O presidente Jair Bolsonaro voltou a falar nesta quinta-feira (23) sobre a possibilidade de o Ministério da Segurança Pública ser recriado. Se isso ocorrer, segundo ele, o ministro Sergio Moro permanecerá à frente da pasta da Justiça e perderá a sua principal bandeira até aqui: a queda nas taxas de homicídios, tendência iniciada ainda na gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB).
"Se for criado, aí ele fica na Justiça. É o que era inicialmente. Tanto é que, quando ele foi convidado, não existia ainda essa modulação de fundir com o Ministério da Segurança", afirmou Bolsonaro, ao deixar o Palácio da Alvorada antes de embarcar para a Índia.
A declaração foi feita um dia depois de um o presidente ter dito em encontro com secretários de segurança pública que vai estudar reformular a estrutura ministerial.
"É comum receber demanda de toda a sociedade. E ontem [quarta-feira] eles pediram para mim a possibilidade de recriar o Ministério da Segurança. Isso é estudado. Estudado com o Moro. Lógico que o Moro deve ser contra, mas estudado com os demais ministros."
"O Rodrigo Maia [presidente da Câmara] é favorável à criação da Segurança. Acredito que a Comissão de Segurança Pública [da Câmara] trabalhou no passado, também seja favorável. Temos que ver como se comporta esse setor da sociedade para melhor decidir", disse.
Se o Ministério da Segurança for recriado, a pasta hoje comandada por Moro sofrerá novo esvaziamento. Desde que assumiu o cargo, em janeiro de 2019, o ex-juiz da Lava Jato já viu seu poder ser reduzido quando perdeu o antigo Coaf, rebatizado de UIF e subordinado atualmente ao Banco Central.
Moro poderá perder ainda a Polícia Federal, que responde administrativamente à Justiça. No desenho anterior do Ministério da Segurança, na gestão de Michel Temer, o órgão passou a ser vinculado à pasta.
Então juiz da 13ª Vara Criminal da Justiça Federal em Curitiba, Moro foi convidado por Bolsonaro logo após sua vitória. Ele chegou ao governo com a promessa de que assumiria um "superministério" com a missão de reforçar o combate à corrupção.
Após pouco mais de um ano no Palácio do Planalto, Bolsonaro ainda não tirou do papel mais da metade das promessas que fez para reduzir a violência e a criminalidade no país.
A segurança pública foi a grande aposta da campanha bolsonarista e é um de seus trunfos para alavancar uma reeleição em 2022. Até agora, no entanto, só foram cumpridas 4 das 18 metas para a área anunciadas por Bolsonaro. Outras três começam a ser postas em prática.
Continuam na gaveta propostas como acabar com as audiências de custódia (que garantem o encontro entre a pessoa presa e um juiz em até 24 horas); reduzir a maioridade penal para 16 anos; construir presídios; tipificar ações do MST como terrorismo; usar as Forças Armadas contra o crime organizado; e gravar no Panteão da Pátria e da Liberdade, em Brasília, o nome de policiais mortos.
Outras metas estão travadas no Congresso, como diminuir de 25 para 21 anos a idade mínima para obter acesso a armas. Por enquanto, os parlamentares só permitiram a aquisição de armamento mais cedo em área rural.
Outra pauta emperrada é a do excludente de ilicitude para policiais, que apareceu no pacote anticrime, apresentado pelo ministro da Justiça, Sergio Moro. O trecho que isentava policiais que matassem em serviço de responder à Justiça em caso de "medo ou violenta emoção" foi retirado pelos deputados antes de o projeto ser aprovado no Congresso sem as principais bandeiras bolsonaristas.
A atual gestão tem destacado a aceleração na tendência de queda no índice de homicídios nos primeiros oito meses do ano. Dados preliminares do governo indicam que a redução está na casa de 20%.
Se confirmados esses dados quando houver consolidação das ocorrências no ano, isso significa que deixaram de ser mortas 7.000 pessoas em comparação com 2018. Caíram também latrocínios, roubos de carga, veículos e a banco. Os índices têm sido comemorados por Moro como mérito da gestão bolsonarista.
Polícia Federal - Bolsonaro anunciou que Ricardo Saadi seria substituído por Alexandre Silva Saraiva na Superintendência da PF no RJ. A direção da PF, contudo, havia escolhido o delegado Carlos Henrique Oliveira Sousa, da Superintendência de Pernambuco.
O anúncio de Bolsonaro foi malvisto pela corporação como uma interferência do presidente em assuntos internos. Desde então, Bolsonaro deu diversas declarações reforçando a intenção de intervir na Polícia Federal. Também alfinetou Moro ao afirmar que cabe a ele, e não ao ministro, fazer nomeações no órgão.
Mensagens da Lava Jato - Mensagens obtidas pelo site The Intercept Brasil e publicadas por diversos veículos revelam que Moro, enquanto juiz da Lava Jato, aconselhou e colaborou com a Procuradoria. Segundo a lei, contudo, um magistrado deve se manter imparcial diante das partes de um processo.
Confiança de Bolsonaro - Após a divulgação das primeiras mensagens, em junho, Bolsonaro deu declarações de apoio ao ministro, mas também disse que não existe 100% de confiança.
Destruição de provas - Logo que a Polícia Federal prendeu quatro suspeitos de hackear autoridades e captar suas mensagens no aplicativo Telegram, Moro disse que o material apreendido seria destruído. Tanto a PF quanto Bolsonaro afirmaram que essa decisão não cabia ao ministro -essa competência é da Justiça.
STF - Bolsonaro havia afirmado que prometeu a Moro uma vaga no STF ao convidá-lo para assumir o ministério da Justiça. Depois, voltou atrás e afirmou que não houve combinado. O presidente também tem afirmado que pretende indicar alguém "terrivelmente evangélico" para uma das duas vagas que devem ser abertas até 2022 e deu a entender que pode nomear o atual ministro da Advocacia-Geral da União, André Luiz Mendonça.
?Perda do Coaf - Criado em 1998, o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) é um órgão de inteligência financeira que investiga operações suspeitas. Ao assumir a Presidência, Bolsonaro tirou o Coaf do Ministério da Economia (antiga Fazenda) e o colocou na pasta de Moro, a Justiça.
O ex-juiz acabou derrotado depois que o Congresso devolveu o Coaf à Economia (sob Paulo Guedes) ao analisar a MP da reforma administrativa do governo federal.
Agora, o Coaf, que passa a se chamar UIF (Unidade de Inteligência Financeira), foi transferido para o Banco Central. O chefe do órgão e aliado de Moro, Roberto Leonel, foi substituído por Ricardo Liáo, funcionário de carreira do BC.
Decreto das armas - Seu primeiro revés foi ainda em janeiro. O ministro tentou se desvincular da autoria da ideia de flexibilizar a posse de armas, dizendo nos bastidores estar apenas cumprindo ordens do presidente. Teve sua sugestão ignorada de limitar o registro por pessoa a duas armas ?o decreto fixou o número em quatro.
Laranjas - No caso do escândalo de candidaturas de laranjas, enquanto Moro deu declarações evasivas, dizendo que a PF iria investigar se "houvesse necessidade" e que não sabia se havia consistência nas denúncias, Bolsonaro determinou dias depois, de forma enfática, a abertura de investigações para apurar o esquema.
Ilona Szabó - Moro teve de demitir a especialista em segurança pública por determinação do presidente, após repercussão negativa da nomeação. Ilona Szabó já se disse contrária ao afrouxamento das regras de acesso a armas e criticou a ideia de ampliação do direito à legítima defesa que está no projeto do ministro. Até hoje, Moro não nomeou um substituto.
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