Sob pressão de aliados descontentes, o presidente Jair Bolsonaro deu sequência às articulações pela aprovação do desembargador federal Kassio Nunes Marques, indicado por ele como ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Bolsonaro rechaçou a insatisfação dos conservadores preteridos pela governabilidade. O presidente voltou a defender no domingo (4) o currículo do advogado piauiense, nome celebrado por ícones do Centrão, e alvo de um tiroteio vindo de segmentos evangélicos e olavistas, e que desapontou militares e empresários liberais.
Apesar do desgaste, o Palácio do Planalto busca agora apoio ao indicado no Congresso, enquanto o desembargador deverá iniciar o "beija-mão" dos senadores. Kassio Nunes deve começar a se reunir com alguns senadores em grupo. Uma das articuladoras é Katia Abreu (PP-TO). A primeira ideia é buscar os líderes de bancada e partidos. "Para otimizar a tarefa vamos tentar algumas pequenas reuniões. Muitos querem ajudar. Não sou a única. Ele é carismático", elogiou a senadora, que já esteve com o desembargador, em recepção de Eduardo Braga (MDB-AM), potencial relator do processo de indicação.
No sábado (3), Bolsonaro participou de uma "confraternização" fora da agenda com o escolhido. A noite de pizza e futebol teve a presença do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que deve marcar agora a sabatina de Kassio Nunes. A data ainda é incerta, mas deve ser agendada por Alcolumbre tão logo o decano Celso de Mello se despeça do STF, em 13 de outubro.
Alcolumbre deve se reunir com líderes para definir o calendário na próxima terça-feira (6). Mas o desembargador pode agilizar as conversas de apresentação nos bastidores. Ele tem trânsito no Senado. Sua mulher, Maria do Socorro Marques, foi funcionária de confiança de senadores piauienses do PT e de partidos do Centrão. Na semana passada, passou a assessorar o senador Luiz Carlos Heinze (PP-RS).
O anfitrião do encontro de sábado à noite foi o ministro Dias Toffoli, último presidente do Supremo, e um dos integrantes da Corte mais auscultados por Bolsonaro, ao lado de Gilmar Mendes. A deferência na comunicação prévia à dupla sobre a intenção de indicar Kassio Nunes provocou insatisfação do atual presidente da Corte, ministro Luiz Fux, que ao tomar posse sinalizou um desejo de mais distanciamento político do Planalto. Bolsonaro ignorou o incômodo. O presidente demonstrou compartilhar da intimidade do indicado, com quem já disse "ter tomado muita tubaína", no convescote de sábado à noite.
Presentes ao encontro negaram que tenham tratado de assuntos de trabalho na reunião. Eles assistiram à vitória do Palmeiras sobre o Ceará por 2 a 1, em partida válida pelo Campeonato Brasileiro.
O ex-ministro da Defesa e da Segurança Pública Raul Jungmann foi outro convidado. O quarteto vibrou cada gol do jogo, em um volume que até chamou a atenção dos vizinhos. Houve até gritos de "Fora, Bolsonaro" nas casas do Lago Norte, bairro nobre de Brasília. Bolsonaro deixou a residência após o fim do jogo. E Toffoli subiu o som do ambiente rock n'roll até a despedida de Kassio Nunes, uma hora depois de Bolsonaro.
A festividade motivou ainda mais questionamentos por parte dos eleitores. E Bolsonaro tratou de responder diretamente a eles nas redes sociais. "Preciso governar. Converso com todos em Brasília", justificou Bolsonaro, ao ser confrontado com imagens que registraram abraços em Toffoli.
Um dos mais indignados é o pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Ele promete continuar hoje a série de vídeos em campanha contra Kassio Nunes. O pastor cobra que o presidente mostre se o desembargador é "terrivelmente de direita" e o associa ao PT, mesmo tom da ala ideológica e do escritor Olavo de Carvalho. "Lamento muito a escolha errada, por não ser um cara terrivelmente de direita. Sou aliado, mas não sou vaquinha de presépio. Bolsonaro está indignado porque o pau em cima dele está violento nas redes sociais", disse Malafaia ao Estadão, depois de Bolsonaro reclamar da "covardia" do religioso e acusá-lo, sem citar seu nome, de querer emplacar "a qualquer custo" um aliado no STF.
Depois de reconhecer que pode perder votos com as ameaças de desembarque de apoiadores, Bolsonaro saiu em defesa do histórico de Kassio Nunes pela segunda vez desde sua indicação formal. No Facebook, argumentou que o desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região não votou contra a deportação do terrorista italiano Cesare Battisti. Um voto dele em recurso do caso tem sido um dos principais pontos usados por militantes de direita.
"O desembargador Kassio participou de julgamento que tratou exclusivamente de matéria processual e não emitiu nenhuma opinião ou voto sobre a extradição. A apelação no TRF1 nunca chegou a ser julgada em razão de decisão posterior do STF. Portanto, é mentira que Kassio Nunes teria votado concordando que Battisti permanecesse no Brasil", enfatizou Bolsonaro, na rede social.
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