A flexibilização do uso de máscaras contra a Covid em São Paulo e no Rio de Janeiro, que está em meio a discussões entre políticos, é vista com temor e ressalvas por Denise Garrett, epidemiologista e vice-presidente do Instituto Sabin (EUA).
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou nesta quinta-feira (6) que a decisão sobre a obrigatoriedade do uso de máscaras deve ocorrer nesta quinta (7) durante uma reunião com membros do PEI (Programa Estadual de Imunização), do Comitê Científico e o secretário municipal de Saúde de São Paulo, Edson Aparecido.
"Não sou contra a flexibilização, desde que seja feita da maneira correta, usando os indicadores corretos e na hora correta", diz Garrett. Ela indica que, em algumas ocasiões, o uso da máscara não é necessário, como em lugares abertos em que não há interação com outras pessoas.
Porém, ela diz, é preciso bom senso. Caso a pessoa esteja ao ar livre, porém, aglomerando de alguma forma, a máscara é essencial.
Ela cita como exemplo a rua 25 de Março, do centro de São Paulo. Lá, apesar de o comércio acontecer ao ar livre, há um fluxo intenso de comerciantes e compradores. A mesma recomendação vale para lugares fechados.
"Chega em um ponto da pandemia em que temos que focar naquilo que é essencial", afirma a médica, que avalia que o fundamental, neste momento, é evitar compartilhar o ar com outras pessoas.
A possível flexibilização do uso de máscaras acontece em meio à queda no número de óbitos por Covid-19 e ao avanço na vacinação (veja como está a imunização no Brasil). Nesta quarta-feira (6), o estado de São Paulo superou os Estados Unidos e a Europa ao chegar a 60% da população totalmente vacinada contra o coronavírus.
Garrett diz, no entanto, que é errado avaliar apenas a taxa de cobertura vacinal para discutir o fim da obrigatoriedade no uso das máscaras. Segundo ela, o indicador principal para essa tomada de decisão deve ser a circulação viral, ou seja, o número que resulta em novos casos e, consequentemente, em novos óbitos.
"De certa forma, a taxa de cobertura vacinal influencia na circulação, mas, com as novas variantes, nada é garantia", explica Garrett que cita a situação de Singapura.
O pequeno país, localizado no sudeste asiático, até há pouco era referência no controle de pandemia, com mais de 80% da população totalmente vacinada. A ilha, porém, passou a registrar uma alta de novos casos no final de setembro.
No caso de Singapura, ela analisa que há um problema de controle em decorrência da variante delta. "Trata-se de uma variante muito transmissível", relembra a especialista, que afirma que é preciso analisar a taxa de cobertura vacinal de outra forma.
"Lá, ainda há 20% da população que não está vacinada. Quando a variante encontra esses 20% é a mesma coisa que colocar fogo em uma floresta seca. A variante não vai 'parar de queimar esse galho seco' até que haja uma medida de prevenção", exemplifica.
Por isso, segundo ela, não há como, neste momento da pandemia, estabelecer um número e resolver abolir o uso de máscara quando atingir esse alvo. "Estamos com uma média de 500 mortes por dia. Isso é muita coisa", relembra.
A médica também ressalta que nenhuma dessas decisões que estão sendo tomadas são de nível nacional, mas, sim, estadual, caso das discussões de São Paulo e Rio de Janeiro. Ou ainda municipal, como ocorreu na cidade de Duque de Caxias (RJ), onde desde esta quarta (6) foi abolido o uso obrigatório de máscaras em locais abertos e fechados.
"As bordas são porosas. Não tem como isolar uma cidade ou um estado que tem 90% de vacinação, afinal pessoas de outros estados vão continuar visitando esses lugares."
Além da discussão sobre o uso obrigatório de máscaras, nesta quarta-feira (6) o governo federal eliminou a proibição de voos que tenham origem em Reino Unido, África do Sul e Índia e segue sem incluir a exigência de comprovante de vacinação para ingresso de estrangeiros em território brasileiro.
Hoje, um ano e meio após o início da pandemia, Garrett analisa que é mais eficaz monitorar e acompanhar os turistas que vêm ao Brasil do que proibir voos. "É uma medida facilmente burlável, vimos que os Estados Unidos fecharam as fronteiras para o Brasil e os brasileiros começaram a fazer quarentena no México", diz ela, que é brasileira, mas vive nos EUA.
Ela afirma que, além da necessidade de comprovação de um teste negativo para o vírus na entrada do país, seria necessário acompanhar, fazer rastreamento e impor quarentena àqueles que chegam.
A epidemiologista analisa ainda que é preocupante o governo não exigir a vacinação daqueles que ingressam no Brasil.
"A vacina é uma política de saúde pública. Não existe liberdade individual quando se infringem a liberdade e a saúde de outras pessoas", conclui.
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