O presidente da República, Jair Bolsonaro, prestou depoimento, na noite desta quarta-feira (3), no âmbito do inquérito que investiga suposta tentativa de interferência política do chefe do Executivo da Polícia Federal. Em oitiva realizada no Palácio do Planalto, Bolsonaro disse que "jamais teve qualquer intenção" de interferir na PF quando "pediu" ao ex-ministro Sérgio Moro as mudanças na diretoria-geral e nas superintendências da corporação.
O chefe do Executivo também afirmou que pediu a substituição do delegado Maurício Valeixo - pivô da última crise entre Moro e Bolsonaro - "em razão da falta de interlocução" com o então diretor-geral.
Em diferentes trechos de seu depoimento, Bolsonaro atacou Moro, o ex-aliado que agora pode ser seu concorrente nas eleições 2022.
O presidente repetiu a acusação de que o ex-juiz da Lava Jato teria concordado em colocar o delegado Alexandre Ramagem na chefia da PF "desde que ocorresse após a indicação do ex-Ministro da Justiça à vaga no Supremo Tribunal Federal".
Além disso, afirmou que o ex-ministro estava "administrando a pasta sem pensar no todo, sem alinhamento com os demais ministérios e o Gabinete da Presidência".
Segundo o Estadão, o presidente ainda reclamou de suposto pouco caso do então ministro da Justiça com relação a investigações que eram de seu interesse, entre elas a da facada a Bolsonaro durante a campanha de 2018 e a apuração sobre a citação do nome do presidente no inquérito sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Bolsonaro disse que cobrou de Moro ‘uma investigação mais célere e objetiva’ sobre os casos, mas não ‘observou nenhum empenho do ex-ministro em solucionar o assunto’.
Ao longo da oitiva, Bolsonaro também foi questionado sobre declarações dadas durante a polêmica reunião ministerial do dia 22 de abril, tornada pública no âmbito das investigações do inquérito ‘Moro x Bolsonaro’.
Sobre a afirmação “a PF que não me dá informações”, o presidente disse que ‘se referia a relatórios de inteligência sobre fatos que necessitava para a tomada de decisões’. Já sobre a frase “Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmente, e não consegui!”, Bolsonaro disse que se referia a ‘um pequeno núcleo do GSI sediado no Rio de Janeiro’, responsável por ‘sua segurança pessoal e da sua família’.
No depoimento, como aponta o Estadão, Bolsonaro não só confirmou o pedido para a troca de Valeixo, mas também as solicitações para mudança na superintendência de Pernambuco, em março de 2020, e ainda para troca da chefia da PF no Rio em 2019 – a qual gerou a primeira crise pública entre o chefe do Executivo e o ex-juiz.
Na época, Bolsonaro levantou a possibilidade da unidade fluminense da PF ser chefiada pelo delegado Alexandre Saraiva, que acabou se tornando um desafeto do governo após acusar o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles de patrocinar diretamente interesses de madeireiros.
Em nota, a defesa do ex-ministro Sérgio Moro reagiu ao fato de que não foi comunicada do depoimento, "impedindo seu comparecimento a fim de formular questionamentos pertinentes" (leia a íntegra da nota ao fim da matéria).
O ex-decano Celso de Mello, ao determinar que Bolsonaro prestasse o depoimento presencialmente, havia autorizado os advogados do ex-juiz a formularem perguntas a serem feitas ao chefe do Executivo.
A forma de oitiva do presidente no âmbito da investigação se tornou um impasse no Supremo Tribunal Federal. Bolsonaro recorreu à corte para depor por escrito, depois quis "desistir" da oitiva e, no início de outubro, manifestou "interesse em depoimento mediante comparecimento pessoal", um ano depois do início do impasse que travou as investigações.
Após Bolsonaro informar à corte que iria depor por escrito no inquérito, o ministro Alexandre de Moraes, relator da investigação no STF, determinou, no dia 7 de outubro, que a PF ouvisse o presidente em até 30 dias, mediante "prévio ajuste de local, dia e hora".
O depoimento de Bolsonaro era uma das últimas etapas para a conclusão do inquérito. Assim que for finalizado, o relatório da PF será enviado à Procuradoria-Geral da República, a quem cabe decidir se há provas suficientes para a apresentação de uma denúncia contra o presidente.
“A Defesa do ex-ministro Sérgio Moro foi surpreendida pela notícia de que o presidente da República, investigado no Inquérito 4831, prestou depoimento à autoridade policial sem que a defesa do ex-ministro fosse intimada e comunicada previamente, impedindo seu comparecimento a fim de formular questionamentos pertinentes, nos moldes do que ocorreu por ocasião do depoimento prestado pelo ex-ministro em maio do ano passado. A adoção de procedimento diverso para os dois coinvestigados não se justifica, tendo em vista a necessária isonomia entre os depoentes”.
Rodrigo Sánchez Rios. Advogado do ex-ministro Sergio Moro
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