alexandre de Moraes, colega de Celso na Corte, viu na declaração de Weintraub indícios de prática de delitos como difamação, injúria e crime contra a segurança nacional e o convocou para se explicar sobre os comentários sobre integrante do STF. O ministro da Educação, na condição de investigado, ficou em silêncio durante a oitiva na última sexta-feira, 29.
Agora, integrantes do governo querem se valer deste caso para contestar Celso de Mello. Alegam que, seguindo a lógica aplicada a Weintraub, o decano cometeu crime de segurança nacional ao comparar a situação atual do Brasil com a Alemanha de Hitler. Para eles, embora o ministro não tenha escrito isto textualmente, a comparação é o mesmo que chamar Bolsonaro de nazista.
No texto encaminhado no sábado, Celso de Mello escreveu que é "preciso resistir à destruição da ordem democrática" para evitar o que ocorreu na Alemanha quando Hitler impôs o regime nazista. Na mensagem, o decano destacou ainda que a intervenção militar, "pretendida por bolsonaristas e outras lideranças autocráticas que desprezam a liberdade e odeiam a democracia", significa a instauração de "DE UMA DESPREZÍVEL E ABJETA DITADURA MILITAR!!!!", escreveu o decano em letras maiúsculas.
A fala foi rebatida nesta segunda-feira, 1º, pelo ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos. "Comparar o nosso amado Brasil à 'Alemanha de Hitler' nazista é algo, no mínimo, inoportuno e infeliz . A Democracia Brasileira não merece isso. Por favor, respeite o Presidente Bolsonaro e tenha mais amor à nossa Pátria!", escreveu o ministro no Twitter.
Auxiliares do presidente destacam ainda que o decano, a exemplo do ministro da Educação, também falava em caráter reservado e, portanto, a alegação de que se trata de uma "manifestação exclusivamente pessoal"não exime o ministro do STF.
O grupo observa que mensagens de WhatsApp entre Bolsonaro e Moro têm sido usadas como provas no inquérito sobre a suposta interferência na PF, conduzida pelo próprio Celso de Mello. Portanto, a mensagem enviada pelo decano em aplicativo de mensagem também serve como comprovação de sua suspeição para seguir como relator da investigação envolvendo a suposta interferência de Bolsonaro PF.
Dentro do Supremo, ministros consultados pelo Estadão acham que é nula a chance de Celso de Mello ser considerado suspeito caso o presidente Bolsonaro de fato apresente o pedido. Integrantes da Corte, no entanto, admitem terem sido surpreendidos com o tom da mensagem do decano. Houve ministro que achava ser fake news.
A avaliação entre os magistrados é que o texto comparando o governo ao nazismo de Celso de Mello abriu brecha para a contestação de Bolsonaro. Para alguns ministros, o pedido de suspeição seria mais um posicionamento político do governo e uma resposta à militância, uma vez que solicitações como essa costumam ser arquivadas antes mesmo de serem apreciadas no plenário.
Celso de Mello é considerado uma referência na Corte. A onda de ataques ao decano começou após ele ter autorizado a divulgação na íntegra da reunião ministerial do dia 22 de abril e, ao lado de Alexandre de Moraes, passou a ser alvo de bolsonaristas. No último dia 22, também foi atacado ao pedir a opinião da Procuradoria-Geral da República sobre uma notícia-crime da oposição que requisitava, entre outras medidas, a apreensão do celular de Bolsonaro.
O último caso de suspeição levado ao plenário foi do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot. Em 2017, a defesa do então presidente Michel Temer pediu que Janot fosse impedido de atuar nos processos que apuravam se o chefe do Executivo havia cometido crimes. Os nove ministros presentes na sessão votaram pela manutenção do PRG.
Embora a área jurídica do governo não tenha a intenção de levar um pedido de suspeição adiante, a base bolsonarista discute infestar o STF com ações individuais contra o ministro.
Apoiador de Bolsonaro, o advogado Paulo César Rodrigues de Faria ingressou na noite de domingo, 31, com uma notícia-crime contra Celso de Mello por difamação e injúria. Na petição, o advogado solicita a notificação do procurador-geral da República, Augusto Aras, para tomar medidas cabíveis contra o ministro do STF que, segundo o texto, "ofendeu a honra, dignidade e decoro do noticiante e outros 58 milhões de 'bolsonaristas' ao comparar o seu Presidente a Hitler, via de consequência, seus apoiadores como nazistas e membros do Reich."
O advogado, que participa de manifestações pró-governo, ainda cita que Celso de Mello "incorre em provável crime de segurança nacional" por atentar "contra honra do presidente Bolsonaro" e sugere "apuração de suposta disseminação de Fake News".
"Eu sou advogado, conservador, apoio o presidente. Respeito quem pensa o contrário, mas me senti extremamente ofendido com a alusão ao termo nazista utilizado pelo ministro Celso de Mello", disse Faria ao Estadão, afirmando não ter nenhuma relação com o presidente Bolsonaro e integrantes do governo.
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