Diante da interiorização da epidemia e da prevalência de infecções pela Covid-19 nas áreas mais pobres, o Instituto Estáter e a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) lançam nesta segunda (13) o Projeto Alert(ar), uma campanha nacional para estimular o uso de oxímetros no combate precoce ao coronavírus.
A iniciativa tem a parceria de entidades médicas, empresas e lideranças comunitárias, além de prefeituras.
A campanha surge da constatação de que as chances de recuperação são muito maiores quando os doentes são tratados antes de terem os pulmões severamente comprometidos pela Covid-19 -daí a necessidade de medir frequentemente, com oxímetros, a taxa de oxigênio no sangue.
Apesar de não sentirem dificuldade para respirar, muitos infectados apresentam queda perigosa do nível de oxigenação. No jargão médico, a chamada hipóxia silenciosa pode tornar irreversível, e em pouco tempo, o quadro pulmonar.
O presidente do Instituto Estáter, Percio de Souza, considera fundamental ampliar a conscientização e o uso de oxímetros para tentar diminuir a taxa de óbitos no país.
"A interiorização da epidemia torna mais crítica a necessidade do acompanhamento da oxigenação e o tratamento inicial, especialmente para os mais vulneráveis e idosos, que não têm meios de correr sozinhos aos locais onde há leitos de UTI", diz Souza.
No Brasil, só 6% das cidades têm leitos de UTI; e embora as 27 capitais agrupem menos de um quarto da população, elas detêm quase a metade das vagas.
Já os leitos no interior estão concentrados em cerca de 300 municípios, deixando quase 100 milhões de brasileiros longe das UTIs. Com as distâncias e sem atendimento inicial, há cada vez mais mortes nas pequenas cidades.
O Projeto Alert(ar) prevê conscientizar a população sobre o uso frequente do oxímetro em casos suspeitos e pretende disponibilizar milhares de aparelhos no país a pessoas treinadas que possam monitor conjuntos populacionais.
Basicamente, a infecção pelo coronavírus se dá na sua ligação às enzimas conversoras da angiotensina 2 (ECA2). Abundantes no bulbo carotídeo, esse órgão responsável por alertar o cérebro para que o doente respire com força quando o ar falta entra em pane -e o indivíduo não percebe a queda de oxigênio em seu organismo.
A mucosa nasal também tem muitos receptores das enzimas ECA2 -e a mesma pane explicaria a perda de olfato relatada por muitos infectados.
Embora haja queda de oxigênio, na infecção pelo coronavírus os doentes também não retêm gás carbônico, e não sentem muita falta de ar.
Os dados de algumas cidades monitoradas pelo projeto revelam que cerca de 40% dos doentes que morrem o fazem em casa ou nas primeiras 24 horas de internação -e que outros 40% chegam direto às UTIs, sem que tenham passado por nenhum outro tipo de atendimento.
Já entre os pacientes atendidos em enfermarias (com oxigênio, corticoides e anticoagulantes), apenas 20% acabam precisando de UTI. Na maioria das vezes, não necessitam sequer de ventilação mecânica; só de oxigênio de alto fluxo -e ficam internados por um tempo bem menor.
Segundo Clóvis Arns da Cunha, presidente da SBI, a falta de oxigenação no sangue começa por volta do sétimo dia. Daí a necessidade de monitorar casos suspeitos com os oxímetros e encaminhá-los a unidades de saúde sempre que a taxa de oxigenação cair abaixo de 95%.
"A iniciativa vai nessa direção, de alerta e de conscientização", afirma.
O Instituto Estáter e a SBI terão o apoio técnico da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC), que representa médicos atuando em 47,7 mil equipes de atenção básica, e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib).
A Central Única das Favelas (Cufa), com representação em vários estados, dará capilaridade à divulgação, e empresas como Boticário, Embraer, Klabin, Gol, Grupo Ultra e o banco Voiter entrarão com apoio institucional.
Segundo Denize Ornelas, diretora da SBMFC, uma das maiores falhas dos gestores da saúde pública no Brasil nessa epidemia foi não ter disponibilizado oxímetros para as esquipes de atenção básica.
Com a exceção das cidades maiores, poucas equipes têm o aparelho -que pode ser comprado pela internet ao preço médio de R$ 200.
Baseando-se nas curvas de infecções no Brasil e em outros países, Percio de Souza, do Estáter, também não enxerga até agora indícios de uma segunda onda que possa interromper novamente a atividade econômica.
"Mas isso não justifica abandonarmos as políticas públicas para conscientizar a população e buscar meios técnicos para combater essa fase da epidemia. É preciso evitar que medidas tomadas sem embasamento acabem prejudicando ainda mais a sociedade pela via econômica."
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