BRASÍLIA - A previsão na cúpula da Câmara é que a Casa não demore a votar o projeto que acaba com saídas temporárias de presos em datas comemorativas, as chamadas saidinhas. O texto foi aprovado pelo Senado na terça-feira (20) com ampla maioria e a expectativa é que tenha adesão similar entre os deputados.
Caso a previsão se confirme, a matéria seguirá para sanção do presidente Lula (PT). No governo, o tema deve dividir auxiliares próximos do mandatário. Por um lado, a ala política defende que a medida seja sancionada integralmente por considerar que um eventual veto seria derrubado e ainda acirraria o clima com o Congresso.
Por outro, porém, há uma tendência de que o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, que chefia a pasta responsável pelos presídios federais, recomende o veto.
Além disso, ministros mais ligados à esquerda também pressionam para que Lula não ceda à pressão da ala conservadora do Parlamento e mantenha uma coerência com o discurso progressista sobre a necessidade de implementação de medidas de ressocialização de presos.
Outro fator mencionado por integrantes da pasta de Lewandowski diz respeito às consequências de uma eventual restrição ampla às saidinhas. O temor é que a medida gere uma revolta nos presídios e cause, depois, uma crise ainda maior para o governo.
No STF (Supremo Tribunal Federal), por sua vez, os ministros observam o debate com atenção. Pessoas próximas a três ministros, ouvidas sob reserva pela reportagem, apostam que a corte não deverá se meter no tema por se tratar de uma pauta impopular e de competência do Legislativo.
No entanto, não é descartado o cenário em que uma ação chegue ao tribunal e um magistrado dê uma decisão liminar (provisória), forçando a discussão sobre o assunto no plenário.
As avaliações do governo e do Supremo sobre o tema, no entanto, ainda dependerão do texto que será aprovado pela Câmara.
Os deputados aprovaram em 2022 um texto que extingue totalmente as saidinhas. O Senado, porém, suavizou o texto para conquistar voto da maioria e restringiu a liberação de presos em massa em datas comemorativas, mas manteve a previsão para detentos em regime semiaberto estudarem.
A Câmara, agora, negocia se aprova o projeto com a redação original da Casa ou se acata as mudanças do Senado.
Outro debate que a eventual sanção do fim das saidinhas deve gerar diz respeito ao alcance da medida. Uma ala de juristas defende que a restrição não deve valer para todos os presos, mas apenas para quem for condenado a partir da validade da lei.
O argumento é que a lei determina que uma legislação não pode ter efeito retroativo em casos em que o réu é prejudicado.
Por outro lado, no entanto, há a tese de que se trata de uma mudança na Lei de Execução Penal, que não está abrangida pela regra sobre os efeitos retroativos de novas normas.
Especialistas em direito afirmam que essa avaliação deverá ser feita por cada juiz que se deparar com um processo desta natureza, caso o STF evite julgar o assunto e não defina o alcance da nova lei.
O tema ganhou força no Senado e mobilizou setores da classe política após a morte do sargento da Polícia Militar Roger Dias da Cunha, 29 anos, baleado durante uma perseguição por um homem que estava em saída temporária em Belo Horizonte.
Outro caso que gerou repercussão foi a fuga de dois dos condenados por chefiar a maior facção de tráfico de drogas do Rio de Janeiro, Saulo Cristiano Oliveira Dias, 42, conhecido como SL, e Paulo Sérgio Gomes da Silva, 47, o Bin Laden, após o direito a saidinha de Natal.
O projeto foi relatado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e abraçado pela ala conservadora do Senado. O governo hesitou em relação ao tema e chegou a cogitar uma movimentação para barrar o projeto.
No entanto, a base aliada do Palácio do Planalto se viu encurralada diante da ampla adesão à proposta e, no fim das contas, o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), liberou a bancada governista, ou seja, não exigiu voto contra a matéria.
O desconforto ficou evidente no discurso de Wagner. "Ficou claro nesse debate, até quando olha para o painel, o grande número de partidos que são da base do governo e orientaram voto 'sim'. Não adianta aqui eu confrontar com lideranças partidárias. Mas não vou orientar voto sim porque eu entendi todas as razões, matéria apaixonante, fui governador oito anos, sei o que está acontecendo na segurança porque fui governador e sei desse drama", disse Wagner.
ENTENDA O QUE MUDA NA SAIDINHA
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