Nomeado ministro da Educação na última quinta-feira, 25, Carlos Alberto Decotelli já está no Palácio do Planalto para pedir demissão do cargo na tarde desta terça-feira (30) informam auxiliares do governo. Segundo pessoas próximas do professor, ele reconheceu que a situação era insustentável e redigiu uma carta pedindo a saída do governo após a sua formação acadêmica ter sido alvo de vários questionamentos. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já teria aceitado a demissão, e anúncio deve ser feito quando for definido o nome substituto.
Decotelli tinha encontro marcado com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, às 14h30, mas cancelou sua ida ao Congresso minutos antes. Em seguida, se dirigiu ao Planalto. Pouco depois, o secretário-executivo do MEC, Antonio Vogel, também chegou à sede do Executivo, mas negou que estivesse indo falar com o presidente, de acordo com informações do Estadão.
A gota dágua foi a nota da Fundação Getulio Vargas (FGV), divulgada na noite de segunda-feira, informando que Decotelli não foi pesquisador ou professor da instituição. O presidente Jair Bolsonaro ficou irritado ao saber de mais uma incoêrencia no currículo do indicado, que já teve doutorado e pós-doutorado questionados por universidades estrangeiras e é acusado de plágio no mestrado. O governo então passou a pressioná-lo para que apresentasse uma carta de demissão.
Segundo o Estadão apurou, Decotelli perdeu o apoio do grupo militar que o indicou ao governo. A nota da FGV dizia que Decotelli cursou mestrado na FGV, concluído em 2008. "Prof. Decotelli atuou apenas nos cursos de educação continuada, nos programas de formação de executivos e não como professor de qualquer uma das escolas da Fundação", completa o texto. A situação é comum na instituição em cursos com esse perfil, professores são chamados como pessoa jurídica e atuam apenas em cursos específicos. Isso quer dizer que ele não faz parte do corpo docente da instituição, mas foi apenas professor colaborador.
Entre os nomes que estão sendo indicados a Bolsonaro para substituir Decotelli está o de Antonio Freitas, defendido pelo mesmo grupo militar e pelo dono da Unisa, Antonio Veronezi, que tem exercido grande influência no governo. Ele é professor titular de Engenharia de Produção da Universidade Federal Fluminense (UFF) e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE). Na profusão de nomes sendo indicados surgiu também o de Gilberto Gonçalves Garcia, que tem formação em filosofia e foi reitor de várias universidades privadas.
Outro nome que surgiu foi o de Marcus Vinícius Rodrigues, que foi presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep/MEC) na gestão de Ricardo Velez. Ele é engenheiro e ligado ao mesmo grupo militar de Decotelli. Rodrigues deixou o Inep depois de desentendimento com o grupo ligado a Olavo de Carvalho.
Além dele, o evangélico Benedito Guimarães Aguiar Neto, que foi reitor da Universidade Presbiteriana Mackenzie e hoje é presidente da Capes, no MEC, também é defendido por Veronezi. Correndo por fora está o atual reitor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Anderson Correa, que foi presidente da Capes já no governo Bolsonaro.
A preocupação dos militares e de educadores é que integrantes ligados a Olavo de Carvalho agora tenham argumentos para indicar um nome que prevaleça. O deputado Eduardo Bolsonaro teria sugerido Sérgio Sant'ana, ex-assessor especial de Abraham Weintraub e ligado a olavistas do governo. O nome de Ilona Becskehazy, que é a atual secretária de Educação Básica no MEC, também está sendo defendido por grupos considerados ideológicos.
Na segunda-feira, o presidente chamou Decotelli para uma conversa e postou nas redes sociais que o economista estava sendo vítima de críticas para desmoralizá-lo. Mas deu um recado: "O Sr. Decotelli não pretende ser um problema para a sua pasta (Governo), bem como, está ciente de seu equívoco." E não indicou que haveria posse, anteriormente marcada para esta terça. Decotelli saiu da reunião dizendo que era o ministro da Educação.
Segundo fontes, no entanto, o fato de Decotelli ser contestado agora por uma instituição do País o fragilizou. Na semana passada, ele foi questionado por Franco Bartolacci, reitor da Universidade Nacional de Rosário, que disse que ele não conclui o doutorado. Nesta segunda, a Universidade de Wuppertal, na Alemanha, também afirmou que ele não fez pós-doutorado na instituição. Decotelli mudou seu currículo na plataforma Lattes depois dos questionamentos.
O antecessor de Decotelli na cadeira do MEC foi apresentado pelo presidente como doutor e professor universitário "de ampla experiência em gestão". Entretanto, Abraham Weintraub nunca recebeu título de doutor por nenhuma universidade, como mostrou reportagem da revista Época. Após o erro ter sido apontado, Bolsonaro retificou a informação em suas redes sociais. Mas essa não era a única inconsistência no currículo do ministro e, dias depois, ele foi acusado de se "autoplagiar" publicando o mesmo artigo em mais de uma revista.
O primeiro ministro da Educação no governo Bolsonaro contava com pelo menos 22 informações falsas em seu currículo, de acordo com levantamento do Nexo. Em março de 2019, Vélez tinha atribuído a si mesmo a autoria de livros que não foram escritos por ele, e listou artigos publicados em periódicos sem reconhecimento científico.
Antes de se unir ao governo de Jair Bolsonaro como ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, a então palestrante Damares Alves se apresentava como "advogada", "mestre em educação", "em direito constitucional e direito da família". Em janeiro de 2019, entretanto, ela confessou à Folha de S. Paulo que os títulos não foram conquistados em uma universidade, mas sim em leituras da bíblia. Nas igrejas cristãs é chamado mestre todo aquele que é dedicado ao ensino bíblico", afirmou.
Ao contrário do que dizia, o atual ministro do Meio Ambiente nunca foi sequer matriculado como aluno de mestrado na Universidade de Yale, uma das mais concorridas nos EUA. A informação inicial constava em um artigo assinado pelo próprio Ricardo Salles na Folha de S. Paulo e foi usada durante sua participação no programa Roda Viva, mas desmentida posteriormente em reportagem do The Intercept Brasil. Questionado, o ministro culpou sua assessoria de imprensa pelo erro.
Quando ainda era pré-candidata à presidência, em 2009, o currículo da então ministra da Casa Civil contava com um mestrado e um doutorado em ciência econômicas pela Unicamp. As informações, replicadas na Plataformas Lattes, eram falsas. Apesar de ter estudado na universidade após o bacharelado na UFRGS, Dilma Rousseff não chegou a concluir os cursos.
Harvard também foi a instituição escolhida por Wilson Witzel (PSC) para inflar seu currículo Lattes, onde ele afirmava que parte do seu doutorado na Universidade Federal Fluminense (UFF) foi cursado na instituição dos EUA. Entretanto, a informação era falsa e foi denunciada pelo jornal O Globo.
A nível municipal no Rio de Janeiro, o prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) também alegou ser doutor em Engenharia Civil pela Universidade de Pretória, na África do Sul, sem nunca ter estudado lá. A informação foi verificada pela Agência Lupa e confirmada pelo ex-bispo, que alegou ter apenas revalidado seu diploma brasileiro na instituição. Mesmo após a retratação, sua passagem falsa pela Universidade de Pretória continuou na biografia de Crivella no site da Prefeitura do Rio até 2019.
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