Após a derrota de seu candidato no primeiro turno da eleição para a Prefeitura de São Paulo, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ganhou espaço nesta quarta-feira (18) em falas de Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (PSOL), que disputam o segundo turno.
O tucano, que busca a reeleição, tentou se desvincular do presidente após receber apoio de Celso Russomanno (Republicanos), que teve Bolsonaro como garoto-propaganda e terminou em quarto lugar. O titular do Planalto é adversário do governador João Doria (PSDB), avalista de Covas.
O líder de movimentos de moradia, por sua vez, usou a aliança para atacar o rival, dizendo que a parceria entre Covas e Russomanno é uma repetição da dobradinha "BolsoDoria", usada pelo governador na eleição estadual de 2018.
Ao mesmo tempo que ataca o aliado do tucano, Boulos vem sendo questionado por apoios que conquistou, sobretudo o do ex-presidente Lula (PT). Nesta quarta, sua campanha também recebeu as adesões do PDT e da Rede.
Em ato no Jardim Ângela (zona sul), Covas reagiu às críticas de que estaria se aproximando de Bolsonaro. Nos últimos dias, fotos dele ao lado do presidente circularam em redes sociais difundidas por apoiadores de Boulos.
As imagens têm sido usadas para desconstruir a imagem de moderado que Covas busca vender. Já a campanha do PSDB tenta colar no candidato do PSOL a pecha de radical.
"Não sou biruta de aeroporto para mudar conforme a orientação de vento", disse o tucano. "Sou o mesmo Bruno fora da campanha, no primeiro turno, no segundo. Anulei meu voto na eleição presidencial."
Covas afirmou ter se posicionado contra ações do presidente em vários momentos, como quando disse que vetaria mudanças em livros didáticos que significassem revisionismo da ditadura militar no Brasil (1964-1985).
Russomanno --que fez duras críticas à gestão Covas na campanha e chegou a fazer insinuações sobre a saúde do prefeito, que tem câncer-- chegou a ser cogitado para a vaga de vice do tucano, mas decidiu lançar candidatura após incentivo de Bolsonaro.
"O apoio do Russomanno ajuda, não há a menor dúvida. Dele e do Republicanos. Ele teve 10% dos votos", disse Covas, negando desconforto.
O tucano também se envolveu em uma discussão no Twitter com o youtuber Felipe Neto, na terça (17), para rechaçar o rótulo de bolsonarista sugerido pelo influenciador.
"Admiro seu trabalho, mas acho que você não conhece minha trajetória. Não votei no Bolsonaro. Convido você a conhecer meu programa de governo", escreveu o prefeito.
Felipe Neto, que mora no Rio de Janeiro e declarou apoio a Boulos, rebateu: "Pra cima de mim, Covas? Você e Doria podem dar as mãos e desaparecer da política".
Boulos, em caminhada no centro, disse que a adesão de Russomanno à campanha do PSDB "não foi nenhuma surpresa". Opositor do governo federal, ele tem repetido a narrativa de que a derrota do bolsonarismo começará por São Paulo, com sua vitória.
"É o BolsoDoria versão 2020. Essa aliança, em que estavam um pouco separados por projetos eleitorais e questões pessoais, se refez. O Bruno Covas é o João Doria, e o Russomanno é o Bolsonaro", discursou. "Os dois lados se merecem."
Ele estava acompanhado de dois candidatos derrotados no primeiro turno que agora o apoiam, Jilmar Tatto (PT) e Orlando Silva (PC do B).
O PSOL, que trabalha pela formação de uma frente de esquerda, obteve a declaração de apoio dos diretórios municipais do PDT, partido que compôs a coligação de Márcio França (PSB), e da Rede, que concorreu com Marina Helou.
O presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, selou a parceria com o PDT em encontro na capital com Antonio Neto, que foi vice de França.
O representante do PSB deve anunciar nesta quinta (19) seu posicionamento. A direção nacional da legenda impõe obstáculos à dobradinha com Boulos, mas o deixou livre para resolver. França disse à reportagem que só se decidirá após ouvir os dirigentes e governadores da sigla.
A adesão de mais líderes nacionais também é esperada. O ex-presidenciável Ciro Gomes (PDT) já disse que apoia Boulos, mas aguarda um posicionamento do PSB, do qual é aliado, para oficializar o embarque. A ex-presidenciável Marina Silva (Rede) endossou nas redes sociais o apoio de seu partido ao psolista.
A estratégia do PSOL é dar peso semelhante a todos os endossos, para evitar que Boulos seja prejudicado eleitoralmente por algum apoiador, sobretudo Lula. A campanha do PSDB já usou sua amizade com o ex-presidente para desgastá-lo e sugerir que o PT voltará ao poder caso ele vença.
"Eu não escondo nenhum tipo de apoiador, nenhum tipo de aliado", disse Boulos em sabatina do jornal O Estado de S. Paulo. Segundo pesquisa Datafolha de outubro, 54% dos paulistanos disseram não votar em um candidato apoiado pelo petista.
Boulos fez críticas ao governo Lula, mas os dois se aproximaram sobretudo nas mobilizações contra a prisão do ex-presidente, em 2018.
Lula encorajou o partido a tentar convencer Tatto a abrir mão de sua candidatura em favor de Boulos, que aparecia mais competitivo. No domingo (15), ele responsabilizou Tatto pela decisão de manter a candidatura, o que foi visto como gesto de ingratidão.
Com o PDT entre os participantes da frente, Boulos terá que engolir críticas que fez ao líder mais expressivo da legenda. Após a eleição de 2018, derrotado nas urnas, Ciro viajou para a Europa e não fez campanha para Fernando Haddad (PT) contra Bolsonaro.
"Não existe neutralidade diante do horror. Neutralidade diante do horror é cumplicidade", disse Boulos à época.
O eventual apoio de França também tem potencial para causar saia-justa, já que, ao longo do primeiro turno, o representante do PSOL buscou pintar o ex-governador como alguém de direita, lembrando o fato de ele ter sido vice de Geraldo Alckmin (PSDB) no Palácio dos Bandeirantes.
Outro apoio que pode trazer problemas está na coligação com o PCB (Partido Comunista Brasileiro) e UP (Unidade Popular). Ele vem tentando desconstruir a imagem de extremista, mas as agremiações aliadas se assumem como radicais e defendem pautas de uma revolução socialista.
Do lado de Covas, o cabo eleitoral mais incômodo é Doria. O candidato à reeleição só virou prefeito porque entrou em uma chapa como vice de Doria, que, pouco mais de um ano depois, renunciou ao cargo para tentar ser governador.
Segundo pesquisa Datafolha, 39% dos paulistanos rejeitam o governador. Por isso, Covas escondeu o padrinho político no primeiro turno.
Adversários se aproveitaram disso e tentaram, em debates e entrevistas, associar as figuras, com direito a chamar o candidato de "Bruno Doria".
Covas se defendia dizendo que Doria não poderia largar a funções de governador para entrar na campanha. Sua equipe afirmava ainda que a imagem dos dois já é suficientemente ligada, com o prefeito participando de entrevistas coletivas todas as semanas na sede do governo.
Em resposta às críticas por ter escondido o padrinho, entretanto, Covas fez o primeiro discurso após o resultado de domingo ao lado de Doria.
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