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Bolsonaro quer ampliar uso da cloroquina contra Covid-19

Bolsonaro quer ampliar uso da cloroquina contra Covid-19

Nesta quarta-feira (13), o Presidente se disse "preocupado com o elevado número de mortes" e que conversaria com o ministro Nelson Teich sobre a substância

Publicado em 13 de maio de 2020 às 16:07

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Jair Bolsonaro
Presidente da República Jair Bolsonaro. (Marcos Correa/PR)

Após um dos maiores estudos feitos até o momento ter apontado que a hidroxicloroquina não reduziu a mortalidade de pessoas com Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse que quer ampliar o uso do medicamento, indicando-o também para casos leves da doença.

Nesta quarta-feira (13), ao sair do Palácio da Alvorada, Bolsonaro se disse "preocupado com o elevado número de mortes" e que conversaria com o ministro Nelson Teich (Saúde) para que a cloroquina fosse usada desde o estágio inicial da doença.

"Não é o meu entendimento, que eu não sou médico. É o entendimento de muitos médicos do Brasil e outras entidades de outros países [que entendem] que a cloroquina pode e deve ser usada desde o início, apesar de saberem que não tem uma confirmação científica da sua eficácia.", disse Bolsonaro.

O presidente disse que usaria o remédio em sua mãe, de 93 anos, mesmo sem qualquer comprovação científica.

"Lógico que não vou forçar o médico, tem muitos médicos que concordam com este tipo de medicamento, e ela usaria a hidroxicloroquina enquanto não tivermos algo comprovado no mundo, temos este no Brasil aqui, que pode dar certo, pode não dar certo. Mas como a pessoa não pode esperar quatro, cinco dias para decidir, que a morte pode vir, é melhor usar", afirmou Bolsonaro.

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Na terça-feira (12), Teich escreveu em uma rede social que, segundo o Ministério da Saúde, "a cloroquina pode ser prescrita para pacientes hospitalizados" e que o Conselho Federal de Medicina "entendeu a excepcionalidade em que vivemos e possibilitou o uso em outras situações".

"Um alerta importante: a cloroquina é um medicamento com efeitos colaterais. Então, qualquer prescrição deve ser feita com base em avaliação médica. O paciente deve entender os riscos e assinar o 'Termo de Consentimento' antes de iniciar o uso da cloroquina", escreveu Teich em sua rede social.

O ministro chegou ao posto em substituição a Henrique Mandetta, que discordava de posicionamentos de Bolsonaro, e também tem mostrado divergências com Bolsonaro.

Teich, por exemplo, não tem defendido o fim do distanciamento social e se mostrou surpreso com a edição de um decreto presidencial liberando o funcionamento de academias, barbearias e salões de beleza.

Questionado sobre a falta de sintonia, Bolsonaro disse: "Todos os ministros têm que estar afinados comigo". O presidente afirmou que "quem ficar em casa parado vai morrer de fome", que "não podemos ficar hibernando em casa" e que é preciso "parar com esta babaquice".

"Quem não quiser trabalhar fica em casa, porra!", bradou o presidente.

Bolsonaro voltou a criticar o médico infectologista David Uip, coordenador do Comitê de Contingenciamento para Emergências para a Covid-19 do governo de São Paulo por ter se negado a responder se usou o remédio usou para se tratar doença.

"Este é o caráter do cara que está ao lado do [governador de São Paulo, João] Doria", disse Bolsonaro.

Diversas pesquisas publicadas recentemente não têm mostrado bons efeitos da cloroquina.

Um dos maiores estudos feitos até agora não encontrou redução de mortalidade por Covid-19 entre pessoas que foram medicadas com hidroxicloroquina. A pesquisa com 1.438 pacientes foi publicada na segunda (11) na revista Jama (Journal of the American Medical Association), um dos principais periódicos médicos do mundo.

Na última semana, outra grande pesquisa, com 1.376 pacientes de Nova York, publicada no The New England Journal of Medicine, outro respeitado periódico científico, também apontou que não foram encontradas evidências de que o uso da hidroxicloroquina influencia na redução de mortes ou nas intubações.

Os pesquisadores usaram dados de pacientes com confirmação de Covid-19 que foram internados em 25 hospitais da área metropolitana Nova York entre 15 e 28 de março. Eles tiveram acesso também a informações sobre demografia, doenças preexistentes, sinais vitais e exames de imagem de tórax, ou seja, dados que ajudam os cientistas a identificar elementos que pudessem influenciar no resultado.

Com os pacientes selecionados, os pesquisadores os dividiram em quatro grupos de tratamento: um deles que recebeu hidroxicloroquina e azitromicina; outro que tomou só hidroxicloroquina; um com terapia só com azitromicina; e, finalmente, um quarto que não foi medicado com nenhuma dessas drogas.

Foram analisados 735 pessoas que receberam hidroxicloroquina e azitromicina (dos quais quase metade iniciou o uso das drogas antes ou de modo concomitante ao uso de ventilação mecânica), 271 só hidroxicloroquina, 211 só azitromicina e 221 nenhuma dessas drogas.

Os dados dos pacientes foram acompanhados até 24 de abril, data na qual 45 pessoas ainda estavam hospitalizadas.

Com essas informações em mãos, os cientistas analisaram a mortalidade dos pacientes. Cerca de 25,7% das pessoas que foram medicadas com a associação de hidroxicloroquina e azitromicina morreram, assim como 19,9% das que tomaram só hidroxicloroquina, 10% das que foram submetidas a tratamento só com azitromicina e 12,7% das que não tomaram nenhuma dessas drogas.

Mesmo com as aparentes diferenças de mortalidade, ao fazer ajustes para equilibrar a análise (levando em conta elementos como gravidade da doença e condições de saúde preexistentes), os pesquisadores concluíram que os resultados foram similares entre os grupos, ou seja, não foram encontradas diferenças significativas de mortalidade entre quem tomou as drogas e quem não as recebeu.

O estudo americano também analisou eventos cardíacos, um ponto que preocupa em relação ao uso da hidroxicloroquina e sua associação com a azitromicina.

Segundo os pesquisadores, foram documentadas anormalidades em eletrocardiogramas, principalmente arritmia, em todos os grupos, mas eles foram mais comuns nos pacientes que receberam a associação de hidroxicloroquina e azitromicina, e só hidroxicloroquina. Os cientistas afirmam, porém, que as diferenças entre os grupos não foram significativas.

Mas os cientistas observaram uma maior frequência de paradas cardíacas nos pacientes que tomaram a combinação de hidroxicloroquina e azitromicina.

No fim de abril, o Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (Niaid, na sigla em inglês), dos EUA, contraindicou o uso da associação de hidroxicloroquina e azitromicina para tratamento da Covid-19 fora de ensaios clínicos.

O Niaid afirma que o uso de hidroxicloroquina e azitromicina é desencorajado por sua potencial toxicidade. Com relação somente à hidroxicloroquina e à cloroquina, o Niaid afirma que ainda não há dados suficientes para uma indicação a favor ou contra as drogas no tratamento da Covid-19. O documento alerta, contudo, que o uso deve ser acompanhado de monitoramento dos efeitos adversos, considerando o risco de alterações cardíacas e mal súbito.

"É preciso muita cautela para que um medicamento sem eficácia comprovada contra a Covid-19 não cause mais danos ao paciente do que a doença", afirma Leonardo Weissmann, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia e infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas.

Considerando os estudos recentes sobre a hidroxicloroquina, Weissmann diz que está se demonstrando que a droga não traz benefícios aos pacientes.

"É uma situação bastante grave que estamos vivendo neste momento. Com isso, tenta-se uma solução rápida e imediata para o problema, mas é preciso muito cuidado. Até o momento, não há qualquer estudo realizado com metodologia científica adequada, que demonstre evidências robustas de eficácia e segurança em algum medicamento para cura da Covid-19."

O estudo publicado no Jama, porém, não traz a melhor evidência científica possível. Trata-se de uma pesquisa observacional, ou seja, olha para os dados de pacientes que foram tratados. As melhores evidências devem estar disponíveis em breve, quando forem publicados estudos de intervenção randomizados, duplo-cegos (quando o paciente não sabe o que está tomando e o médico não sabe o que está oferecendo) e com grupo controle.

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