A mais recente crise política com o ministro da Justiça, Sergio Moro, levou Jair Bolsonaro a colocar novamente o ex-juiz da Lava Jato como seu preferido para substituir o ministro Celso de Mello no STF (Supremo Tribunal Federal).
O decano se aposentará em novembro, abrindo espaço para o presidente emplacar seu primeiro nome na corte.
Aliados de Bolsonaro veem no gesto de indicar Moro um movimento para blindar um cenário em que ele pode surgir como seu adversário na disputa presidencial de 2022.
Segundo relatos feitos à reportagem, o ministro tratou da possibilidade de ir para o STF em conversa com o presidente após a polêmica sobre a recriação do Ministério da Segurança Pública, hoje integrado à pasta da Justiça.
O diálogo reservado foi apelidado por integrantes da equipe de Moro como uma "DR", uma discussão da relação.
A indicação para o Supremo também abriria espaço para que o chefe do Executivo tenha mais ingerência no Ministério da Justiça, algo que ele vem buscando desde o começo do governo.
Um dos pontos sensíveis é a Polícia Federal. A saída de Moro pavimentaria o caminho para Bolsonaro mexer no seu comando, desejo já sinalizado por ele no ano passado.
Em julho de 2019, em aceno à bancada evangélica, o presidente havia definido que escolheria para o Supremo um jurista com respaldo da comunidade religiosa.
"Poderei indicar dois ministros para o Supremo Tribunal Federal. Um deles será terrivelmente evangélico", disse.
O ministro da AGU (Advocacia Geral da União), André Mendonça, surgiu então como primeira opção, tendo sido citado pelo próprio Bolsonaro.
Nos bastidores, no entanto, o presidente passou agora a cogitá-lo para a segunda cadeira a ficar no vaga no STF, a do ministro Marco Aurélio Mello, que tem aposentadoria prevista para 2021.
Para essa posição também está na lista de possibilidades o ministro da Secretaria-Geral, Jorge Oliveira, que vem ganhando prestígio junto ao presidente.
Bolsonaro chegou a dizer que havia reservado uma das vagas a Moro, que deixou a magistratura para se tornar ministro do governo.
O presidente, porém, depois negou haver qualquer acordo e disse apenas buscar alguém com o perfil do ex-juiz.
Segundo assessores, a nova mudança de entendimento, a favor de uma indicação já neste ano, se deu após o mal-estar surgido com a intenção do presidente de desmembrar a pasta da Justiça, criando um ministério separado para a Segurança Pública.
Bolsonaro articulou uma reunião com secretários estaduais de Segurança sem a presença do ministro, que tem usado a segurança como uma das suas bandeiras de gestão.
Naquele momento, Moro disse a aliados que, se a manobra ocorresse, deixaria o governo. O atrito provocou reação forte de apoiadores do ex-juiz, que passaram a pressionar o presidente nas redes sociais.
Bolsonaro recuou e disse que, por enquanto, a possibilidade de dividir a pasta está engavetada.
Se antes pretendia segurar Moro no governo pela hipótese de tê-lo como candidato a vice em 2022, agora o presidente considera que a indicação ao STF é uma maneira de evitar que ele se torne um adversário nas urnas. Ao mesmo tempo, é uma estratégia para ganhar mais autonomia sobre seu próprio governo.
Com popularidade maior que a de Bolsonaro, como apontou pesquisa Datafolha do fim de 2019, Moro ganhou no Palácio do Planalto o apelido de "ministro indemissível" e se tornou, na avaliação de auxiliares do governo, um contraponto ao presidente na Esplanada.
Então juiz da 13ª Vara Criminal da Justiça Federal em Curitiba e responsável pela Operação Lava Jato, Moro foi convidado para o cargo por Bolsonaro logo após a vitória na eleição de 2018. Chegou ao governo com a promessa de que assumiria um "superministério" e a missão de reforçar o combate à corrupção e ao crime organizado.
No início da semana, em entrevista ao programa Pânico, da rádio Jovem Pan, o ministro mandou um sinal ao Planalto ao se referir a uma eventual indicação ao STF como uma "perspectiva interessante".
"Venho da magistratura, seria algo interessante. Mas a escolha evidentemente cabe ao presidente da República. Ele tem a possibilidade de me indicar, pode indicar outras pessoas", disse Moro na entrevista.
Além de evitar o risco de Moro se tornar um oponente de Bolsonaro na próxima disputa presidencial, a indicação ao STF evita que o presidente entre novamente em conflito com o ministro, por causa do comando da PF.
O presidente pretende colocar à frente da força policial o atual diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), Alexandre Ramagem. Delegado da PF, ele atuou na segurança de Bolsonaro logo após as eleições de 2018 e se tornou seu amigo.
O nome preferido de Bolsonaro, no entanto, não tem o apoio de Moro, que defende a permanência de Maurício Valeixo ou a escolha do diretor-geral do Depen (Departamento Penitenciário Nacional), Fabiano Bordignon.
O presidente, que pretendia fazer a troca já em fevereiro, deve segurá-la para o final do ano, às vésperas da escolha do nome para o STF.
A possível indicação de Moro ao Supremo tem a simpatia do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e conta com o apoio da ala lavajatista do Senado, onde os indicados para o STF são sabatinados.
No entanto, enfrenta resistência de um grupo de parlamentares com processos em andamento.
Para eles, o ingresso de Moro no Supremo pode mudar o equilíbrio de forças na corte, prejudicando-os.
Também há questionamentos em razão de conversas vazadas entre Moro e o procurador da Lava Jato Deltan Dallagnol. Os diálogos indicam que Moro, enquanto juiz, orientou o trabalho da Procuradoria, o que é barrado pela lei.
O receio da articulação política do Planalto é que uma indicação do ministro tenha reação imediata no Legislativo, com ameaça de travamento da pauta do governo.
Alguns senadores têm propostas para alterar o critério de escolha dos integrantes do STF. Mas a presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Simone Tebet (MDB-MS) já sinalizou que não vai pautar nenhum texto que altere as regras do jogo imediatamente.
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